Comparado a outros governantes, Emmanuel Macron até que está bem na foto: tem 48% de aprovação, um feito considerando-se o habitual mau humor dos franceses com políticos no poder e os efeitos perversos desencadeados pela pandemia.
Mas o desempenho do partido do presidente no segundo turno das eleições regionais foi de doer, o exato contrário do que ele havia conquistado na última eleição.
Tendo conseguido se apresentar como uma cara nova na eleição presidencial de 2017, Macron alcançou um feito maior ainda, ao criar um partido praticamente do nada, o República em Marcha, e eleger nada menos que 350 dos 577 deputados.
Para um país profundamente atrelado aos conceitos tradicionais de direita e esquerda, foi um vendaval de ar fresco. E uma aposta dos eleitores no centro político naquilo que tem de melhor: convicção de que a França demanda reformas vitais para oxigenar a economia, combinada à preocupação social e ecológica. Tudo isso tendo no comando um político jovem, dinâmico, ambicioso e superqualificado.
O desgaste natural do poder, altamente amplificado pela pandemia, criou agora uma situação inversa. A “cara nova” é Xavier Bertrand, um ex-vendedor de seguros que não pode ser acusado de ter ambições de grandeza – a qualidade tão francesa aspirada por Macron em seus discursos e sua estratégia.
Autodefinido como um interiorano tratado com certo menosprezo em seu próprio partido, ele não cursou as escolas de elite de onde saem os dirigentes franceses e, aos 56 anos, nunca fez um discurso de levantar a galera na vida.
Bertrand é tão convencional que até na sua vida particular espelha a composição conjugal tradicional: sua mulher, Vanessa Williot, (a terceira) é 22 anos mais jovem, uma inversão quase completa do casal Macron, onde Brigitte tem 68 anos e o marido, 43.
Ele foi empurrado à linha de frente da política pelo bom desempenho do partido tradicional de direita, o Republicanos, que elegeu o equivalente a governadores das principais regiões francesas.
Além do partido de Macron, a direita nacionalista de Marine Le Pen também se saiu muito mal nas urnas. O resultado tira fôlego da candidata e abre a possibilidade de que não haja em 2022 uma repetição da disputa Macron versus Marine.
Numa das eleições mais importantes, a do governo da Provença-Alpes Marítimos-Costa Azul (PACA, sigla que não honra a beleza da região), houve uma repetição da aliança direita e esquerda da presidencial de 2017 para derrotar o candidato do partido de Marine Le Pen.
Obviamente, Macron preferiria que a eleição altamente polarizada se repetisse no ano que vem, pois só tem a ganhar com isso. Se Xavier Bertrand, ou outro candidato da direita convencional, for seu adversário no segundo turno, dificilmente a esquerda vai se sentir mobilizada a votar no mal menor, do seu ponto de vista.
Bertrand ganhou a eleição para o governo da região de Hauts-de-France com 52% dos votos. Reeleita na região de Île-de-France, onde fica Paris, Valérie Pécresse, ex-ministra do governo Sarkozy, poderia concorrer com ele na mesma faixa da direita tradicional.
Sejam quem forem os candidatos a presidente, a sensação é de déjà vu, tudo muito parecido com o que já aconteceu antes. O sopro de novidade que levou Macron a vitórias avassaladoras passou. Ele continua a ser o favorito em 2022, mas o frisson da novidade está superado. Também passou a chance de promover a maior parte das reformas prometidas, soterradas pela pandemia.
Melancolicamente, tudo voltou ao normal na França.