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O soldado que encarou a morte e desafiou os executores: “Glória à Ucrânia”

Num momento crucial da guerra, foi identificado — e glorificado — o homem que decidiu dar uma última tragada e partir como um anônimo herói

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 10 mar 2023, 10h35 - Publicado em 8 mar 2023, 07h48
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  • Para a propaganda russa, o vídeo parecia perfeito: um soldado inimigo que desafia os seus captores, grita o já amplamente conhecido “Slava Ukraini” e é sumariamente fuzilado, entre xingamentos.

    Os ucranianos só poderiam tremer diante do destino fatal do anônimo atrevido.

    Obviamente, a outrora celebrada propaganda russa está perdendo a mão — se não a guerra. O vídeo divulgado na segunda-feira virou propaganda contra, com ucranianos e estrangeiros impressionados pela cena de arrepiar. Cigarro no canto da boca, olhar triste mas não temeroso, o homem agora identificado como Timofei Shadura, de 41 anos, virou instantaneamente um símbolo da resistência ucraniana.

    É impossível não imaginar o que ele pensou naqueles segundos finais. Shadura não faz pose de herói de filme de guerra, mas foi exatamente o que virou.

    Sua morte aconteceu em 3 de março e o corpo está em território ocupado pelos invasores. Foram membros da família que o identificaram no vídeo. “É 100% meu irmão. São seus olhos, sua voz e seu jeito de fumar”, disse Sofia Kochmar-Timoshenko. 

    Shadura tinha sido convocado em dezembro. Era civil e foi celebrado no discurso diário de Volodymyr Zelensky. “Glória aos heróis! Glória à Ucrânia! E vamos encontrar os assassinos”, prometeu o presidente.

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    Primeiro, os ucranianos teriam que ganhar a guerra. O momento atual não é bom, ainda que esteja longe de crítico. As forças russas, entre mercenários do Grupo Wagner e soldados regulares, avançam sobre Bakhmut, uma pequena cidade que se tornou o foco da guerra.

    Vladimir Putin quer conquistá-la a qualquer preço — inclusive a perda de 20 mil russos, caídos numa proporção de cinco para um, acima da relação genérica entre atacantes e defensores (três para um). O sacrifício dos ucranianos para defendê-la também é enorme. Um médico entrevistado pelo New York Times deu um exemplo: dos 500 homens de sua unidade enviados em dezembro para Bakhmut, sobrevivem atualmente 150.

    Vale a pena perder tantos combatentes por um lugar que não tem grande valor estratégico e mantém imobilizados contingentes que poderiam ser usados na esperada — e inevitável — contraofensiva a ser lançada pelos ucranianos?

    Aparentemente, os generais ucranianos não querem nem ouvir falar em retirada, mesmo com suas tropas totalmente cercadas e com o envio de reforços dificultado pelo imenso lamaçal que se espalha pela Ucrânia quando o inverno começa a chegar ao fim.

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    A lama também atrapalha os russos, em alguns casos combatendo apenas com armas curtas e, quase inacreditavelmente, com pás, diante da falta de reposição de munição.

    Uma vitória russa em Bakhmut viria em má hora, coincidindo com a revelação dos serviços de inteligência americanos de que foram ucranianos — não identificados — que explodiram o gasoduto chamado Nord Stream II.

    O gasoduto que abasteceria a Alemanha estava pronto, mas nunca chegou a ser usado. Foi explodido em setembro do ano passado, garantindo que nunca entrará em operação. É um constrangimento para a Ucrânia, especialmente com um aliado importante como a Alemanha. Uma operação dessas dimensões, envolvendo barcos e mergulhadores numa zona crítica, só pode ser feita por agentes estatais.

    A dependência alemã do gás russo sempre foi um entrave geoestratégico. Com enorme esforço e determinação, o país conseguiu fontes alternativas depois da invasão da Ucrânia.

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    A propaganda russa atribuiu a sabotagem aos americanos, no que foi ajudada pelo hoje totalmente desacreditado jornalista Seymour Hersh. Muitos defensores da causa russa usaram a reportagem de Hersh, atribuindo a explosão do gasoduto a uma ordem direta de Joe Biden, como se fosse a palavra divina.

    É possível que a divulgação em off da conclusão do serviço não identificado de espionagem, atribuindo a responsabilidade a ucranianos não identificados, tenha uma relação com isso.

    Irá a queda de Bakhmut, anunciada há tantas semanas pelo falante Ievgueni Prigozhin, o chefão dos wagneristas, prenunciar uma virada em favor dos russos? Ou irão os ucranianos produzir um milagre de última hora?

    Na Guerra da Coreia, tornou-se célebre a frase do coronel Lewis Pulley, conhecido pelo apelido de Chesty, quando os marines sob seu comando se viram assediados por todos os lados pelo inimigo.

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    “Estamos cercados. Isso simplifica o nosso trabalho de ir atrás desses sujeitos e matá-los”, disse o combativo Chesty.

    Timofei Shadura certamente não pensou no coronel marrento quando encarou a morte e, no teste mais absoluto de coragem, não tremeu.

    Os ucranianos também postavam, no início da invasão, vídeos de prisioneiros sendo executados — certamente para horror de americanos e outros aliados, cientes de que isso é um crime de guerra. Os russos sabem que estão atolados até as orelhas nesse tipo de crime e não ligam a mínima. 

    Quem irá prendê-los e julgá-los se não perderem a guerra?

    Isso dá uma ideia das apostas envolvidas.

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