Por que o chefe da Funai quer que a PF abra um inquérito contra ele mesmo
Após ser flagrado em gravação, Marcelo Xavier quer que corporação diga se há elementos para suspeitar que ele se envolveu no arrendamento de terra indígena
Após o presidente da Funai, Marcelo Augusto Xavier, ser gravado em conversa telefônica com um coordenador regional do órgão que seria preso semanas depois, sua reação foi inusitada. Xavier pediu à Polícia Federal para abrir um inquérito que investigue se ele tem relação com um esquema de arrendamento ilegal da terra indígena Marãiwatsédé, caso que era pano de fundo da conversa entre os dois.
Na gravação, o presidente da Funai diz ao coordenador, Jussielson Gonçalves Silva, que ele deveria ficar tranquilo em relação a um pedido de informações da PF que foi feito em fevereiro deste ano, semanas antes da deflagração de uma operação que prendeu Jussielson. Xavier diz que havia acionado corregedores da corporação e garante “sustentação” ao subordinado. “Pode ficar tranquilo aí, que você tem toda a sustentação aqui”, responde o presidente da Funai, segundo a transcrição que consta em um relatório da PF. Jussielson e outros dois militares que trabalhavam na coordenação local da Funai seriam presos cerca de um mês depois.
Em um comunicado, o presidente da Funai sugere que os documentos enviados pela PF à Justiça Federal teriam sido utilizados de forma descontextualizada no processo, com a intenção de provocar repercussão midiática. Um dos seus argumentos é que o próprio Ministério Público Federal (MPF) teria, após ver o conteúdo dos áudios, refutado “as afirmações de cunho subjetivo” sobre a conversa e sobre indícios de que Xavier teria interesse no caso. Nos autos do processo, porém, o MPF diz que o comportamento do presidente da Funai foi estranho, ao enviar um ofício questionando o delegado da PF responsável pela operação que prenderia o coordenador.
“Chama a atenção a demora que a Funai tem para responder as requisições do MPF e a velocidade, um dia, para o presidente da FUNAI levou para encaminhar o ofício”, diz o procurador Everton Araújo. O procurador ainda diz que “não tem o menor sentido” um questionamento do presidente da Funai sobre quais seriam “os eventuais prejuízos causados pela suposta ausência no fornecimento das informações aos agentes de Polícia Federal”.
Sobre o áudio, Xavier diz que o conteúdo foi tirado de contexto e que sugestões de que ele pode ter envolvimento no caso, baseado nos relatórios da PF, “são ficções, baseada em ilações, conjecturas e elucubrações que estão dissociadas do dever de veracidade, com juízo valorativo e descrição sobre o potencial envolvimento do presidente da Funai em atividade ilegal, o que, além de leviano, causou danos morais e materiais aos gestores e à própria fundação”.
O presidente da Funai pediu que, caso a PF opte por não abrir uma investigação, apresente uma justificativa plausível para deixar de fazê-lo “sob pena de prevaricação”. Já a PF diz que recebeu o pedido de Xavier e vai analisá-lo, mas não falou em prazo para a decisão.