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A batalha do século: mulheres contra trans nos esportes

Esportistas estão revoltadas com competidoras que nasceram homens e mudaram de identidade, mas conservam as vantagens biológicas

Por Vilma Gryzinski 17 jun 2019, 17h40
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  • Esportes profissionais são provavelmente a mais competitiva atividade humana, incluindo aí a guerra e a luta por espaço nas filas de embarque. Ver os que correm mais rápido, saltam mais alto e arremessam os discos com mais força, disputando em igualdade de condições, é justamente o que nos mantém grudados diante da televisão nos grandes eventos esportivos (embora seja difícil imaginar uma palavra em latim para incluir o curling no mote olímpico Citius, Altius, Fortius). Glória, medalhas e contratos publicitários ajudam a insuflar o espírito competitivo e, eventualmente, induzem atletas a ir para o lado negro da força, tentando mascarar o uso de substâncias proibidonas.

    Num ramo onde alguns milhõezinhos de moléculas a mais podem fazer a diferença, a tentação é enorme. Mas o que acontece quando os atletas ou, mais apropriadamente, as atletas, já trazem vantagens biológicas desde a concepção?

    O que acontece é o que está ocorrendo atualmente nos Estados Unidos e em outros países loucos para imitar os americanos: em lugar de combater a discriminação, a mudança de normas e regulamentos esportivos favorecendo a participação de mulheres trans em esportes femininos incentiva a desigualdade.

    A prova está nos resultados das competições onde mulheres nascidas, biologicamente, homens que tinham transexualismo e mudaram de gênero, competem com mulheres que não têm nada disso.

    Aliás, também têm menos massa muscular, menos volume sanguíneo, pulmões menores e portanto, menos capacidade respiratória – embora, num passado distante, muitos concordassem que tudo isso as torna o sexo superior (falar em “sexo” em lugar de “gênero” praticamente dá pelotão de fuzilamento virtual).

    Nenhuma dessas características está diretamente relacionada ao nível de testosterona, artificialmente diminuído nas mulheres trans e contrabalançado por hormônios femininos. Constatar isso não implica, de maneira alguma, em manifestar preconceito ou discriminação em relação aos transexuais, antes, durante ou depois da transição. Muito menos em deixar de reconhecer o sofrimento emocional e social que tão frequentemente os acomete.

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    Ter medo de fazer esta constatação, como vários dirigentes esportivos, é resultado do receio de parecer, erradamente, preconceituoso. Ou querer pegar uma caronazinha na onda do momento.

    A “PROVA” DO HISTORIOGRAMA

    Dizer que mulheres trans desfrutam de vantagens que contrariam o princípio esportivo da igualdade de condições não tem nada a ver com as ameaças e ofensas feitas contra Rachel McKinnon.

    A canadense de 1,82 metro de altura e 90 quilos tornou-se campeã logo de cara, ao mudar de identidade, numa modalidade de ciclismo na faixa de 35 a 39 anos do Campeonato Mundial de Ciclismo da UCI no ano passado.

    Rachel McKinnon é um bom exemplo porque, como professora de filosofia, tem uma excepcional capacidade de argumentação e a usa amplamente para defender a tese de que disputa em igualdade de condições com mulheres biológicas. Usa termos como historiograma de peso e altura para argumentar que homens e mulheres têm
    grandes zonas de confluência. “A base da pirâmide de qualquer característica física masculina é tão baixa quanto a base feminina”, diz ela. Qualquer discordância é descartada como manifestação de profunda ignorância sobre biologia, além, claro, de “ódio transfóbico”.

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    A discussão aumentou nos Estados Unidos por causa do projeto de lei de igualdade de transgêneros, apresentado pelo deputado democrata David Ciciliine e já aprovado na Câmara – atualmente, está parado no Senado.

    Até Taylor Swift já se manifestou sobre o assunto, o que praticamente encerra a discussão. Esta, no entanto, continua, pelo menos entre os poucos que não aceitam “verdade” movidas por propósitos alheios à racionalidade.

    O projeto de lei criminaliza diferenciar entre meninas e mulheres com base na identidade sexual para qualquer propósito, inclusive em modalidades esportivas. Os defensores do projeto estão dispostos a tirar mulheres do pódio com base no seguinte raciocínio: “Está na hora de apoiar mulheres e meninas transgênero que precisam mais de nossa ajuda”. Em outras palavras, é um sistema de cotas para trans.

    Quem disse isso foram a tenista Martina Navratilova, a professora de direito Doriane Coleman e outras duas ex-atletas, num artigo para o Washington Post. Navratilova, que assumiu publicamente o lesbianismo quando ainda não era moda, em 1981, já tinha criticado a inclusão de mulheres trans na categoria feminina, pediu desculpas pelos termos
    usados e voltou a entrar na briga com o artigo no Post.

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    “As pessoas podem se identificar como quiserem. Mas não numa competição esportiva onde podem tirar uma mulher de ganhar uma vaga”, reclamou Paula Radcliffe, recordista mundial de maratona, depois que mulheres trans conseguiram se classificar para a Maratona de Boston, notoriamente disputada.

    Se concorressem como homens, não teriam alcançado uma vaga. “Homens biológicos correm mais rápido do que mulheres biológicas”, disse Paula. A obviedade ganhou ares de revelação. “Não entendo como alguém pode dizer que existe igualdade de condições e espírito esportivo. Aumento recente de 1000% de mulheres trans no esporte”, disse a ex-nadadora olímpica britânica e hoje apresentadora Sharron Davies. “É um assunto sério que precisa ser tratado com honestidade.”

    Honestidade não é um artigo popular quando entram em jogo opções ideológicas. Em quantidade muito menor, também acontece o movimento oposto: homens trans que disputam competições esportivas com homens biológicos.

    ESTUPRADOR NO POÇO

    Quando Patricio Manuel venceu Hugo Aguilar numa luta de boxe no fim do ano passado, absolutamente todos os comentaristas esportivos disseram que era um acontecimento histórico. Em 2012, como mulher, Miguel tentou uma vaga nas Olimpíadas.

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    Pode ser histórico para quem não gosta das histórias de mulheres guerreiras, fortes e combativas. Uma das melhores é a de Timocleia de Tebas. Quando o imbatível Alexandre, o Grande conquistou Tebas, um de seus comandantes, da Trácia, estuprou Timocleia e ainda perguntou se ela sabia de tesouros escondidos. Timocleia levou o elemento até um poço, empurrou-o e jogou pedras bem pesadas por cima.

    Alexandre perdoou Timocleia diante de seu comportamento altivo – e do fato de que seu irmão, tombado em combate, era do Batalhão Sagrado de Tebas, a tropa de elite formada por 150 casais de homens homossexuais que combatiam lado a lado. Alexandre gostava de meninas e meninos, embora fosse muito controlado no quesito “prazeres do
    corpo”. Palavra de Plutarco.

    Não que Alexandre fosse suficientemente grande para viver acima de intrigas e fofocas. A mãe dele, por exemplo, mandava cartas falando mal de Heféstio, seu amigo predileto. E Diógenes , o filósofo da lanterna, reclamou que o maior conquistador de todos os tempos só tinha uma fraqueza: as coxas de Heféstio.

    Até hoje historiadores debatem se os dois foram realmente amantes ou tiveram a amizade profunda entre homens que só pode ser compreendida pelos padrões culturais da Grécia Antiga. Mas dificilmente dá para imaginar Alexandre incentivando trans a competir fora da biologia.

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