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Qualquer um pode ser enganado

Mas o desejo de lucro fácil aumenta a chance, como no caso da FTX

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 4 jun 2024, 11h10 - Publicado em 27 nov 2022, 08h00

“Sou um príncipe nigeriano e tenho 12 milhões de dólares para receber do governo…” Quantas vezes esse golpe foi aplicado? E quantas pessoas continuam a cair nele? É exasperador avisar parentes todo dia para não acreditar em quantias de dinheiro que despencam do céu — ou do WhatsApp — e vê-los perguntar, com um fundo de esperança no olhar, se poderia ser verdade que têm um precatório a receber, só precisam pagar uma taxa a uma bondosa advogada que está fazendo de tudo para ajudá-los. O desejo de ganho fácil é um motor poderoso, mas o pesquisador americano Paul Zak, que criou um ramo de estudos chamado neuroeconomia (seria um santo remédio para muitos políticos), acredita que temos uma vulnerabilidade adicional: nosso cérebro é programado para retribuir a confiança que nos é oferecida. Aí reside a vulnerabilidade que os golpistas exploram magnificamente; mostram ter confiança em nós. Por que outro motivo o príncipe nigeriano escolheria justamente você?

“O cérebro é programado para retribuir a oferta de confiança. Essa vulnerabilidade é usada por golpistas”

E quanto mais absurdo o golpe, mais tende a comover o alvo. Isso se vê de maneira quase inacreditável na falência da FTX, a empresa que operava intermediava a compra de criptomoedas e chegou a valer 32 bilhões de dólares. De bermudão, camiseta e tênis, seu jovem criador, Sam Bankman-Fried, deveria fazer qualquer um tremer antes de colocar o rico dinheirinho nas mãos de um descabelado com menos de 30 anos e estilo de vida heterodoxo. Numa cobertura de 30 milhões de dólares nas Bahamas, ele e oito executivos e executivas da mesma faixa etária trabalhavam, comiam, usavam drogas e eventualmente dormiam juntos. Bankman-Fried admitiu sem nenhum constrangimento que a conversa sobre mudar o mundo e desmudar o aquecimento global, entre as causas para as quais contribuía, era só para dar às pessoas o que elas queriam ouvir.

Música para os ouvidos também foi o que moveu investidores a pôr dinheiro na startup Theranos e seu supostamente inovador dispositivo para fazer exames de sangue com uma simples picada no dedo e resultados imediatos. Elizabeth Holmes tinha 19 anos quando fundou a empresa de biotecnologia e chegou a valer 4,5 bilhões de dólares. Virou série de televisão quando a casa, fraudulenta, caiu. Na vida real, a sedutora golpista foi condenada a onze anos de prisão, numa sentença que coincidiu com as estarrecedoras informações sobre a total falta de controle na FTX. Antes da queda, Bankman-Fried levou para palestras nas Bahamas personalidades do nível de Bill Clinton e Tony Blair, prestou depoimento ao Congresso americano e atraiu para campanhas de promoção famosos como Gisele Bündchen e seu ex-marido, Tom Brady.

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O pesquisador Paul Zak fez uma complexa experiência que envolvia dar doses de oxitocina, o hormônio do bem-­estar e do afeto que atinge o ápice quando as mulheres têm filhos, a voluntários colocados em situações que demandavam confiar num desconhecido a quem seria mandada uma quantia em dinheiro, contando com uma retribuição. Conclusão: a oxitocina reduz o medo de confiarmos em estranhos. Os príncipes nigerianos devem saber disso e até ter um bom negócio com aparelhos para medir o confiômetro. Basta pagar um pequeno adiantamento e…

Publicado em VEJA de 30 de novembro de 2022, edição nº 2817

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