Liderança e democracia
Liderança democrática não sai do forno de padaria que nem pão quente
Três consensos estão presentes em descontraídas conversas de botequins e sofisticadas rodas acadêmicas: o Brasil é um deserto de lideranças; há um risco real de êxito eleitoral do populismo autoritário; o capital político do presidente eleito viabilizará uma agenda reformista. No reino do caos: Cadê o líder?
De fato, liderança democrática não sai do forno de padaria que nem pão quente. Instalado o pesadelo de comida apodrecendo e governo batendo cabeça atrás de R$ 0,41, não custa sonhar: a faixa presidencial cairia bem numa personalidade comprometida com a democracia e virtudes da ética republicana; com ampla visão de mundo, consolidaria a legitimidade dos consensos, indo além de um programa de governo, balizando um rumo estratégico para o Brasil. Alguém se candidata?
Seria uma espécie terceiro turno: a mobilização da sociedade pelo líder eleito em torno dos interesses nacionais. Engana-se, a meu ver, quem aposta no capital político-eleitoral suficiente para viabilizar uma agenda reformista. Vai governar com que tipo de presidencialismo? Coalizão ou cooptação? Um Congresso mumificado. O Brasil não merece tamanho infortúnio. E com um quórum de 3/5 para as PECs?
Ora, o que dirão os candidatos em suas campanhas sobre seus “programas de governo”? Se convencer o eleitor com demagogia, entregará a mercadoria podre do estelionato eleitoral. Se disser a verdade nua e crua não “seduzirá” o eleitor. O desafio é construir uma agenda de Estado, em lista taxativa (numerus clausus), aprovando-as com os exigidos os 3/5, decorrente de uma concertação social e, em seguida, submetida a quorum constitucional transitório, 18 meses, de maioria absoluta. Polêmico? Sem dúvida.
Trata-se de uma saída política, temporária e restrita, utilizando sabiamente o mecanismo da revisão constitucional como ocorrera cinco anos após sua vigência (1993). Constituição, segundo Ulysses Guimarães, “útil, pioneira, desbravadora”.
Momento é tão crítico que o líder da prosopopeia nacional chama-se WatsApp; tão crítico que vozes claman por soluções autoritárias e ameaçadoras de democracias renascidas, fenômeno denominado por Huntington “Terceira Onda – Democratização do final do século XX”.
Frente à exacerbação da intolerância, alimentada pelas mídias sociais, Steven Levitsky (co-autor de How Democracies Die) afirma: “Isso não ajuda a democracia. A política é mais lenta e tem dificuldade em se adaptar a essa realidade. A política se tornou mais volátil. Isolar o extremismo requer coragem. A tolerância é a proteção suave da democracia”.
Para o Brasil, o líder democrático tornou-se gênero de primeira necessidade.
Gustavo Krause é ex-ministro da Fazenda do governo Itamar Franco