Angelina Jolie ficou sozinha com Harvey Weinstein no quarto. Ele fez um avanço, pediu uma massagem, ela recusou. “Decidi nunca mais trabalhar com ele e avisar outras quando fizessem isso.” Não se sabe quem ela avisou, mas não faltaram “outras” que subiam à suíte no Peninsula, em Beverly Hills, um dos hotéis que ele usava como base.
Era esperta, desafiadora e acostumada ao mundo do cinema – o pai dela é o ator Jon Voigt. Outra filha de nomes conhecidos em Hollywood que passou por um apuro semelhante é Gwyneth Paltrow. A mãe é a eternamente conservada atriz Blythe Danner, o pai foi um produtor conhecido, Bruce Paltrow. É afilhada de Steven Spielberg.
Numa notável coincidência, Gwyneth contou sobre o assédio para seu namorado na época, Brad Pitt. Anos depois, ele se casaria com Angelina Jolie. Pitt deu um aperto no poderoso produtor da Miramax, uma fábrica de produzir Oscars.
Um aperto muito de leve, uma vez que depois do episódio ainda faria dois filmes produzidos por Weinstein. Duas mulheres com quem ele dividiu a intimidade haviam sido assediadas grosseiramente, mas alguma coisa falou mais alto.
O toque de Midas de Weinstein tinha um poder quase hipnótico. Muitas jovens atrizes podem ter sido surpreendidas pelas investidas grosseiras dele, mas a certa altura todo mundo sabia o que significa “ir até a suíte”.
A linda Kate Beckinsale disse que conseguiu sair ilesa de cinco visitas desse tipo. Quem vai a cinco encontros que sabe como vão terminar? É uma aposta. A francesa Léa Seydoux também entendia a jogada do “drinque na suíte”.
“Era difícil dizer não porque ele era tão poderoso. Todas as meninas tinham medo dele”, escreveu ela. “Logo a assistente saiu e ficamos só nós dois. Foi aí que ele começou a perder o controle.”
Apesar do assédio, Gwyneth Paltrow também continuou fazendo filmes bem sucedidos com o homem que a havia tirado da massa de lindas, jovens e talentosas atrizes para o topo das “oscarizadas”.
Pelo menos 30 mulheres já deram depoimentos sobre assédio contra Weinstein, desde uma abusada passada de mão até a violação completa. O FBI está investigando se pode abrir um processo por estupro em pelo menos três casos.
Um deles é o de Asia Argento, uma atriz italiana que, aos 21 anos, foi levada para uma festa da Miramax. Festa de Um só: Harvey Weinstein. No mesmo ritual, pediu uma massagem. Agarrou-a e fez sexo oral forçado.
A história fica mais estranha ainda. Asia, que hoje namora o chef Anthony Bourdain, passou a ter um caso consensual com Weinstein. E tem mais: depois, ela dirigiu um filme em que um produtor estupra uma atriz. Weinstein achou graça.
Como uma daquelas séries que tem no mínimo três guinadas por capítulo, a trama fica cada vez mais enrolada. O depoimento de Asia Argento, entre outras, aparece numa reportagem da revista New Yorker escrita por Ronan Farrow.
Ele é o filho biológico da atriz Mia Farrow e do diretor Woody Allen, protagonista do maior escândalo sexual de Hollywood até a eclosão do caso Weinstein. Allen teve um caso secreto, depois assumido e finalmente sacramentado em cartório com a filha de Mia, Soon-Yi, adotada na Coreia do Sul.
Mia depois acusou Allen de ter abusado de outra filha adotiva, Dylan, quando tinha apenas sete anos. O mundo do cinema se dividiu em duas partes: uma, majoritária, que achava que era tudo vingança de Mia, que está bem longe de parecer uma pessoa equilibrada. A outra nem abriu a boca.
Woody Allen de alguma maneira era como Harvey Weinstein: um homem capaz de projetar uma atriz banal para o universo rarefeito das protagonistas de seus filmes. E de usar sua reputação profissional para tentar conquistar mulheres lindas que, em circunstâncias normais, sequer olhariam para eles.
Nenhuma atriz convidada disse não, mesmo depois que Dylan, já adulta, escreveu um artigo no New York Times com detalhes sórdidos.
O caso Weinstein já entrou na fase dos desdobramentos. A Amazon colocou em licença o diretor de seus estúdios, Roy Price, acusado pela atriz Rose McGowan de ter ignorado o relato que ela fez dos avanços de Weinstein.
Ben Affleck condenou em termos bem cuidadosos o comportamento de Weinstein – e imediatamente foi acusado de ser do mesmo tipo “mão boba”. Uma maquiadora deu detalhes de um episódio.
Os dois maiores escândalos sexuais na política nos últimos tempos, o de Bill Clinton e o de Dominique Strauss-Khan, envolveram exatamente o mesmo tipo de comportamento.
Clinton costumava entrar em qualquer ambiente já procurando a mulher que ia atacar. Na maioria dos casos, elas concordavam alegremente com os avanços do político carismático e bonitão, mas houve denúncias de abuso e violência.
A mais conhecida envolve uma mulher hoje com 74 anos, Juanita Broderick. Ela diz que queria colaborar com a campanha dele, marcaram um encontro e ele sugeriu subir ao quarto dela. A própria Juanita reconhece que foi absurdamente ingênua.
Os casos de Clinton foram todos expostos, em detalhes constrangedores, quando o episódio com a estagiária Monica Lewinsky quase o derrubou.
Acusado de estuprar uma camareira num hotel em Nova York, Dominique Strauss-Khan perdeu o cargo de diretor do FMI e a chance considerada garantida de ser eleito presidente da França.
Como Clinton, Strauss-Khan se jactava de entrar em qualquer lugar, mirar numa mulher e mandar mensagens de texto que conduziam direto para o sexo consensual.
Todas as atrizes que agora estão denunciando as atitudes agressivas de Harvey Weinstein demonstram um modus operandi muito parecido. Achavam que conseguiriam controlar a situação sem criar animosidade com um dos produtores mais poderosos do mundo.
É uma barganha que muitas mulheres fazem em outras situações. Pena que, justamente em Hollywood, ninguém tenha se lembrado da habilidade de Sharon Stone com um picador de gelo em Atração Fatal.