
Na noite do dia 28 de março do ano passado, Raul Jungmann, então ministro da Justiça, recebeu um telefonema do então diretor-geral da Polícia Federal. “Onde o senhor estará na madrugada de amanhã?” – perguntou o diretor. “Ora, em minha casa”, respondeu o ministro. “Então eu lhe telefonarei mais tarde”, disse o diretor.
Ligou pouco antes das 6h para contar que em instantes seria preso o coronel João Baptista Lima Filho, amigo do presidente Michel Temer e seu parceiro em negócios suspeitos. Em seguida, Temer ligou para Jungmann. Acabara de saber pelo coronel que agentes federais cercavam o prédio onde ele morava na capital paulista.
Quem nomeia o diretor-geral da Polícia Federal é o presidente da República, mas quem indica é o ministro da Justiça. Sempre foi assim. Embora administrativamente subordinada ao Ministério da Justiça, ela é um órgão do Estado, não do governo. Responde às ordens do Poder Judiciário, e de mais ninguém.
Daí seu elevado grau de autonomia respeitado por todos os ministros e presidentes desde o fim da ditadura militar de 64. Daí porque nem mesmo o ministro tem acesso às suas informações. Sobre operações de captura de criminosos, por exemplo, o ministro só fica sabendo em cima da hora. Como foi o caso de Jungmann.
Sempre foi assim, mas o presidente Jair Bolsonaro não quer mais que seja assim. Mandou o ministro Sérgio Moro substituir o atual diretor-geral da corporação, o delegado Maurício Valeixo. Ex-superintendente da PF no Paraná, Valeixo e Moro atuaram em dobradinha quando a Lava Jato de Curitiba estava com a bola cheia.
Dá-se por certo dentro da PF que Moro não terá força para se opor à vontade de Bolsonaro, nem argumentos novos que possam convencê-lo do contrário. O estoque de argumentos de Moro esgotou-se há uma semana quando ele e Bolsonaro tiveram uma discussão áspera sobre o assunto no Palácio do Planalto.
Bolsonaro tem dois candidatos para a vaga que deverá se abrir em breve com a saída de Valeixo: o delegado Anderson Gustavo, Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, e o delegado Alexandre Ramagem, diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), o Serviço Secreto do governo.
Ramagem encarregou-se segurança pessoal de Bolsonaro depois da facada que ele levou em Juiz de Fora, e que amanhã completará um ano. Foi Bolsonaro quem pôs Ramagem na direção da ABIN, tirando dali o antigo diretor que havia sido indicado pelo general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional.
Sempre vestido com um colete à prova de balas por debaixo da camisa, Bolsonaro tornou-se paranoico com sua própria segurança. Mas não é por isso que ele quer Ramagem no comando da PF. Quer porque ele é um homem de sua inteira confiança, fará seus gostos e não permitirá que nada o surpreenda.
Essa foi uma das razões para a transferência do Ministério da Economia para a órbita do Banco Central do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) que mudou de nome. Passou a se chamar Unidade de Inteligência Financeira (UIF). Dali foi demitido Roberto Leonel, indicado por Moro.
O UIF exercerá o mesmo papel do extinto COAF, que monitorava, analisava e produzia relatórios de inteligência financeira. Mas com uma diferença: os conselheiros do COAF deveriam ser servidores públicos. Os do UIF não precisam ser. Indicações políticas também poderão ser acatadas. Bolsonaro as repele, mas nem tanto.
A Receita Federal está na mira de Bolsonaro. E está previsto para amanhã o anúncio do nome do novo Procurador-Geral da República que, segundo Bolsonaro, deverá estar 100% alinhado com ele para o bem e para o mal. No próximo ano, Bolsonaro nomeará um novo ministro do Supremo Tribunal Federal. E, em 2021, mais um.
Se não mudar de opinião até lá, os dois ministros serão “terrivelmente evangélicos”. E deverão rezar pela cartilha dele.