A quem interessa evitar que canetas de emagrecimento cheguem aos pobres?
Novo Nordisk tenta a todo custo manter patente no Brasil; genéricos já são vendidos em outros países; ANVISA alerta para desabastecimento e impacto no SUS
 
                Uma disputa envolvendo o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e a farmacêutica dinamarquesa Novo Nordisk reacendeu o debate sobre extensões de patentes farmacêuticas no Brasil. Em jogo está a exclusividade da molécula liraglutida, princípio ativo das conhecidas “canetas de emagrecimento” comercializadas como Victoza e Saxenda.
A controvérsia gira em torno da patente PI0410972-4, cujo prazo de vigência expirou em 2024, após os 20 anos legais contados a partir da data do depósito. Ainda assim, a Novo Nordisk obteve uma sentença favorável em 1ª instância, que estendeu o prazo da patente por mais 8 anos, 5 meses e 1 dia, com base em uma “mora administrativa” do INPI no processo de concessão.
A decisão contrariou jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que, ao julgar a ADI 5.529, declarou inconstitucional o mecanismo automático de extensão de patentes por atrasos administrativos. O STF também deixou claro, em reclamações posteriores (como as de nº 53.181 e 56.378), que a prorrogação de patentes farmacêuticas não tem previsão no ordenamento brasileiro e que a legislação ofereceu adequada proteção desde o protocolo do pedido no INPI.
Em meio à disputa, um alerta da ANVISA trouxe novo elemento à discussão: a agência publicou edital priorizando o registro de medicamentos com liraglutida e semaglutida, apontando risco de desabastecimento no país.
A decisão se baseou em fatores como aumento de demanda, concentração de mercado, falsificações e até roubo de cargas.
Se o pleito do laboratório der certo nos tribunais, os mais pobres não terão acesso às canetas por meio do SUS. Estados, como o Ceará, já negaram incorporar esses medicamentos devido ao alto custo.
A decisão do TRF1
Após a sentença de 1ª instância, tanto o INPI quanto o laboratório brasileiro EMS, que já possui autorização da Anvisa para produzir a versão genérica da liraglutida, recorreram ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1). O tribunal suspendeu os efeitos da sentença, entendendo que a decisão inicial contrariava o entendimento consolidado do STF.
Na decisão, o Tribunal disse que a alegação de “mora administrativa” não se sustenta juridicamente. Foi destacado que, mesmo durante a tramitação do pedido de patente, o titular já dispõe de mecanismos legais para proteger seu invento contra exploração indevida.
Além disso, não foi demonstrado qualquer prejuízo concreto à Novo Nordisk no período, já que nenhum outro laboratório lançou um medicamento genérico enquanto pendia a análise do INPI. Ou seja, a empresa vendeu os medicamentos, sem concorrência.
Com a suspensão da sentença, fica liberada a possibilidade de outras empresas iniciarem a produção da liraglutida genérica no país, sem risco de responsabilização por violação de patente.
Genéricos em outros países
O Brasil virou uma espécie de último suspiro para o alto faturamento da Novo Nordisk com as canetas, uma vez que os genéricos já estão em pleno vigor em outros mercados relevantes. A patente se encerrou em 2017, na China. No Japão, caiu em 2022. Na Europa e nos Estados Unidos, o fim do prazo ocorreu em 2023.
Nos EUA, empresas como Teva e Hikma lançaram versões autorizadas do Victoza, em 2024. Na Europa, companhias como Adalvo e Biocon também já receberam aprovação regulatória.
Segundo especialistas, a liberação desses genéricos no exterior ocorreu após o vencimento das mesmas patentes que ainda estão em disputa judicial no Brasil. O movimento internacional reforça o entendimento de que a proteção já se encerrou — e que eventuais extensões podem representar entraves ao acesso e à concorrência.
O contexto global da Novo Nordisk também ajuda a explicar os desmedidos esforços para manter a exclusividade no Brasil. A farmacêutica, que se tornou uma das maiores empresas da Europa, impulsionada pelo sucesso dos medicamentos contra obesidade e diabetes, agora enfrenta uma fase de instabilidade: anunciou o corte de 9 mil postos de trabalho no mundo, viu ações caírem mais de 20%, e enfrenta questionamentos sobre a sustentabilidade de seu modelo de negócios.
