O primeiro semestre do ano para o governo foi marcado por desencontros, derrotas e polêmicas, culminando com a devolução pelo Congresso da controversa medida provisória apelidada de o “Fim do Mundo”, que limitava a dedução de créditos de PIS/Cofins para empresas. O fato é que o governo não consegue capitalizar o que faz de bom e não constrói uma narrativa forte para defender sua agenda. O que fazer?
O primeiro grande desafio é administrar um ministério extenso e heterogêneo. A falta de uma narrativa forte e unificada, aliada à limitação de recursos, exige um equilíbrio delicado entre as diversas alas políticas e interesses conflitantes. A maioria dos integrantes não possui grande capacidade de articulação política e atua mais em prol de seus microcosmos do que pelo sucesso do governo como um todo.
Outra tarefa essencial é comunicar de maneira eficaz as realizações do governo, transformando as boas notícias em apoio popular. Isso envolve não apenas divulgar os sucessos, mas também gerir as expectativas e reações de setores mais centristas da sociedade, que podem se sentir alienados por certas políticas. Afinal, comunicar é tão ou mais importante do que governar. O governo, apesar de investir milhões em comunicação, não o faz de maneira inteligente.
“O governo não consegue capitalizar o que faz de bom e não constrói uma narrativa forte para defender sua agenda”
Coordenar, com eficácia, as agendas com o Congresso também é essencial para evitar vexames como o da MP do Fim do Mundo. Em um regime que se assemelha ao semipresidencialismo e no qual o poder não é centralizado no Executivo, a habilidade de articular apoio no Congresso é fundamental. Lula precisa garantir que os poderes estejam alinhados em suas decisões, uma tarefa complicada que exige diplomacia, habilidade política e maior engajamento do presidente com todas as lideranças políticas relevantes.
Também é imperativo organizar uma narrativa que reconheça os horizontes políticos do governo no Congresso, na mídia e na sociedade. Sem essa narrativa, será difícil ampliar sua base de apoio entre formadores de opinião e, até mesmo, no Congresso. Ser apenas antibolsonarista pode não bastar para Lula terminar bem seu terceiro mandato. Construir uma narrativa impõe organizar seu círculo íntimo para enfrentar desafios políticos iminentes, além das eleições municipais.
Finalmente, é crucial que Lula reative o diálogo com os setores produtivos do país, uma marca de seus primeiros mandatos. A falta de comunicação pode resultar em retaliações e bloqueios no Congresso, comprometendo a agenda governamental. O desabafo de Rubens Ometto, dias atrás, no Fórum Anual do Grupo Esfera, revela um distanciamento do governo com as lideranças empresariais. O governo Lula 3 está distante das forças produtivas.
Esses cinco trabalhos não são apenas desafios operacionais; eles são fundamentais para que o governo atual possa navegar em um ambiente político fragmentado e altamente volátil. O sucesso em cada uma dessas áreas será crucial para manter a estabilidade política e econômica do Brasil e para o sucesso do governo. Em que pesem os tropeços, equívocos e derrotas, Lula tem experiência suficiente para reinventar a sua gestão e pacificar a sua relação com o Congresso e com o setor produtivo.
Publicado em VEJA de 14 de junho de 2024, edição nº 2897