Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana

Matheus Leitão

Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
Continua após publicidade

A nova mentira de Eduardo Bolsonaro

O deputado agora quer desmoralizar a vítima. Existem muitas provas de que Miriam Leitão foi torturada por Paulo Malhães, que colocou a cobra em sua cela

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 6 abr 2022, 16h01 - Publicado em 5 abr 2022, 10h05
  • Seguir materia Seguindo materia
  • A desumanidade de Eduardo Bolsonaro não nos deixa prosseguir, virar a página para os muitos debates que o país precisa travar à medida que seu pai, Jair, continua a atacar as instituições democráticas brasileiras.

    Agora, após desdenhar da tortura sofrida por uma mulher aos 19 anos, grávida e presa em um quartel do Exército brasileiro, o deputado afirmou o seguinte: “sobre a questão da cobra existe apenas a palavra da Miriam Leitão dizendo que ocorreu”.

    Mentira.

    Trata-se de mais uma covardia do filho do presidente nas redes sociais, que ele usa preferencialmente para propagar o ódio. E, com isso, inflamar pessoas que, como ele, têm também visões nada democráticas, mais que isso, desumanas.

    É a tentativa agora de colocar em dúvida se a tortura existiu, como se fosse preciso.

    São inúmeras provas de que centenas de pessoas, neste caso especificamente Miriam Leitão, foram vítimas de tortura na ditadura.

    Vamos a elas.

    Continua após a publicidade

    Em 2012, os repór­teres de O Globo Chico Otavio, Juliana Dal Piva e Marcelo Remí­gio foram os responsáveis por descobrir a verdadeira identidade do torturador Dr. Pablo: o coronel Paulo Malhães.

    O próprio Paulo Malhães, em entrevis­ta aos repórteres, confirmou que usava cobras e jacarés em interrogatórios.

    Sua imagem de torturador, no entanto, seria amplamente reproduzida dois anos depois, em 2014, quando ele novamente ad­mitiu participação em torturas, dessa vez perante a Comissão Nacio­nal da Verdade.

    Menos de trinta dias após o depoimento ele foi morto.

    Ao envelhecer, Paulo Malhães mantivera os cabelos fartos dos quais minha mãe e dezenas de outros presos no Espírito Santo, onde eles foram encarcerados e torturados pela ditadura, se recordavam quando eu os entrevistei para o livro e o documentário Em Nome dos Pais.

    Continua após a publicidade

    Ou seja, ele foi reconhecido como torturador por vários dos presos políticos que foram encarcerados com Miriam Leitão, e não só por ela.

    Miriam Leitão, presa pela ditadura, grávida, aos 19 anos
    Miriam Leitão, presa pela ditadura, grávida, aos 19 anos (Justiça Militar/Reprodução)

    Conto no livro Em Nome dos Pais que uma fonte da alta patente do Exército me informou que havia apenas um militar com o codinome Dr. Pablo entre os que atuaram na repressão. Ele também era o único a usar animais nos interrogatórios, sua terrível marca registrada, digamos assim.

    Foi ele, Paulo Malhães, que colocou a cobra na cela de Miriam Leitão, minha mãe.

    Todavia, como sabia que para muitos essas evidências não eram suficientes, fiz questão de buscar mais provas, de preferência, documentais, para saber o que ele, Malhães, estava fazendo naquele final de 1972 quando ela foi presa. Por isso, procurei sua Folha de Alterações.

    Continua após a publicidade

    Este é o nome dado a um precioso documento que registra, semestral e detalhadamente, as atividades de um mili­tar. Eduardo Bolsonaro conhece o valor e a importância do documento, mas finge não saber de sua existência em vídeo publicado nas redes sociais.

    Depois de muitos meses de insistência, uma fonte militar me entregou a Folha de Alterações de Paulo Malhães.

    Na página 65 das 143 do documento, en­contrei a resposta à pergunta sobre por onde ele andava no segundo semestre de 1972.

    O Exército registra que, entre 4 de outubro e 31 de dezembro de 1972, Malhães desempenhou funções “na 2a Se­ção do I Exército” e estava “à disposição do Doi/I Exército”.

    Folha de Alterações de Paulo Malhães
    Folha de Alterações de Paulo Malhães (Matheus Leitão/Reprodução)
    Continua após a publicidade

    O Espírito Santo, onde Miriam foi presa, está dentro da área do “I Exército”, e o que os superiores do então capitão Malhães registraram é que ele trabalhou por dois meses e vinte e nove dias na 2a Seção e no Doi, o aparato mais repressivo da ditadura.

    Exatamente nesse período Miriam Leitão e outros estudantes da Universidade Federal do Espírito Santo foram presos e torturados na 2ª Seção de um batalhão do I Exército.

    Só o paciente tempo de investiga­ção me levou a essa prova documental que confirmou que, de fato, Malhães atuou no 38º batalhão de Infantaria, em Vila Velha, na época em que o grupo de Vitória esteve preso.

    Para completar, o ex-delegado da Polícia Civil do Espírito Santo e ex-agente do Serviço Nacional de Informações (SNI) Cláudio Guerra confirmou, também em entrevista ao documentário, que Paulo Malhães estava em Vitória na primeira semana de dezembro de 1972 com uma jiboia que havia sido trazida do Rio de Janeiro numa caixa de isopor. Guerra atuava na repressão do Espírito Santo.

    Ângela Milanez, presa um dia antes de minha mãe, também foi torturada com a mesma cobra, e contou, em entrevista a mim, sobre como foi enfrentar o animal.

    Continua após a publicidade

    O filho do presidente também pode consultar os autos da Justiça Militar, a mesma que inocentou Miriam Leitão. Nos documentos, existe o depoimento dela, dado em 1973, na qual ela relata a tortura com a cobra. 

    Para o Ministério Público, que o deputado tanto defendeu contra seus inimigos políticos, é a prova mais cabal de que houve tortura no regime, já que não fazia sentido denunciar um crime em plena ditadura, quando o depoente – e foram mais de 20 mil desses depoimentos – poderia sofrer novas agruras. 

    Depoimento de Miriam Leitão em 1973
    Depoimento de Miriam Leitão em 1973 (Justiça Militar/Reprodução)

    Tentar desmoralizar a vítima da tortura é nefasto. Mas também é um clássico das pessoas que não têm sentimentos humanos.

    Como se pode ver, leitor, são inúmeras provas. Mas Eduardo, além de fazer chacota da tortura sofrida por ela, por elas, por vários brasileiros e brasileiras durante o regime militar, mais uma vez mente sobre fatos.

    Certamente preocupado com a proporção de sua perversa fala, incluindo os pedidos de cassação de seu mandato, Eduardo Bolsonaro gravou esse vídeo em que verbaliza essa nova mentira – “sobre a questão da cobra existe apenas a palavra de Miriam Leitão” – e outras fake news sobre a ditadura militar.

    No vídeo, ele parece baixar o tom, tentando dar fim ao caso, mas as instituições brasileiras não deveriam deixá-lo sair impune.

    Apologia à tortura é crime.

    Em qualquer país sério defender um regime ditatorial e seus torturadores levaria à perda de mandato e à responsabilização criminal.

    O Brasil tem escolhido o pior destino.

    Jornal da época que informa sobre denúncia de Miriam Leitão
    Jornal da época que informa sobre denúncia de Miriam Leitão (O Globo/Reprodução)
    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Semana Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    Apenas 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

    a partir de 35,60/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.