Relâmpago: Assine Digital Completo por 2,99
Imagem Blog

Matheus Leitão

Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog

A litigância predatória afeta economia e os negócios, diz especialista

O advogado Luciano Timm destaca a importância do julgamento no STJ para frear o avanço das demandas fraudulentas

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 19 fev 2025, 06h30

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decide, nesta quarta-feira, 19, sobre os limites do chamado poder geral de cautela do juiz no âmbito do Tema Repetitivo 1.198. Em termos práticos, a Corte Especial pode validar ou afastar a possibilidade de o magistrado solicitar que a parte autora emende a petição inicial e apresente documentos que sustentem os pedidos feitos no processo em caso de suspeita de litigância predatória. Esse debate vem mobilizando não só o Judiciário, como setores econômicos do país.

As demandas fraudulentas são uma questão de política econômica e eficiência regulatória, afirma Luciano Timm, advogado e professor de Direito Econômico, em entrevista à coluna. Isso porque cerca de 30% das ações cíveis nos tribunais estaduais decorrem de práticas advocatícias predatórias, com um custo anual estimado de R$ 12,7 bilhões ao sistema de Justiça.

Para ele, a solução para esse problema exige uma abordagem coordenada entre os poderes Judiciário e Legislativo, bem como soluções vindas do mercado.

Nesse debate, um ponto que gera preocupação é se o voto do ministro Humberto Martins, que reduz a atuação do Judiciário, prevaleça. “Caso o voto do ministro Humberto saia vencedor, o impacto para o sistema de justiça seria péssimo. A retirada de ferramentas para frear ações predatórias sobrecarregaria ainda mais o Judiciário, encareceria serviços financeiros e geraria ainda mais insegurança jurídica para empresas e cidadãos”, explica. Confira abaixo a entrevista.

Qual é o custo da litigância predatória para a sociedade? Quais são os impactos econômicos desse fenômeno no sistema judiciário e como isso afeta o acesso à justiça para cidadãos e empresas?

Luciano Timm – A litigância predatória tem um custo social e econômico significativo, pois afeta tanto o funcionamento do sistema judiciário quanto a atividade econômica das empresas e cidadãos. Do ponto de vista da Análise Econômica do Direito (AED), trata-se de um clássico caso de externalidade negativa, onde um pequeno grupo se beneficia às custas do coletivo. 

E, como impactos no Judiciário, podemos citar a sobrecarga dos tribunais com litígios repetitivos e massificados que congestionam os tribunais e dificultam o julgamento de demandas legítimas. O Brasil já tem um dos sistemas mais congestionados do mundo, com milhões de processos em estoque.  

Além disso, há o aumento dos custos administrativos, pois o Estado precisa alocar mais juízes, servidores e infraestrutura para lidar com processos artificiais, o que desvia recursos de casos relevantes.  

Continua após a publicidade

Há ainda o custo direto da Justiça, uma vez que, em 2023, as despesas do Poder Judiciário brasileiro atingiram R$ 132,8 bilhões – o que representa 1,2% do PIB nacional e 2,38% dos gastos totais da União, estados e municípios.  

Em termos de impacto da litigância predatória, destaca-se que aproximadamente 30% das ações cíveis nos tribunais estaduais decorrem de práticas advocatícias predatórias, o que gera um custo anual estimado de R$ 12,7 bilhões ao sistema judiciário. 

Em relação aos impactos na economia e no acesso à Justiça, há o encarecimento do crédito e dos serviços, na qual empresas que lidam com um alto volume de ações predatórias, como bancos e operadoras de telefonia, repassam esses custos para os consumidores.  

Ocorre também o desestímulo ao investimento, afinal um sistema judiciário disfuncional e sujeito a abusos gera insegurança jurídica, reduz a atratividade do Brasil para investimentos.  

Em termos de dificuldade de acesso à Justiça para casos legítimos, é importante destacar que o acúmulo de demandas artificiais cria uma fila processual que penaliza aqueles que realmente precisam do Judiciário para resolver conflitos legítimos. 

Continua após a publicidade

Para se ter uma ideia, no estado de São Paulo, entre 2016 e 2021, a litigância predatória resultou em um prejuízo estimado de R$ 16,7 bilhões, com uma média anual de 337 mil processos desse tipo. Todas as varas cíveis foram significativamente impactadas. 

As medidas adotadas pelos tribunais brasileiros para coibir a litigância predatória são suficientes? O que ainda precisa ser feito para resolver o problema?  

Luciano Timm – Os tribunais já adotaram algumas medidas para enfrentar a litigância predatória, mas ainda há grandes desafios. 

Dentre as medidas já adotadas estão as Notas Técnicas elaboradas por núcleos de inteligência; as súmulas e temas repetitivos que o  STJ e o STF têm publicado para consolidar entendimentos e evitar que o mesmo tema gere milhares de processos com decisões contraditórias.  

Há ainda as sanções processuais no âmbito do CPC, que prevê punições para litigância de má-fé, como multas e condenação em honorários. No entanto, elas ainda são subutilizadas e enfraquecidas pelo uso quase irrestrito do benefício da assistência judiciária gratuita.  

