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Os sandinistas ensandecidos

Não há limites para a loucura do poder de Rosario e Daniel Ortega

Por Vilma Gryzinski 17 ago 2024, 08h00

As perversidades doentias do casal nota vinte — em abusos — da Nicarágua parecem saídas do manual do caudilho latino-americano enlouquecido. Rosario Murillo e Daniel Ortega expulsaram do país as freiras da ordem de Madre Teresa de Calcutá, prenderam um bispo, insultaram o papa, proibiram procissões, tomaram a maior universidade católica do país, deportaram em massa os nomes mais destacados da oposição, fecharam todos os jornais, expurgaram velhos companheiros, encarceraram o irmão de Ortega, baniram o Rotary Club, proscreveram os escoteiros e hostilizaram até a Miss Universo, a linda nicaraguense Sheynnis Palacios, impedida de voltar a seu país. A expulsão do embaixador brasileiro faz parte do nefasto processo de deterioração dessa dupla possuída pelo mais tóxico dos venenos, o poder absoluto. A única coisa que não se pode dizer sobre eles é que não se sabia o tipo de caráter sórdido que têm. Ortega abusou da enteada durante doze anos; Rosario se voltou contra a própria filha, chamando-a de “mal-agradecida”. As denúncias foram feitas no longínquo ano de 1998. Zoilamérica Narváez contou de forma detalhada e irretorquível como foi seu calvário. Os abusos começaram quando ela ainda nem tinha 10 anos; aos 15, a violação passou para o estágio da penetração. Abrangeram o período em que Ortega era o chefe exilado dos guerrilheiros sandinistas e, posteriormente, o presidente da nova Nicarágua, onde não existia mais a ditadura dos Somoza e a esquerda mundial celebrava um regime promissor formado por estudantes, escritores e poetas. Aliás, nem era preciso ser de esquerda para sentir alívio por um país onde a praga dos Somoza havia acabado, com o ditador original tendo se tornado conhecido pela frase: “Vocês ganharam a eleição, mas eu ganhei a apuração”.

“La Bruja e ‘el coma-andante’ só podem fazer mal aos nicaraguenses e aos iludidos esquerdistas que continuam a apoiá-los”

O ódio à Igreja católica começou em 2018, quando houve manifestações de protesto, reprimidas com tiros na cabeça, e os bispos simpatizantes da mudança se ofereceram para intermediar um diálogo. Dom Rolando Álvarez chegou a enfrentar a tropa que o cercava na cidade de Matagalpa, com o Santíssimo Sacramento na mão. Acabou condenado a uma pena insana de 26 anos de prisão, sendo depois deportado. O mesmo destino seguiram outros oito padres na semana passada, levando o total a 151. O papa Francisco, conhecido simpatizante do esquerdismo à moda la­ti­no-­americana, pediu discretamente a intervenção do presidente Lula em casos desse tipo de perseguição. Ortega aproveitou que o embaixador brasileiro não foi à comemoração de uma data revolucionária e rompeu com um aliado da estatura de Lula. É a prova de que o despotismo chegou ao inevitável ponto em que aperta o botão da autodestruição. Com o detalhe de que a Nicarágua, ao contrário da Venezuela, onde o mesmo processo se desenvolve, não tem recursos naturais, projeção geopolítica ou instrumento de pressão que não seja o atalho que abriu para lucrar com a imigração de cubanos para os Estados Unidos. La Bruja, ou a Bruxa, como Rosario é chamada, e seu marido — cada vez mais ela, louca para ser a sucessora, do que ele, velho, isolado e apelidado, à cubana, de “el coma-­andante” — só podem fazer mal aos nicaraguenses e aos iludidos esquerdistas que continuam a apoiá-los. “Ortega e Somoza são a mesma coisa”, cantavam os manifestantes reprimidos. Ou coisa pior.

Publicado em VEJA de 16 de agosto de 2024, edição nº 2906

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