Como nasceu o superbloco que mexe com o governo e com Lira no Congresso
Negociações entre caciques do MDB, PSD e Republicanos culminaram na nova frente, que promete ser protagonista no jogo legislativo
Prestes a completar 100 dias de gestão, Luiz Inácio Lula da Silva enfrenta dificuldades para montar a base que dará sustentação à sua atuação no Congresso. Reportagem da edição de VEJA desta semana mostra como o surgimento de um novo bloco partidárioembaralha ainda mais o já complicado tabuleiro de negociações na Câmara.
Composto por cinco partidos e 142 deputados, o “superbloco” já nasceu com tamanho suficiente — mais de um quarto dos 513 parlamentares — para ser protagonista no jogo legislativo. Formado por MDB, PSD, Republicanos, Podemos e PSC, o grupo já é maior que o bloco de partidos de esquerda que deram sustentação a Lula na campanha e praticamente se iguala à soma da dupla PL-PP, as legendas que atualmente se colocam como oposição, com 148 parlamentares.
A nova frente surpreendeu também porque se apresentou tanto com partidos que têm cargos no governo, como MDB e PSD, como com outros longe da influência de Lula, como o Republicanos, que apoiou Jair Bolsonaro na eleição e que sempre comungou da cartilha do Centrão chefiado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
As negociações para a construção do grupo, oficializada no final de março, ocorreram simultaneamente a duas conversas frustradas para alianças — uma entre MDB e PSDB e outra, mais provável, entre PP e União Brasil. A iminente viabilização desta última suscitou receio entre os demais partidos, principalmente após a demonstração de força dada por Lira ao aprovar a PEC da Transição, muito cara ao governo Lula.
Assim, a formalização do “superbloco” buscou neutralizar a influência do presidente da Câmara e contou com a atuação de três importantes caciques — Baleia Rossi (MDB), Gilberto Kassab (PSD) e Marcos Pereira (Republicanos), todos presidentes de suas siglas.
Também pesou a necessidade de acomodar interesses regionais. Na Bahia, MDB e PSD são os principais aliados do PT . Nas últimas eleições, a chapa ao governo foi formada por Jerônimo Rodrigues (PT) e o vice Geraldo Júnior (MDB), enquanto PP e União estiveram do lado oposto na eleição — rompido com o PT, o então vice-governador do estado, João Leão (PP), decidiu apoiar ACM Neto (União), cuja chapa tinha Cacá Leão (PP) ao Senado. Já em São Paulo, MDB e PSD estão com o governador Tarcísio de Freitas, do Republicanos, cuja direção há muito se afastou do jogo de Lira e de seu aliado Elmar Nascimento (União-BA).
Nos bastidores, os caciques da frente dizem que querem se diferenciar da política “baseada no orçamento secreto” de Lira. No horizonte, está até uma candidatura à Presidência da Câmara no ainda distante 2025.
Disputa pregressa pelo posto, vale assinalar, é um dos elementos que culminaram na criação do novo “superbloco”. Da primeira vez que participou da corrida ao comando da Câmara, no começo de 2021, Lira concorria contra Baleia Rossi, do grupo de Rodrigo Maia (PSD-RJ) — que, por sua vez, havia montado um conjunto de pré-candidatos, com, além do cacique do MDB, Elmar Nascimento (União), Marcelo Ramos (PSD-AM) e até mesmo Marcos Pereira (Republicanos). Elmar, à época no DEM, foi o primeiro a “pular fora” da aliança, o que contribuiu para a solidificação de um acordo tácito entre PP e o futuro União.
Enquanto a dupla ganhava corpo, o cenário em São Paulo era mais solto. Em 2022, Gilberto Kassab (PSD) ficou neutro na disputa presidencial e lançou Tarcísio (Republicanos) e o vice Felício Ramuth (PSD), enquanto Baleia Rossi (MDB) lançou Simone Tebet (MDB) ao Planalto e apoiou Rodrigo Garcia (PSDB) ao Palácio dos Bandeirantes.
Nessa toada, havia um caminho mais natural de aliança entre o PSDB e o MDB — o entrave, no entanto, é que a bancada tucana na Câmara sempre foi mais próxima de Arthur Lira e, até certo ponto, do governo Bolsonaro, o que frustrou a acomodação do acordo. Com o Republicanos se descolando do ex-presidente e com a proximidade local e programática entre os três caciques paulistas — Baleia, Pereira e Kassab, que sondam inclusive uma aliança para apoiar a reeleição de Ricardo Nunes à Prefeitura de São Paulo –, formalizou-se a criação do novo superbloco, que se coloca agora como coringa no jogo legislativo.