Os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da Argentina, Alberto Fernández, querem criar uma moeda comum sul-americana para transações tanto comerciais quanto financeiras. Ambos manifestaram suas intenções em artigo às vésperas do primeiro encontro ocorrido ontem entre presidentes dos dois países em mais de três anos.
Ouvindo algumas lideranças do mercado financeiro, essa intenção do governo Lula 3 não foi bem-recebida pela Faria Lima, centro financeiro de São Paulo; muito menos pelo Leblon, no Rio de Janeiro. Motivo: há descrença na empreitada, na medida em que boa parte dos países passa por crises políticas e econômicas, e outras tentativas foram feitas no passado e não avançaram. “Bobagem”, afirma um banqueiro totalmente descrente.
Idéia semelhante não é nova, e já foi defendida por um peso-pesado do próprio mercado financeiro. Em abril de 2008, ainda no governo Lula 2, o economista Paulo Guedes (sim, o ex-ministro da Economia de Bolsonaro) escreveu um artigo em uma revista defendendo não uma moeda específica para as transações bilaterais entre os países sul-americanos, mas uma moeda única – a exemplo da Europa com o Euro – de nome “peso-real”. “Nas lideranças de suas economias rumo à bem-sucedida integração com a nova ordem, os governos socialistas ou social-democratas instalados na América Latina têm deixado a desejar. Como libertá-los de uma visão de mundo equivocada, de instituições obsoletas, sem exigir que abandonem sonhos legítimos de melhorar as condições de vida das massas? Como romper sua inapetência por reformas modernizadoras? Com o sonho ainda maior da integração latino-americana, em que o catalisador é a meta de uma moeda única – o peso-real.”, escreveu Guedes.
De lá para cá, foram várias as defesas em eventos quando ainda era ministro da Economia de Jair Bolsonaro. Para ele, o ‘peso-real’ iniciaria um ciclo de reformas e romperia a inércia que trava o crescimento de toda a região sul-americana. “A intenção de criar ao longo da próxima década uma forte moeda regional deflagraria um ciclo de reformas para assegurar a convergência de políticas tributárias, trabalhistas, previdenciárias e assim pordiante. Essa agenda ameaça a dinâmica de crescimento da América Latina.”
O atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse ontem que a moeda sul-americana proposta pelo presidente Lula em estudo com o governo argentino “não é a moeda única de Guedes”. Ele explicou que a proposta se limita a transações financeiras e comerciais. Ou seja, não significaria abrir mão da moeda de cada país. Fato é que já se foram 15 anos de propostas, sugestões e iniciativas para a unificação monetária de alguma forma na região. Seja a proposta de agora ou a de Guedes, as lideranças do mercado financeiro nacional são taxativas: bobagem.