Analistas apontam que o fim das patentes da liraglutida em mercados maduros reduziu as margens e pressionou investidores. Nesse cenário, manter a exclusividade no Brasil é visto como uma tentativa de compensar perdas globais — ainda que às custas do acesso das canetas aos mais pobres.
Função social da patente
A discussão sobre a liraglutida ilustra um tema mais amplo: como equilibrar a proteção à inovação com o direito de acesso à saúde. O modelo de patentes busca incentivar pesquisa e desenvolvimento, mas, segundo decisões do STF e do STJ, não pode ser utilizado para prorrogar artificialmente exclusividades comerciais.
“A Novo Nordisk tenta levar o Judiciário brasileiro ao entendimento de que a patente ainda é válida, mas o STF já demonstrou com clareza que não é. Os relatórios da ANVISA são preocupantes e alongar a patente artificialmente prejudica a população brasileira”, diz Daniela Rosa Coelho, advogada da EMS.
Documentos públicos mostram que a incorporação da liraglutida ao SUS chegou a ser descartada anteriormente por falta de custo-benefício. Estudos da Fiocruz citados em decisões judiciais alertam que extensões indevidas de patentes podem encarecer tratamentos e comprometer a sustentabilidade do sistema público de saúde.
Enquanto o processo aguarda julgamento definitivo no TRF1, uma provocação se impõe: por quanto tempo o Brasil seguirá debatendo o que o resto do mundo já resolveu?
O QUE DIZ A NOVO NORDISK
A partir da matéria “A quem interessa evitar que canetas de
emagrecimento cheguem aos pobres?”, publicada no site da revista Veja, no último dia 25 de setembro de
2025, a Novo Nordisk esclarece que têm trabalhado em prol da garantia da segurança jurídica para empresas
de inovação no Brasil, justamente para assegurar que toda a sociedade tenha acesso a medicamentos inéditos
e revolucionários.
Não há qualquer intenção da Novo Nordisk em impedir o acesso da população a medicamentos por meio do
SUS. O pleito da empresa trata exclusivamente da recomposição do prazo de vigência de patentes, como
forma de compensar e devolver o tempo que o INPI levou para analisar e conceder os registros. O que ocorre é
que há uma evidente morosidade do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) na aprovação de
patentes – como foi no caso da PI0410972-4, submetida em 03 de junho de 2004 e concedida apenas em 30 de
janeiro de 2018 – ou seja, o tempo de retorno de P&D para o desenvolvimento de um medicamento, que
mudou os rumos da saúde no mundo, foi de 35% do prazo de direito.
É importante esclarecer que esse processo não interfere nas decisões de incorporação de medicamentos no
SUS, nem nos critérios de avaliação de custo-efetividade adotados pela Conitec e pelos gestores de saúde. O
fato de alguns estados avaliarem custos não guarda qualquer relação com a discussão de recomposição de
prazo patentário.
Em linha com práticas internacionais, quando há atrasos irrazoáveis na análise de patentes, os prazos são
recompostos — exatamente como a Novo Nordisk pleiteia no Brasil.
O objetivo da Novo Nordisk, portanto, é garantir segurança jurídica e previsibilidade para continuar investindo
no país e trazendo continuamente as mais recentes tecnologias para beneficiar os brasileiros.
 
	 
                 Paulo Betti causa divergências ao falar sobre megaoperação no Rio
Paulo Betti causa divergências ao falar sobre megaoperação no Rio Rio de Janeiro recebe oferta de apoio militar de governadores de direita
Rio de Janeiro recebe oferta de apoio militar de governadores de direita O que disse Memphis Depay para Oruam após operação no Rio
O que disse Memphis Depay para Oruam após operação no Rio Lula se manifesta pela primeira vez sobre operação contra o Comando Vermelho no Rio
Lula se manifesta pela primeira vez sobre operação contra o Comando Vermelho no Rio Os números estrondosos conquistados por Vini Jr. e Virginia em 24h
Os números estrondosos conquistados por Vini Jr. e Virginia em 24h 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										







 ACESSO LIVRE COM VIVO FIBRA
ACESSO LIVRE COM VIVO FIBRA