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Por Coluna
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A vida foi boa (por José Paulo Cavalcanti Filho)

Luís Roberto Barroso

Por José Paulo Cavalcanti Filho
30 abr 2021, 14h00

Luís recebeu, do médico, a péssima notícia. Tinha câncer. Com nome complicado, Adenocarcinoma do Esôfago, grau III. Traduzindo, lhe restava um ano de vida. Menos, talvez.  E não havia muito a fazer, além dos procedimentos de praxe: quimioterapia, hemoterapia, fisioterapia, acupuntura, terapia. Tudo para viver aqueles meses derradeiros com menos dores. E em paz. Tentou curas alternativas. Recebeu médiuns, levados por amigos. Há momentos na vida em que, mesmo confiando na ciência, o paciente não pode se dar ao luxo de recusar nada.

Fosse pouco, lhe mandaram livros de muitas religiões – católicos, evangélicos, espíritas, judeus, umbandistas, budistas, material da Brahma Kumaris. E leu todos. É compreensível. A hora derradeira leva o sofredor para mais perto de Deus. Ou algo assim. Fernando Pessoa, pela vida, escreveu textos em que expressa sua falta de fé dizendo, por exemplo, que Deus “é um velho estúpido e doente” (Caeiro, O Guardador). Ou, sem nenhum respeito, “Basta uma dor de dente para fazer descrer na bondade do criador” (Soares, Desassossego). Enquanto, no ano derradeiro, já escrevia poemas louvando o Homem na cruz (sem título, 1935), “Meu Rei morto,/ Suas mãos presas são a liberdade”.

Passou a meditar. E se sentia bem, verdade seja dita. Prático, organizou também o futuro da família. E preparou-se para morrer com tristezas poucas, das quais maior era saber que não veria os filhos andarem com suas próprias pernas. Quando o procuravam, nos últimos tempos, repetia sempre a mesma frase, “A vida foi muito boa e sou grato”.

Até que, depois de mais exames, surpresa: “A doença sumiu”, disse o médico. Não se sabe como. No início, não acreditou Só que os anos foram passando e ele continuava bem. A tentação de usar lugares comuns, em situações assim, é grande. Como a ideia recorrente de que, depois de ver a morte perto, nossa trajetória toma outro sentido. Melhor. Mais amplo. Em palavras suas, “Minha vida ganhou um sabor diferente, uma leveza extrema. Passei a dar atenção somente ao que tinha verdadeira importância, com muito menos peso para o ego e seu pequeno cortejo de vaidades”. Nesses tempos de pandemia, que seu depoimento seja visto com atenção. Na certeza de que a vida é sobretudo breve, em palavras de Victor Hugo (Monte de Pedra) só “uma frase interrompida”.

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P.S. Essa pequena história, diferente do que possa pensar o amigo leitor, é real. O personagem, Luís, é o Ministro do Supremo Luís Roberto Barroso. O mesmo que hoje nos honra, na luta contra uma corrupção que tem defensores ensandecidos no próprio Supremo. E sua trajetória está em livro, que recomendo, Sem Data Vênia (Ed. História Real, págs. 39/40). Um depoimento, data vênia, que faz lembrar Violeta Parra. No último disco que gravou antes de se matar, em fevereiro de 1967, Gracias a la vida que me ha dado tanto, la risa y el llanto. O riso e o pranto. Isso.

José Paulo Cavalcanti Filho

jp@jp.com.br

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