O presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva saíram derrotados nas eleições de 2020, enquanto o centro avançou nas prefeituras, especialmente nas 26 capitais em que havia eleições. Isso mostra uma diferença do ambiente polarizado de 2018, quando as pautas eram o combate à corrupção e a segurança, com o ambiente atípico da pandemia, na qual a saúde e a economia ganharam protagonismo.
Apesar de Lula também sair derrotado, o resultado negativo para Bolsonaro é mais grave, pois ele está no cargo de presidente e Lula sem mandato. O fiasco de Celso Russomanno marca o desempenho de Bolsonaro nestas eleições. Eleição municipal muito raramente reflete a polarização federal. E o presidente precisava dela, cresceu em 2018 radicalizando e polarizando. A única esperança que lhe resta é tentar alavancar o prefeito Marcelo Crivella, no Rio de Janeiro, seu reduto eleitoral, no segundo turno. Crivella, porém, tem rejeição muito alta, o que praticamente o torna inelegível.
Desagregador, Bolsonaro perdeu não apenas porque a maioria dos candidatos indicados por ele foi mal, mas porque ele não conseguiu organizar as forças que o levaram ao poder em 2018. Tentou fazer um partido e fracassou. Isso depois de ter brigado com a legenda nanica que o levou ao poder, com recursos que o ajudariam na tarefa de fortalecer o partido e lhe dar mais capilaridade nestas eleições. Enquanto “governava” o país, o presidente não quis fazer o dever de casa político mais elementar.
No caso de Lula, é importante destacar a teimosia em apostar em candidatos independentemente da competitividade que eles demonstravam, caso de Gilmar Tatto, em São Paulo, e Nilmário Miranda, em Belo Horizonte. Isso fez com que o PT perdesse espaço, enquanto PSOL e PCdoB avançavam.
Como a coluna apontou há um mês, Guilherme Boulos se transformou no maior fenômeno eleitoral de 2020. O líder dos sem-teto vai para segundo turno em São Paulo conquistando o eleitorado histórico do petista na capital. Em Porto Alegre, a esquerda também foi se reorganizando e dando uma votação consagradora a Manuela D’Ávila, ao menos no primeiro turno.
É importante lembrar que, no último comício antes de ser preso, Lula chamou dois políticos esquerdistas e mostrou-os para multidão que o cercava: Boulos e Manuela. Foi um momento emblemático, no qual o petista levantou o braço dos dois ao mesmo tempo em que se mantinha afastado de Fernando Haddad. Parecia que estava indicando seus herdeiros. Mesmo com o espaço temporal deste momento até a eleição de 2020, é inegável que Lula é responsável por esse gesto aos dois. O ex-presidente fez apostas erradas em 2020, mas pode corrigi-las daqui a dois anos.
Enquanto os dois líderes políticos de direita e de esquerda sofreram derrotas, os prefeitos que se desempenharam bem na pandemia estão sendo reeleitos, caso de Alexandre Kalil, em Belo Horizonte, e Rafael Greca, em Curitiba. Os que se comportaram mal, não. Os dois estão distantes dos polos e mais perto do centro. Isso chama a atenção: os partidos de centro saem consagrados do pleito deste ano.
Bolsonaro passou os últimos meses falando que a pandemia não era importante. Reclamou que quem “prendeu as pessoas em casa” estava tendo um bom desempenho nas eleições municipais. O pleito presidencial de 2022 terá a memória da pandemia. Podemos entrar numa segunda onda e a recuperação da economia tende a atrasar. Mesmo distante, e com muitas variáveis, o recado do eleitorado que larga a polarização e se agarra ao centro, inclusive com políticos tradicionais, é, sem dúvida, uma importante sinalização do que está por vir.