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É este o homem que vai salvar o liberalismo econômico em seu berço?

O novo ministro da Economia, Kwasi Kwarteng, tem que conciliar cortes de impostos e outros incentivos ao crescimento com subsídios inevitáveis

Por Vilma Gryzinski 23 set 2022, 07h23
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  • Uma coisa é certa: em algum momento, a nova primeira-ministra britânica, Liz Truss, vai brigar com o colega, vizinho e amigo que escolheu para comandar a economia, Kwasi Kwarteng.

    Todo chefe de governo tem algum tipo de atrito com os ministros da Economia, ou pelos menos com os que são responsáveis e não acreditam em árvore de dinheiro. O governo quer gastar, o ministro quer segurar.

    E raras vezes as duas necessidades confluíram tanto como nesse momento no Reino Unido.

    Truss e Kwarteng beberam na fonte de John Locke o princípio de que “toda a riqueza é produto do trabalho” e têm a mesma crença nas virtudes do liberalismo para fazer a economia crescer, beneficiando toda a sociedade. 

    Kwarteng é a “alma gêmea ideológica” de Truss, escreveu o Guardian, mal esperando a chance para criticar tudo o que os dois representantes da “direita do livre mercado” fizerem.

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    O que já disseram que vão fazer: cortar impostos para pessoas físicas e jurídicas, acabar com o aumento nas contribuições de empregados e empregadores para a previdência social (ideia do ministro anterior, Rishi Sunak, derrotado por Liz Truss na competição pela liderança do Partido Conservador), derrubar o teto para os bônus no mercado financeiro e suspender o equivalente ao odiado ITBI, o imposto sobre a compra de imóveis.

    Ao mesmo tempo, vão congelar as contas de luz dos consumidores privados e dividir por seis meses a das empresas ameaçadas de simplesmente fechar por não conseguir bancar os aumentos causados pela guerra na Ucrânia e o fechamento do fornecimento do gás russo.

    Tudo isso em meio aos mesmos martírios causados pelos efeitos da pandemia: inflação de 9,9%, dívida que bateu em 96% do PIB (um nível francês, que não é bem visto no Reino Unido) e perspectiva de recessão. O Banco da Inglaterra – pai de todos os bancos centrais – acabou de subir a taxa de juros para 2,25%, a mais alta desde 2008. E as ondas de greves, suspensas em respeito pela morte da rainha, já estão voltando.

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    Enfim, os problemas são parecidos em todos os países, embora ainda muito distantes da situação sombria de 1979, quando Margaret Thatcher foi eleita pela primeira vez, bateu o livro de Hayek na mesa e pôs a teoria liberal em prática.

    Kwarteng até escreveu um livro sobre os primeiros e decisivos seis meses do governo Thatcher. Liz Truss tentou moldar uma figura thatcheriana, inclusive no figurino. Sua campanha para ser líder do Partido Conservador depois da renúncia de Boris Johnson conquistou mais votos justamente pela mensagem que mais ecoa com a base do partido: menos impostos e menos governo.

    É claro que as condições atuais exigem um bocado de jogo de cintura e capacidade de mudar de ideia quando as coisas mudam – mas não de princípios.

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    Kwarteng, que tem 1,96 de altura e o tipo de voz que parece fazer os móveis tremerem na base, é a própria encarnação da meritocracia: filho de pais de classe média que vieram de Gana, estudou com bolsa em Eton, o colégio das elites, entrou em Cambridge, ganhou outra bolsa para Harvard e se doutorou em história econômica.

    Agora, está anunciando seu programa, inclusive propostas para trazer de volta ao mundo do trabalho os desempregados contemplados por benefícios sociais – já dá para imaginar como serão as críticas. O país precisa aumentar sua força de trabalho para fazer a economia voltar a crescer, argumenta.

    Um conservador negro apaixonado por história do império britânico (“Não existe o livro final sobre o assunto porque o fascínio que exerce sobre historiadores de todos os matizes é inexaurível”) e infenso à ideia de que o capitalismo é a fonte de todos os males pode ser o cavaleiro de armadura brilhante que salva o reino da decadência?

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    Todas as medidas que forem tomadas agora só serão sentidas no bolso dos cidadãos, para começar, no ano que vem. O dinheiro que subsidiar a luz e o aquecimento vai onerar o endividamento público durante muito tempo. Cortar impostos num momento em que o governo tem que gastar mais faz sentido?

    Tanto Kwarteng quando Liz Truss, que vão morar lado a lado nos apartamentos oficiais de Downing Street, serão duramente testados pela realidade. Inevitavelmente vão entrar em atrito, mas o fato de se conhecerem bem e terem trabalhado juntos no governo anterior ajuda. Terão afinidade e ousadia para bancar os princípios nos quais acreditam?

    A libra caiu antes de Kwarteng falar. A Economist, que já foi uma revista identificada com os princípios liberais, disse que a nova política econômica “não vai funcionar”.

    No Telegraph, que continua fiel a seu perfil, Alistair Heath ampliou o tamanho do desafio: “Só medidas radicais podem arrancar a Grã-Bretanha da quase estagnação. A única questão agora é se Truss e Kwarteng estão dispostos a ir até o fim”.

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