Na última quarta-feira, 2, com o voto do ministro Alexandre de Moraes, o placar no Supremo Tribunal Federal (STF) chegou a quatro votos favoráveis à descriminalização do porte de maconha para uso pessoal — medicinal ou recreativo. Porém, houve divergência em relação aos critérios que serão utilizados para que o usuário não seja criminalizado, como a quantidade da droga. O julgamento foi suspenso pelo relator, Gilmar Mendes, e deve voltar à pauta nas próximas semanas.
O debate é por uma mudança na Lei Antidrogas, sancionada em 2006 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A legislação não especifica critérios objetivos para diferenciar consumo próprio de tráfico, deixando a decisão para cada autoridade. “Antes se prendia o usuário, ele tinha uma sanção privativa de liberdade, mas que permitia a substituição por penas alternativas. A partir da nova lei, com a mesma quantidade, esse passou a ser, inúmeras vezes, classificado como pequeno traficante”, lembrou Moraes em seu voto.
O ministro propôs que a pessoa flagrada com 25 a 60 gramas de maconha ou até seis plantas seja considerada usuária. Mas ele ressaltou que há exceções e as autoridades devem considerar outros elementos, como a forma que a droga foi encontrada, a diversidade de entorpecentes e a apreensão de outros instrumentos, como celulares, por exemplo. Acima dessa quantidade, ela poderia ser tratada como traficante.
O relator, Gilmar Mendes, foi o primeiro a votar, em 2015. O ministro não sugeriu critérios quantitativos, mas foi o único que defendeu que o julgamento seja estendido para todas as drogas, não só a maconha. “Dar tratamento criminal ao uso de drogas é medida que parece ofender, de forma desproporcional, o direito à vida privada e à autodeterminação”, disse.
Edson Fachin também deu voto favorável apenas à descriminalização do porte da erva, mas afirmou que os parâmetros devem ser estabelecidos pelo Legislativo. “A distinção entre usuário e traficante atravessa a necessária diferenciação entre tráfico e uso e parece exigir que se adotem parâmetros objetivos de quantidade que caracterizem o uso de droga. Não parece inserir-se na atribuição do Poder Judiciário, entretanto, a definição desses parâmetros”, declarou.
Já Luís Roberto Barroso propôs o limite 25 gramas de maconha, critério adotado por países como Portugal. “É uma política de criminalização e de repressão que consome cada vez mais recursos, que são recursos que evidentemente não vão para tratamento, educação e saúde preventiva”, afirmou.
Reportagem de capa de VEJA desta semana mostra que a discussão sobre o uso da cannabis para fins medicinais avança um pouco mais rápido em outra alta Corte judicial. Só neste ano, vinte cidadãos bateram à porta do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e saíram de lá com um salvo-conduto para plantar maconha com essa finalidade sem serem incomodados pelas autoridades. Leia a reportagem aqui.
Segundo o Ministério da Justiça, 28% da população carcerária está presa por crimes previstos na Lei Antidrogas. Um estudo do Ipea revelou que 59% dos réus por tráfico portavam até 150 gramas. “Essa lei criou o encarceramento em massa”, afirma Gabriella Arima, diretora da Rede Reforma, um coletivo de juristas que atua por mudanças na política de drogas.