Impedido de manter contato com o ex-presidente Jair Bolsonaro, Valdemar Costa Neto tem penado para articular as negociações que envolvem as eleições municipais, uma de suas principais ambições atuais. Reportagem de capa de VEJA desta semana mostra como o Partido Liberal (PL) terá um caixa bilionário para despejar em milhares de candidaturas da sigla pelo Brasil, já de olho em 2026.
A proibição de contato entre os correligionários foi determinada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes como medida cautelar da investigação que apura o planejamento de um suposto golpe de Estado após as eleições de 2022. Além de Bolsonaro e Valdemar, o general Walter Braga Netto também entrou na mira do magistrado — o trio está proibido de se falar. A decisão, inclusive, levou ao afastamento do general da função de secretário de Relações Institucionais do PL, uma vez que, a principal atividade do posto — articular candidaturas municipais — ficou inviabilizada.
Os motivos para a determinação vão além de uma simples decisão judicial? Valdemar tem lá suas teorias. Segundo o cacique, que nega qualquer envolvimento na trama golpista, o entrevero com Moraes começou em 2022, por causa da famigerada auditoria das urnas eletrônicas, contratada pelo PL.
Em meados de 2021, diz Valdemar, Moraes organizou uma reunião com presidentes partidários para tratar da tramitação na Câmara do projeto que restabelecia o voto impresso e defendeu que uma mudança como aquela, no ano seguinte, seria repentina e perdulária. O líder do PL concordou e se comprometeu a orientar a bancada a votar contra. Assim foi feito: o PL e siglas como o PT, PSDB e DEM se manifestaram contra o voto impresso. À época, Bolsonaro ainda não havia se filiado ao PL.
Após a derrota para Lula nas eleições de 2022, como bem sabe-se, o partido contratou uma empresa — o Instituto Voto Legal (IVL) — para fazer uma auditoria sobre o segundo turno do pleito. A empresa foi indicada pelo senador astronauta Marcos Pontes (PL-SP), que havia sido ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações do governo Bolsonaro. A ideia de se fazer uma fiscalização independente à do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), diz Valdemar, partiu do próprio ex-presidente e de correligionários. Havia, inclusive, dificuldade em se achar uma empresa para prestar o serviço — daí a indicação de Pontes. As informações constam de depoimento do cacique à Polícia Federal — os sigilos das declarações foram derrubados por Moraes em março deste ano.
No curso da fiscalização, os peritos da IVL não apresentavam nada de interessante, lembra Valdemar. Até que uma informação chamou a atenção. “Eles chegaram com uma notícia para mim de que, nas urnas novas, Bolsonaro tinha ganho a eleição. E que, nas velhas, nós havíamos perdido. Eu falei: ‘Isso aqui é de outro mundo’. Mandei o pessoal checar e fazer as contas. Mas não tinha provas”, diz.
Mesmo assim, os resultados animaram Bolsonaro, que pressionou Valdemar a entrar com um processo no TSE pelo PL. Na hora de assinar, no entanto, o ex-presidente não quis. “O Bolsonaro é assim. Ele não assina nada que tenha dúvida. Por exemplo, aquela coisa da minuta de golpe. Tenho certeza que ele não faria. Tenho certeza que jamais ele assinaria”, explica.
No vai-não-vai, coube a Valdemar e ao advogado do PL, Marcelo Bessa, ingressarem com a ação no TSE pedindo que fossem “invalidados os votos decorrentes das urnas” com mau funcionamento, sob risco de “desconformidades irreparáveis”. “Ou seja, eu tinha falado lá atrás com o Alexandre [de Moraes] que eu era a favor das urnas e assinei aquilo. E na hora de apresentar o relatório para a imprensa, o Carlos Rocha [do IVL] me deixou numa fria e eu que tive que falar. Então, o Alexandre ficou chateado comigo. Mas passou”, pondera.
Desde que Moraes impôs a proibição de comunicação entre Braga Netto, Bolsonaro e Valdemar, o cacique tem tentado derrubar a restrição, mas sem sucesso. O último pedido foi feito no final de junho, solicitando que ele e o ex-presidente sejam autorizados a fazer reuniões e a trabalhar no mesmo ambiente.