O destino de Joe Biden: descamisado ou tranquilo com Trump tornado réu?
A reeleição está garantida, diz a mídia dedicada a vender o presidente octogenário e a fritar o adversário enrolado em processos graves
O que aconteceria se uma testemunha ocular dissesse que o filho do presidente Donald Trump colocava o pai em telefonemas com interlocutores comerciais e o chamava de “meu cara”?
Trump já estaria no fundo do calabouço onde não é impossível que termine, inclusive pelas novas e graves acusações de nada menos que “defraudar os Estados Unidos” com a manifestação de 6 de janeiro de 2021 que culminou com a invasão do Congresso.
Protegido pela maioria da mídia, Joe Biden vai se aproximando de uma campanha nada brilhante pela reeleição sem maiores preocupações com as artes do filho, Hunter, quando ele era vice-presidente.
A denúncia sobre o uso indevido da posição de vice-presidente, ou o “meu cara”, foi feita por um ex-sócio de Hunter Biden, Devon Archer, mencionando pelo menos vinte telefonemas em que o filho ligou para o pai e fez a ponte com parceiros comerciais. China, Rússia, Romênia e México são a origem de alguns desses interlocutores junto aos quais Hunter procurava, basicamente, investimentos para seu fundo.
Mas o caso mais enrolado envolve a empresa ucraniana de gás Burisma, para a qual Hunter trabalhava como brilhante aspone — exceto em interferências do papai para cortar o procurador que a investigava num caso de corrupção.
O deputado democrata Dan Goldman levou o prêmio de cara de pau do ano ao dizer que os telefonemas realmente aconteceram, mas os envolvidos trocavam amabilidades “sobre o tempo” e outros assuntos anódinos.
A preocupação em proteger Biden é tamanha que o site Politico fez uma reportagem sobre as fotos que incendiaram as redes no domingo, mostrando o presidente só de calção de banho, tênis e boné numa praia de seu estado, Delaware. Sem reproduzir um único comentário negativo sobre a figura presidencial tão lamentavelmente exposta que o correto seria perguntar onde estavam os assessores encarregados de controlar até o tamanho das escadas de avião para evitar tropeços, literais, do presidente de 80 anos.
No New York Times, as más notícias — “corrida apertada contra Trump” — foram dadas como boas: Biden tem hoje mais apoio dos democratas, “embora a metade preferisse” algum outro candidato.
Ter o apoio de eleitores do próprio partido não é exatamente um feito. E os índices de desaprovação são altíssimos. Do total de entrevistados, apenas 18% apoiam firmemente o presidente e 21% o apoiam em parte. Desaprovam firmemente, 42%, ou em parte, 12%.
É possível ganhar uma reeleição com números assim? Sim, se o adversário for Donald Trump, cuja avaliação é praticamente um espelho dos índices de Biden (44% tem uma avaliação extremamente desfavorável, e 11% em parte desfavorável). Os novos problemas com a justiça não devem alterar muito esse quadro: tudo o que Trump fez, ou supostamente fez, não abala os eleitores que estão com ele e ponto final.
Uma semana é muito tempo em política, disse, famosamente, o primeiro-ministro britânico Harold Wilson, um esquerdista que levava na carteira uma foto sua com a rainha Elizabeth II e fumava cachimbo, considerado mais popular, em público e charuto em particular.
Imaginem então uma eleição que só será disputada em 5 de novembro do ano que vem – uma eternidade, ainda mais considerando-se a alta vulnerabilidade jurídica de Trump e as questões de saúde de Biden.
Mas o fato é que Joe Biden realmente está superando resistências e a incomparável máquina da economia americana tem emitido sinais positivos, como redução da inflação — 9% em junho — e desemprego de apenas 3,6%.
A narrativa nacional que foi a força motora da explosão dos Estados Unidos como a maior superpotência da história está danificada e talvez não se recupere. As sete jogadoras da seleção feminina de futebol que não cantam o hino nacional são, no momento, um retrato disso.
Outro é o próprio presidente: a América dinâmica, vencedora, convencida de seu destino manifesto é o oposto do alquebrado senhor de calção na praia.
Nada menos que 65% dos americanos acham que o país está no rumo errado.
Na pesquisa do Times, Biden e Trump aparecem exatamente empatados, com 43% (os restantes não sabem ou não vão votar). Seria uma disputa de tirar o fôlego se tantos americanos não estivessem simplesmente desanimados com o replay.
O “meu cara” aposta, de novo, em ser o menos pior.