“Olhe o que sua mãe está fazendo”. A frase inominável foi dita por um dos soldados russos bêbados que estupraram a mãe de um jovem de 20 anos, colocado de joelhos, com um fuzil apontado para a cabeça e obrigado a assistir tudo.
Além da mãe, a namorada também foi estuprada na sua frente. A violência contra as duas mulheres e a humilhação do jovem, que se sente fracassado por não tê-las defendido, foram relatadas à psicóloga Natalia Potseluieva, mas não denunciado oficialmente.
Em declarações ao jornal The Telegraph, a psicóloga resumiu os horrores que chegam a ela — e o medo e a vergonha de muitas vítimas. Natalia trabalha com 17 pessoas violentadas nos arredores de Kiev, em localidades ocupadas no início da invasão. O sofrimento psicológico persiste e muitos também temem uma revanche caso a guerra mais uma vez tenha uma virada, trazendo de volta os russos para suas cidades. De 24 mulheres que denunciaram ter sido estupradas em Bucha, a cidade que virou símbolo dos atos hediondos praticados pelos russos, nenhuma apresentou uma queixa formal.
“Eu trabalho com uma mãe e uma filha de treze anos que foram estupradas por três soldados e uma menina de cinco anos estuprada na frente do pai”, disse a psicóloga Natalia.
É quase insuportável ouvir o que ela tem a contar.
“E não foram só mulheres. Em Kherson, num centro de tortura, um homem de 24 anos foi espancado, torturado e violentado. Os homens são estuprados por outros homens ou com objetos. Pedaços de pau, porretes, cassetetes”.
No caso relatado, a vítima disse que seus agressores eram da FSB, a polícia secreta. Ele também relatou que outro preso, um homem mais velho, não suportou a violência e se suicidou.
Um mecânico de 56 anos contou ao Telegraph que sofreu choques nos testículos: “Desmaiei e urinei. Eles fizeram isso para me humilhar, para mostrar que sou um verme, um nada”.
A humilhação e o medo fizeram com que um número relativamente baixo, de 154 casos, tenha se transformado em processos abertos por uma promotora especial, encarregada da inédita investigação dos crimes cometidos enquanto a guerra ainda continua. Nas abordagens iniciais, os investigadores começam com uma pergunta neutra: “Como os russos se comportaram?”.
Todos os envolvidos, ucranianos e estrangeiros, têm certeza absoluta de que o número de casos foi muito maior.
A promotora Irina Didenko relata um modus operandi, um comportamento identificado em todas as localidades investigadas: nos dois primeiros dias, os russos chegavam, escolhiam onde queriam se instalar, checavam os celulares de moradores para ver se tinham parentes nas forças de segurança. “No terceiro dia, começavam a estuprar”.
Uma mulher identificada apenas como Marina, de 47 anos, contou que foi parada na rua por três soldados quando chegava à casa dos pais, levada para um local vazio e obrigada a tirar a roupa. Os russos atiraram a centímetros de sua cabeça. Quando ela pediu que não fizessem nada, um deles respondeu: “Seus soldados estão nos matando”. Sem atentar para a ironia de que eram eles os invasores. Marina foi estuprada.
Esta semana, foi fechado mais um caso, o de dois soldados que estupraram uma menina de quatro anos e a mãe dela na frente do pai e marido.
Pelo menos uma notícia boa: os dois foram mortos em combate.