Continua após a publicidade

Outra medida adotada é o poder geral de cautela que alguns tribunais têm utilizado medidas cautelares para barrar a proliferação de ações abusivas. 

Dentro do que ainda precisa ser ainda precisa ser feito está o fortalecimento da responsabilização de litigantes predatórios, com multas e sanções que devem ser mais rigorosas, de forma a atingir potencialmente também advogados e escritórios que operam de forma abusiva – tudo isso na forma do CPC e garantindo sua defesa, por óbvio.  

Cabe ainda o maior uso de inteligência artificial no Judiciário, pois as ferramentas de IA podem identificar padrões de litigância predatória e permitir uma gestão mais eficiente dos processos repetitivos.  

Outra medida viável é o reforço de incentivos para métodos alternativos de resolução de disputas, como mediação e arbitragem que precisam ser mais estimuladas, de maneira a reduzir a dependência do Judiciário para resolver conflitos contratuais.  

Destaco ainda a adoção de filtros processuais para litigantes reincidentes e de critérios objetivos para concessão do benefício da assistência judiciária gratuita, além de ⁠⁠alguma punição direta ou indireta para juízes que não respeitam precedentes.  

Continua após a publicidade

Trata-se de uma questão que pode ser solucionada pelos tribunais locais? 

Luciano Timm – Não. Embora o Judiciário tenha um papel importante, o problema é estrutural e exige uma abordagem coordenada entre o Judiciário, na repressão mais efetiva e uso de tecnologia, o Poder Legislativo, com ajustes no CPC para restringir ações abusivas, e o mercado ao incentivar soluções extrajudiciais de conflitos e uso de autorregulação setorial. 

O problema não pode ser tratado apenas como uma questão técnica do Judiciário – ele afeta diretamente a economia e o ambiente de negócios. 

*O STJ está discutindo o tema no âmbito do julgamento do Tema Repetitivo 1.198. Os caminhos que o STJ está traçando até agora realmente contribuirão para o enfrentamento da litigância predatória?* 

O Tema 1.198 discute a melhor forma de o Judiciário lidar com ações repetitivas e litigância predatória. A questão central é o uso do poder geral de cautela dos juízes para frear ações abusivas. 

O julgamento ainda não foi concluído, mas há um risco significativo para o sistema de justiça. 

Continua após a publicidade

O STJ ainda não finalizou o julgamento do Tema 1.198, mas há um risco real de que a decisão final não seja suficientemente rigorosa para conter a litigância predatória. 

Isso porque o voto do relator (manutenção do status quo) defende que o Judiciário pode fazer uso dos poderes de cautela para investigar a litigância predatória. Já o voto do Ministro Humberto (redução da atuação do Judiciário) propõe reduzir o uso do poder geral de cautela dos juízes, dificultando a adoção de medidas preventivas contra litigância predatória. Se essa posição prevalecer, haverá ainda mais incentivos para escritórios especializados continuarem ajuizando ações predatórias em massa, sem qualquer controle. 

Caso o voto do Ministro Humberto saia vencedor, o impacto para o sistema de justiça seria péssimo. A retirada de ferramentas para frear ações predatórias sobrecarregaria ainda mais o Judiciário, encareceria serviços financeiros e geraria ainda mais insegurança jurídica para empresas e cidadãos. 

Qual o papel da OAB no combate à litigância predatória? 

Luciano Timm – Além do Judiciário, a OAB tem um papel essencial no enfrentamento da litigância predatória, especialmente no controle de ofertas publicitárias ilegais por redes sociais. Atualmente, muitos escritórios especializados em ações massificadas e abusivas utilizam publicidade agressiva para captar clientes, prometendo ganhos fáceis e incentivando a judicialização desnecessária. Esse fenômeno, amplamente presente no Google, Instagram e Facebook, contribui para a explosão de processos artificiais. 

Outro problema grave está no _enforcement_ do Código de Ética da OAB. Há uma percepção de que os tribunais de ética da OAB são lentos e lenientes na punição de infrações éticas, o que pode reduzir o efeito dissuasório contra práticas abusivas.  

Se a OAB deseja realmente atuar contra a litigância predatória, precisa fortalecer a fiscalização de publicidade irregular para evitar a captação indevida de clientes por anúncios enganosos. Além disso, é necessário agilizar e endurecer o julgamento de infrações éticas, garantindo que advogados que praticam litigância predatória sejam responsabilizados 

É importante também aumentar a transparência nos processos éticos internos, permitindo que a sociedade tenha mais clareza sobre como a OAB lida com infrações.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

ECONOMIZE ATÉ 82% OFF

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
Apenas 2,99/mês

Revista em Casa + Digital Completo

Receba 4 revistas de Veja no mês, além de todos os benefícios do plano Digital Completo (cada revista sai por menos de R$ 9)
A partir de 35,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
Pagamento único anual de R$35,88, equivalente a R$ 2,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.