Em termos históricos, nossa economia se baseia na premissa de que a natureza é uma fonte inesgotável de recursos, explorável sem qualquer tipo de planejamento. Porém, a crescente escassez de matéria-prima nos processos produtivos tem evidenciado que essa premissa não corresponde à realidade.
A economia tradicional é fundamentada em um modelo linear de negócios que consiste em um processo de mão única de extração, produção, utilização e descarte das mercadorias. Este modelo é conhecido como “do berço ao túmulo”, ou seja, um produto “nasce”, é utilizado e, depois, descartado. Não são concebidos para reaproveitamento e, em muitos casos, são propositalmente planejados para se tornarem obsoletos ou não funcionais, forçando o consumidor a comprar uma nova geração do produto.
Por maior que seja o esforço em tentar se descartar algo de maneira correta, existe uma grande fragilidade neste propósito. Quando se descarta algo se despreza também todas as tecnologias, matérias-primas e insumos que foram utilizados para sua produção. Ou seja, se descarta a água, a energia, a mão de obra, conhecimento e tudo mais empregado na sua produção. Uma prática assim, pode ser correta?
Pesquisas indicam que 80% dos produtos fabricados se transformam em lixo em até seis meses após sua compra. Segundo a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), no ano de 2019 o Brasil gerou 79,6 milhões de toneladas de lixo, um aumento de quase 1% em relação ao ano anterior.
Deste total, apenas 3% foram reciclados e 29,5 milhões de toneladas de resíduos acabaram em lixões ou locais similares, ou seja, 40,5% do total foram destinados a locais desprovidos de qualquer tipo de controle. Neste cenário, o caminho de mão única da economia linear apresenta um risco cada vez mais iminente.
Como alternativa, surge o caminho representado pela economia circular. Este conceito está associado à fase inicial de planejamento de novos produtos para que, ao final de seu ciclo de vida, se transformem em outras mercadorias. Assim, através de um novo conceito, o resíduo deixa de existir, passando a ser matéria-prima de novos produtos.
Com isso, as empresas se tornam, simultaneamente, consumidoras e fornecedoras de materiais que serão reincorporados, reduzindo o consumo de recursos naturais, gerando menor degradação ambiental e maior eficiência econômica.
Repensar a forma de implementação da economia é um caminho necessário e urgente para um mundo mais sustentável e racional. Ao contrário do que possa parecer, fazer a economia circular não é gastar mais e, sim, aproveitar melhor o que já está disponível para produzir sem a necessidade de se extrair novos recursos naturais.
Não é deixar de produzir e, sim, produzir melhor, com menos desperdício, com mais eficácia e menor impacto ambiental.
Fazer a economia circular, portanto, é se inspirar na natureza. Já no longínquo século XVI, Nicolau Copérnico, famoso astrônomo e matemático, afirmou que “a sabedoria da natureza é tal que não produz nada de supérfluo ou inútil”.
É, pois, pensar que algo só se torna lixo quando não temos a capacidade de dar novo uso a esse produto. É pensar que não existe o termo “jogar fora, porque todo descarte é feito dentro de nosso espaço comum, que é o planeta Terra.
É, por fim, pensar que o caminho do “berço ao túmulo” deve ser redesenhado para um novo horizonte que é “do berço ao berço”. É entender que o planeta terra é maior e mais forte que a espécie humana e pode sobreviver muito bem sem a nossa presença.
Emiliano Lobo de Godoi escreve no Capital Político. É Diretor Geral de Extensão e coordenador do Programa Sustentável da Universidade Federal de Goiás. Graduado em engenharia agronômica pela Universidade Federal de Viçosa (1988), com mestrado e doutorado pela Universidade Federal de Goiás, estágio de pós-doutoramento em Licenciamento Ambiental pelo Instituto Superior Técnico de Lisboa. É professor visitante da Universidade de Playa Ancha, Valparaíso, Chile, Universidade de Lisboa e Universidade de Sevilha.