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Loucura pura: de banheiros indianos a gás carbônico no Brasil

Os grandes emissores não são incomodados pelos messiânicos climáticos; só implicaram com a Índia por querer acabar com a defecação a céu aberto

Por Vilma Gryzinski 24 set 2019, 18h31
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  • “Posições muito radicais são destinadas a antagonizar nossas sociedades.”

    Adivinhem que falou isso sobre os arroubos ecológicos mais conhecidos do momento.

    Ele mesmo, Emmanuel Macron. Exatamente aquele que começou a falar em intervencionismo na Amazônia brasileira, o “pulmão” da “nossa casa” que estava “em chamas” – três tolas falácias.

    Macron não gostou quando a mais messiânica dos profetas do fim do mundo, Greta Thunberg, derramou lágrimas na ONU, contrariando a impressão nem sempre correta de que autistas não costumam demonstrar sentimentos.

    Greta não só chorou como incluiu a França na sua lista de malfeitores climáticos, acusados de violar a Convenção dos Direitos das Crianças.

    Além da França, estão na lista negra da adolescente sueca Alemanha, Argentina, Turquia e, claro, Brasil.

    Macron, que fez todas as macronices possíveis para Greta em fevereiro, não gostou de que França e Alemanha entrassem na lista.

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    Os outros que se danem. Aliás propôs a inclusão de mais um país, a Polônia, por tentar bloquear a meta da União Europeia de atingir o marco de emissão zero de gases que impulsionam o efeito estufa até o ano 2050.

    A Polônia precisa da energia proporcionada pelo carvão, assim como a Alemanha. Só que é mais pobre, precisa impulsionar a indústria e tem menos dinheiro para investir em formas de energia limpa como fazem os alemães.

    Por enquanto, porém, bem longe da meta: a Alemanha está em sexto lugar na lista dos maiores emissores de CO2.

    A China fica em primeiríssimo lugar, com 9,8 milhões de toneladas em 2017. Quase o dobro dos Estados Unidos, o segundo colocado.

    Seguem-se Índia, Rússia, Japão, a mencionada Alemanha, Irã, Arábia Saudita, Coreia do Sul e Canadá.

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    Indústria, petróleo, carvão e agricultura são obviamente os motivos.

    A lista dos campeões de emissão per capita deixa isso mais claro: Catar, Kuwait, Emirados Árabes Unidos, Brunei, Bahrein, Nova Caledônia, Arábia Saudita, Austrália, Estados Unidos e Casaquistão.

    Viram só as manifestações de protesto na frente das embaixadas do Catar? Os cartazes comparando o emir do Catar a Hitler? A cobertura indignada da Al Jazeera, pertencente ao mencionado emir?

    É claro que isso não aconteceu em lugar algum.

    SOBROU PARA BILL

    O único dos grandes emissores, fora os Estados Unidos, criticado na onda atual foi o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi.

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    E com ele, Bill Gates.

    O elo não poderia ser mais bizarro. Ao contrário dos grandes bilionários do mundo digital, Bill Gates não quer conquistar a imortalidade, o espaço interplanetário ou a queda do governo Trump.

    Dedica seu tempo e sua fortuna fenomenal a causas simples, sem muito glamour. Incluindo a instalação de banheiros em países subdesenvolvidos como forma de diminuir doenças.

    O problema é conhecido no Brasil inteiro, não só em cidadezinhas relegadas, mas em bairros de São Paulo e até na orla do Rio de Janeiro.

    Diferença: a falta de saneamento faz com que instalações sanitárias apenas levem os dejetos até rios ou o mar.

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    Na Índia, não existem nem as instalações precárias. A defecação é praticada abertamente, sem constrangimentos sociais, em ruas, campos, praias, beiras de rio.

    E por uma população de 1,3 bilhão de habitantes.

    Por causa da dedicação de Bill Gates ao problema, sua fundação vai premiar Modi, promotor de um programa de proporções indianas para diminuir o tamanho e as consequências deletérias do maior banheiro a céu aberto do mundo.

    A premiação coincide com a viagem de Modi a Nova York para a assembleia geral a ONU, dominada este ano pelos temas ambientais.

    Greta Thunberg fez a famosa viagem de veleiro a Nova York para aproveitar a temporada.

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    O governo indiano, como qualquer governo, tende a exagerar um pouco em seus feitos. Modi diz que aumentou de 40% a 90% o acesso da população indiana a banheiros.

    Provavelmente está enfeitando. Muitas construções da Missão Índia Limpa pararam no meio ou não funcionam por falta d’água.

    E os banheiros, sem conexão com redes de esgotos, são geralmente fossas sépticas nada sofisticadas, com o conhecido risco de contaminação dos lençóis aquáticos.

    Mesmo quando os banheiros funcionam, existem até resistências culturais. E a Índia não é a China, onde a substituição de sistemas antigos por instalações sanitárias ao modelo ocidental foi martelada até conseguir sucesso.

    Mas alguém pode apanhar por melhorar os problemas da defecação ao ar livre, inclusive o aumento do risco de violência sexual para meninas e mulheres adultas quando vão usar as áreas coletivas à noite? Ou premiar quem faz isso?

    Pois Bill Gates está levando pancada. Três Prêmios Nobel, dois atores conhecidos (de origem muçulmana) e mais 100 mil pessoas aderiram a um abaixo assinado criticando a premiação.

    Problema: Modi é um nacionalista hinduísta. Ou seja, propaga a religião majoritária. Os confrontos entre hinduístas e muçulmanos são históricos e já provocaram até o racha de 1948, quando nasceu, num banho de sangue, o Paquistão.

    Modi não tem nada de santo, mas as previsões de perseguições em massa contra muçulmanos nunca se concretizaram. Pelo menos até agora.

    Mesmo assim, virou uma besta fera para a esquerda, em sua conhecida e bizarra associação com o islamismo militante.

    Sobrou para Bill Gates, o mais politicamente correto e discreto dos bilionários.
    A exploração das justas preocupações com o meio ambiente para fins políticos que não têm nada a ver com a preservação ambiental atinge níveis delirantes.

    Alguns até engraçados, como os manifestantes cheios de caretas, e poucas roupas, que fizeram pose no JP Morgan Chase.

    O pessoal é da Rainforest Action Network e propõe uma coisa bem realista: fechar a gigantesca instituição financeira por causa de investimentos em combustíveis fósseis.

    Os adultos dão risada – e os bancos dão dinheiro para causas verdes, esperando apaziguar espíritos.

    Mas são os messiânicos que cada vez mais dominam a narrativa.

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