Comissão do Senado discute PEC que permite privatizar praias da União
Proposta de emenda à Constituição transfere a propriedade dos chamados 'terrenos de marinha' para estados, municípios e agentes privados
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado voltou a discutir uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que transfere a propriedade de terrenos públicos no litoral brasileiro, chamados de “terrenos de marinha”, para estados, municípios e agentes privados. Hoje essas áreas pertencem à União.
Os proprietários de imóveis nesses locais, construídos antes da aprovação de legislações ambientais, pagam uma taxa anual à União para ocupar a área, além de outros impostos. Caso o projeto seja aprovado, pessoas e empresas privadas poderiam adquirir o terreno mediante pagamento. Para os estados e municípios, a transferência seria gratuita. A PEC também beneficia resorts e condomínios que possuem “praias particulares”.
O texto foi apresentado originalmente na Câmara, em 2011, pelos ex-deputados Arnaldo Jordy, José Chaves e Zoinho, e aprovado em 2022, mas estava parado no Senado desde agosto de 2023. A CCJ da Casa realiza uma audiência pública nesta segunda-feira, 27, para debater a proposta. Está prevista a participação dos prefeitos de Florianópolis, Topázio Neto, de Belém, Edmilson Rodrigues, e de Manaus, David Almeida, além de representantes do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e entidades ligadas à proteção ambiental.
O relator na comissão, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), deu parecer favorável à PEC. Ele alega que a mudança é necessária para regularizar as propriedades. “Os terrenos de marinha causam prejuízos aos cidadãos e aos municípios. Os cidadãos têm que pagar tributação exagerada sobre os imóveis em que vivem: pagam foro, taxa de ocupação e IPTU. Já os municípios sofrem restrições ao desenvolvimento de políticas públicas quanto ao planejamento territorial urbano em razão das restrições de uso dos bens sob domínio da União”, diz.
Críticas
A PEC é duramente criticada por entidades ligadas à proteção ambiental. O Grupo de Trabalho para Uso e conservação marinha (GT-Mar), ligado à Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso, também se posicionou contra a proposta, sob o argumento de que a privatização das áreas pode causar prejuízos ao meio ambiente, impactar a pesca, acelerar o processo erosivo da costa brasileira e intensificar as mudanças climáticas.
“Um exemplo prático do ocorrido está em Balneário Camboriú (SC), onde a supressão das dunas e praias por calçadões e avenida beira-mar durante as últimas décadas acarretou severos impactos no ambiente de praia, tais como a diminuição da área de lazer da praia Central e o sombreamento da praia”, diz o GT.
A Articulação Nacional das Pescadoras (ANP), o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP) e o Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP) também divulgaram uma nota de repúdio ao projeto. “A possibilidade de privatização dos terrenos de marinha e a maior facilidade de agentes econômicos colocarem seus interesses junto a prefeituras e governos estaduais ocasionaria ameaças aos territórios de povos tradicionais, que habitam há décadas áreas hoje compreendidas nos terrenos de marinha, gerando conflitos fundiários, ameaças a culturas e aos modos de vida destas populações e à sua sobrevivência”, afirmam as entidades.