O procurador-geral da República, Paulo Gonet, e o ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino, nove meses depois de suas nomeações por Luiz Inácio Lula da Silva, assumem as missões de suas vidas nos cargos: devolver a governabilidade ao Executivo e repor parte dos poderes perdidos nos últimos anos sobre o orçamento da União – o principal instrumento de fazer política pública no país. Desta forma, estarão contribuindo para a democracia brasileira.
A governabilidade foi atingida no dia em que o Congresso Nacional tornou impositiva a execução das emendas à Lei Orçamentária Anual (LOA), no governo Dilma Rousseff, já sob a inspiração de Michel Temer – um célebre defensor do semipresidencialismo (ou seja, do presidencialismo pela metade, desempoderado) e que chegou ao cargo sem ter votos nem popularidade para tanto.
Com as emendas impositivas, o Executivo perdeu a chave do cofre e a negociação política que ficou conhecida pelo apelido de “toma lá, dá cá” mas que faz parte de qualquer relação entre executivo e legislativo. Essa imposição de liberação, seja qual for o resultado das contas públicas e as necessidades da administração, limitou o rol de possibilidades de o presidente para a aquisição de apoio parlamentar.
O problema é que a aprovação das emendas impositivas não foi o suficiente para o Congresso e ele passou a aumentar o valor e rubricas de emendas cada vez mais a cada novo orçamento. No período Bolsonaro tudo piorou porque o governo deixou o Congresso criar as tais emendas de relator que se transformaram num escândalo, cujo fim foi decretado pelo STF.
As gestões do PT muitas vezes, em vez de dedicar à persuasão, foram por outros caminhos que levaram a escândalos como o mensalão. Mas o funcionamento ideal do presidencialismo é a de haver essa negociação constante entre o executivo e o legislativo, não se perdendo o princípio de que o executivo comanda o orçamento.
As dificuldades da governabilidade agora não se deve ao fato de a legislatura ser conservadora. Afinal, conservadores já estiveram com Lula sem constrangimentos, quando não tinham garantidos milhões de reais em emendas para suas bases (e, por isso, precisavam percorrer a via crucis da Esplanada, com o chapéu e o pires sempre na mão).
Daí a relevância do papel desempenhado por Flávio Dino e Paulo Gonet agora: ao se voltar contra o orçamento secreto e as emendas pix, poderão restituir ao Executivo o controle da pauta da Câmara e do Senado e recompor a obrigatoriedade de os congressistas pedirem licença – pagando com votos – para abocanhar as tetas da viúva.
De quebra, farão o favor de moralizar o mais voraz sorvedouro de recursos públicos de que já se teve notícia.