Logo depois de conseguir esticar a eleição e levar a disputa para o segundo turno, um novo Bolsonaro nasceu na coletiva dada a jornalistas em frente ao Palácio da Alvorada – o cercadinho da paz.
O presidente estava irreconhecível.
Confira a apuração do resultado das eleições 2022 aqui na Veja.
Enquanto Lula e seus aliados participavam de evento com apoiadores em clima de motivação, Bolsonaro apareceu contido, sereno e, pasmem, na maioria dos momentos – equilibrado – para comentar a passagem para o segundo turno.
Em poucos minutos, ele deu declarações que em nada se parecem com o que tem sido dito desde o primeiro dia de seu mandato.
Uma das mais surpreendentes declarações foi a menção à compra de vacinas feita pelo presidente.
O atraso do governo que pode ter levado à morte milhares de brasileiros na pandemia já é conhecido de todos. Neste domingo, sem ser questionado por nenhum jornalista, Bolsonaro tentou valorizar a compra das vacinas numa evidente estratégia de mudança de tom e deixou claro que precisa explicar aos brasileiros os efeitos da pandemia no país.
“A principal mensagem no segundo turno é que o Brasil, levando em conta a grande maioria dos demais países do mundo, o Brasil foi o que melhor se saiu e está se saindo na questão da economia. Talvez mostrar um pouco mais do que foi a pandemia. O Brasil comprou 500 milhões de doses de vacina para quem se sentiu no dever de se vacinar. Nós só temos dados positivos e acredito que, como vai ser um primeiro para o segundo turno bastante elástico, vai ter quatro semanas e não três como geralmente acontecia, dá para a gente explicar bem para a população o que aconteceu.”
Questionado sobre uma suposta fraude nas eleições, assunto que foi repetidamente abordado pelo presidente inclusive às vésperas do primeiro turno, Bolsonaro desconversou, vejam vocês, e disse o seguinte: que vai esperar pelo posicionamento das Forças Armadas.
“Repito, elas foram convidadas a participar, integrar uma comissão de transparência eleitoral. Então isso aí fica a cargo do ministro da Defesa tratar desse assunto”, declarou.
Ao falar sobre seu desempenho nas urnas, o presidente demostrou assustadoramente uma certa humildade ao reconhecer que é preciso mudar.
“O povo brasileiro sentiu o aumento dos produtos, em especial da cesta básica. Entendo que há uma vontade de mudar por parte da população, mas tem certas mudanças que podem vir para pior. E a gente tentou, durante a campanha, mostrar esse outro lado, mas parece que não atingiu a campanha mais importante da sociedade”, disse.
Bolsonaro também afirmou que, na segunda etapa da disputa, vai tentar mostrar os avanços de seu governo.
“E nós vamos agora mostrar melhor para a população brasileira, em especial a classe mais afetada, que a consequência do ‘fique em casa, a economia vê depois’ é consequência (sic) de uma guerra lá fora, de uma crise hidrológica também, e tenho certeza que nós vamos poder mostrar para uma certa parcela da sociedade que as mudanças, que por ventura alguns querem, podem ser pior, até mesmo a gente mostrando melhor a Argentina, o Chile, a Colômbia, a Venezuela, que já estava em crise antes mesmo da Covid-19. Entendo que é por aí o nosso trabalho por ocasião do segundo turno.”
É bem provável que a mudança do presidente tenha a ver com o fato de que o bolsonarismo saiu fortalecido do primeiro turno e uma das maiores críticas de Bolsonaro e de seus apoiadores ganhou força neste domingo, 2: os institutos de pesquisa erraram ao calcular a força do presidente.
“Acho que se desmoralizou (sic) de vez os institutos de pesquisa. O Datafolha estava dando 51 a 30 e pouco, a diferença foi quatro, isso tudo ajuda a levar voto para o outro lado e isso vai deixar de existir. Até porque acho que não vão continuar fazendo pesquisa, não é possível”, afirmou o presidente.
Bolsonaro nunca foi o bobo da corte, apesar de todas as trapalhadas do seu governo. Ele sabe da importância de conquistar votos nos próximos dias e essa postura mais moderada pode ser a diferença que ele precisa para o dia 30 de outubro.
A vitória em São Paulo e no Rio de Janeiro dá força para o presidente, que já admitiu que vai começar a campanha do segundo turno por Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do país, onde Romeu Zema foi reeleito em primeiro turno. O apoio de Zema é um dos que são considerados fundamentais para os planos de reeleição do presidente.
Segundo a coluna apurou com integrantes de sua campanha, o Bolsonaro “paz e amor” nasceu. E é ele que enfrentará o cada vez mais moderado Luiz Inácio Lula da Silva.
Resta saber se ele vai conseguir manter essa postura nos próximos dias e nos debates, frente a frente com Lula, sem nenhum “Padre” para se escorar.