O avanço da reforma tributária no Congresso Nacional merece uma análise detalhada e específica. Ignorando por um momento os detalhes da proposta, só o fato de ela ter sido aprovada tanto pela Câmara quanto pelo Senado — embora ainda aguarde o aval dos deputados ao fim da tramitação — representa um marco extraordinário.
Desde a década de 1980, quando comecei a acompanhar o debate legislativo no país, a reforma tributária sempre esteve em um vaivém constante na agenda política. Houve ocasiões em que mudanças pontuais foram aprovadas, mas invariavelmente elas favoreciam o ente arrecadador central, a União, em detrimento de uma mudança mais ampla e abrangente.
O cenário para a aprovação da atual reforma tributária é particularmente notável, dado que o Poder Executivo já não exerce a mesma influência dominante de antes no processo decisório. Notável foi a habilidade com que a equipe de Fernando Haddad navegou em um ambiente complexo e repleto de interesses divergentes. Embora o resultado final possa não ser perfeito, é importante lembrar que, muitas vezes, buscar a perfeição pode ser um obstáculo para alcançar o bom.
Dentro do Senado, Rodrigo Pacheco demonstrou uma liderança política extraordinária ao acelerar a aprovação da reforma tributária, encaminhando-a de volta à Câmara dos Deputados em uma forma quase finalizada. Na Câmara, Arthur Lira deverá repetir o desempenho eficiente do primeiro semestre, conduzindo a proposta rapidamente à votação no plenário. Provavelmente, teremos a reforma promulgada este ano no Congresso Nacional.
“Apesar de não agradar a todos, o debate continuado dará oportunidades para os ajustes necessários”
Merecem amplo reconhecimento também Aguinaldo Ribeiro e Eduardo Braga, relatores da proposta na Câmara e no Senado, respectivamente. Ambos desempenharam um papel crucial ao construir consensos em torno de agendas complexas, em meio a um emaranhado de interesses conflitantes.
A tramitação da reforma tributária é, sem dúvida, um feito histórico por diversos motivos. Ela promete impulsionar significativamente o crescimento econômico do Brasil, com estimativas de que o PIB possa crescer até 12% nos próximos anos, refletindo diretamente na renda dos brasileiros. O sistema tributário, atualmente complexo e opaco, será simplificado, com uma cobrança única de impostos, proporcionando maior transparência e compreensão para o consumidor sobre a carga tributária efetiva.
Essas transformações são essenciais para o desenvolvimento econômico do país, criando um ambiente mais favorável ao investimento, geração de empregos e atenuação das desigualdades sociais e regionais. Apesar de a reforma não agradar a todos, o debate continuado sobre a regulamentação das medidas constitucionais dará oportunidades para os ajustes e correções necessários.
Enfim, a reforma tributária reflete a existência de um Congresso que não abandonou o ímpeto reformista e que, pelo seu protagonismo, confirma a existência de um semiparlamentarismo de coalizão no qual o esforço conjunto dos poderes na busca de pautas consensuais pode resultar em avanços extraordinários.
Publicado em VEJA de 17 de novembro de 2023, edição nº 2868