A história da república brasileira é formada por ciclos. A eleição de amanhã põe em jogo – ou antes encerra – mais um deles, batizado de Nova República. O primeiro vai da proclamação, em 1889, à revolução de 1930, que inaugura o segundo.
Este, após passar pela Constituinte de 1934, pela ditadura do Estado Novo, em 1937 – com uma Constituição outorgada (de cunho autoritário) – finda com a deposição de Getúlio Vargas, em 1945, a eleição do marechal Dutra e uma nova Constituinte, em 1946.
Começa, então, o terceiro ciclo, democrático, que passa pelo suicídio de Vargas (1954), a inauguração de Brasília (1960) e vai até 1964, com o colapso do poder civil e o início do regime militar.
Este passa por uma nova Constituição, a de 1967, e conclui em 1985, com a eleição indireta de Tancredo Neves e José Sarney. Nele ainda estamos, sob os auspícios da Constituição de 1988, que, neste outubro, dois dias antes das eleições, completou 30 anos.
É a segunda mais longeva da república; perde apenas para a de 1891, que durou 43 anos. Mas é também a mais emendada: 106 alterações desde sua promulgação e mais de mil PECs em tramitação. A Constituição dos EUA, com 229 anos, tem apenas 27 emendas.
Cada ciclo republicano teve sua Constituição (o de 1930, duas), num total de seis, todas precedidas por expectativas de saneamento moral da política. Todas frustraram a população.
O rótulo de “república dos carcomidos”, do primeiro ciclo, permanece atualíssimo, não obstante o anacronismo da expressão.
Não é casual que os dois polos que disputam a presente eleição – PT e Bolsonaro – tenham mencionado a necessidade de nova Constituinte. Ambos, portanto, estão de acordo ao menos neste ponto: a Nova República acabou. A convergência termina aí.
O PT quer pôr em pauta uma agenda revolucionária, levando ao paroxismo aquilo que apenas esboçou nos quatro mandatos que exerceu. A estratégia revolucionária consiste em promover a desordem, levando ao colapso as instituições, para, ao final, oferecer a sua ordem. O insumo básico de qualquer nação – democrática ou não – é a ordem. A alternativa é o caos, em que já estamos.
Goethe, para enfatizar a primazia da ordem sobre qualquer outra coisa, dizia que a injustiça era menos danosa que a desordem.
As forças que se agregam em torno de Jair Bolsonaro – e que o transcendem em significação e abrangência política – simbolizam a rejeição à pauta revolucionária. É um discurso de ruptura.
A moderação foi derrotada em nome do temor revolucionário petista. O centro político cometeu o equívoco de dividir-se: um lado, simbolizado pelo PSDB, optou pelo PT; o outro, sem ter para onde ir, e em nome da rejeição ao petismo, desaguou em Bolsonaro.
Prevaleceu junto à população – e isso é visível nas manifestações de rua, nas redes sociais e até mesmo nas pesquisas – a rejeição ao petismo. Discute-se apenas se Bolsonaro vence em primeiro turno ou se haverá segundo turno.
Tudo isso sob a tensão da suspeita às urnas eletrônicas, singela contribuição do Judiciário – TSE e STF – ao bom andamento do processo eleitoral. Não se sabe que consequências podem daí advir, mas já são previamente temidas.
É, sem dúvida, a mais tensa das eleições desde a redemocratização, até porque encerram mais um ciclo republicano, que não deixará saudades. Mas deixará vítimas: todos nós.
Ruy Fabiano é jornalista