Após o segundo turno das eleições municipais, quando se devem definir as prefeituras mais importantes do país, o Brasil entrará em uma fase crítica de cerca de noventa dias. Refiro-me ao período entre o início de dezembro e o fim de fevereiro, quando ficarão claros os resultados políticos, legislativos e econômicos do pleito, de grande relevância para 2021 e com repercussões também na sucessão presidencial, em 2022.
Economicamente, o último trimestre deste ano apontará o tamanho do fôlego da retomada no início de 2021. Nesse sentido, as festas de fim de ano e suas repercussões econômicas serão indicadores fundamentais para o ano que vem. Em havendo um Natal com consumo acima das expectativas, a narrativa econômica do governo se fortalece, com vantagem para a imagem do presidente e do time econômico.
No campo legislativo, o Congresso Nacional tem uma pauta inadiável. No Senado, duas leis se destacam: a de falências e a do marco do gás. Cruciais para o ambiente de investimentos no país, ambas podem ser votadas nesse período. Ainda na Casa, há o debate da PEC dos Gatilhos, que deverá estabelecer os marcos da política fiscal pós-pandemia. Dentro do combo, discutem-se o Orçamento da União para 2021 e a possibilidade de se ter — ou não — um programa que substitua o auxílio emergencial.
Na Câmara dos Deputados, o presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) ainda tenta ressuscitar a reforma tributária, mas, como ele mesmo diz, o governo não tem interesse no tema além da criação de uma nova CPMF. Portanto, a reforma não deve andar.
“Um consumo acima das expectativas no Natal fortalece a narrativa do governo”
Até dezembro, espera-se que o Supremo Tribunal Federal decida se Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), poderão disputar a reeleição. A decisão terá forte impacto no Congresso e no relacionamento com o governo. Afinal, os eleitos comandarão o Legislativo na reta final da sucessão presidencial.
Ao largo da agenda mencionada, o período de noventa dias poderá fornecer respostas importantes à cena política do Brasil. Por exemplo, os futuros presidentes da Câmara e do Senado serão reformistas e/ou aliados do governo? O teto de gastos será preservado ou o Congresso vai “flexibilizá-lo” para criar uma forma de financiar o Renda Cidadão — ou que o valha — para servir de “desmame” do auxílio emergencial?
Politicamente, o governo fará uma reforma ministerial, ao fim dos noventa dias e após a escolha dos novos presidentes do Congresso, a fim de se resguardar para a campanha da sucessão e contar com mais apoio para a sua agenda no Congresso? O desempenho econômico do fim do ano apontará para uma retomada com mais vigor em 2021?
O ministro da Economia, Paulo Guedes, conseguirá conter os ímpetos destrutivos dos fundamentos fiscais e apresentar uma narrativa firme de retomada? O ciclo de reformas iniciado em 2016, que trouxe relevantes transformações para o país, prosseguirá no ano que vem? Que agenda de reformas deve prosperar?
Todas essas perguntas serão respondidas ao longo de 2021. E para essas respostas será decisivo o que ficar estabelecido nos próximos noventa dias. Não à toa o maior vetor de transformações no país — o mercado — estará muito atento aos passos do governo e do Congresso. E a opinião do mercado sobre o que for decidido influenciará — positiva ou negativamente — a movimentação dos juros, dos juros futuros, da oferta de crédito, do câmbio e do apetite para investimentos no Brasil.
Publicado em VEJA de 18 de novembro de 2020, edição nº 2713