Bolsonaro é condenado por ter dito que ‘pintou um clima’ com meninas
Tribunal de Justiça do DF reverteu decisão de primeira instância e obrigou ex-presidente a pagar R$ 150 mil em danos morais coletivos por frase dita em 2022

Há dias sob o risco de ser preso por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Jair Bolsonaro foi condenado nesta quinta-feira, 24, a pagar 150.000 reais em danos morais coletivos por ter dito, durante a campanha presidencial de 2022, que “pintou um clima” com meninas venezuelanas menores de idade. Ele foi processado pelo Ministério Público Federal e o caso foi julgado improcedente na primeira instância. Porém, nesta quinta, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT) reformou a decisão e impôs um revés ao ex-presidente.
O caso foi julgado pela 5ª Turma Cível do TJDFT e a deliberação não foi unânime entre os desembargadores. O relator do caso, desembargador Fábio Eduardo Marques, foi contra o recurso do MPF e votou para a sentença de primeiro grau ser mantida, mas foi vencido pelo voto divergente, que teve o apoio de três dos cinco membros da Turma.
“A frase ‘pintou um clima’ em referência a adolescentes, somada à inferência direta e maliciosa de que ‘ganhar a vida’ se refere à exploração sexual ou à prostituição, objetifica as jovens, as sexualiza e insinua, de maneira inaceitável, uma situação de vulnerabilidade e disponibilidade sexual. Tal abordagem é, de modo flagrante, misógina, por vincular a aparência física feminina a uma conotação sexual pejorativa, e aporofóbica, ao associar a condição social de migrantes e a penúria econômica à suposta necessidade de prostituição”, diz trecho do voto da desembargadora Lucimeire Maria da Silva, que venceu o julgamento.

Em outro momento, o voto vencedor afirma que a repercussão do episódio também causou grave prejuízo às meninas e às famílias, que tiveram suas imagens expostas. “As condutas do Requerido, na qualidade de Chefe de Estado, ao desrespeitar os direitos à dignidade e à imagem de crianças e adolescentes, e ao propagar discursos estigmatizantes sobre um grupo vulnerável, geraram uma lesão ao espírito civilizatório e aos valores de uma sociedade que busca a proteção integral de seus menores”, diz outro trecho.
O MPF pediu uma indenização de trinta milhões, mas o Tribunal bateu o martelo sobre o valor de 150.000 reais. Bolsonaro ainda pode recorrer, tanto para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) quanto para o Supremo Tribunal Federal (STF).

Relembre o caso
Durante a campanha presidencial de 2022, Bolsonaro disse, durante uma entrevista a um podcast, que no ano anterior, 2021, esteve na comunidade de São Sebastião, em Brasília, quando havia “pintado um clima” com uma menina venezuelana de 14 anos. Ele disse que entrou na casa dela e encontrou outras meninas “bonitas” e “arrumadinhas” e insinuou que elas estavam se arrumando em pleno sábado para se prostituirem.
“Eu estava em Brasília, na comunidade de São Sebastião. Parei a moto numa esquina, tirei o capacete e vi umas menininhas, três, quatro, bonitas, de 14, 15 anos, arrumadinhas no sábado. Vi que elas eram meio parecidas. Pintou um clima, eu voltei. ‘Posso entrar na sua casa?’. Eu entrei. Tinha umas 15, 20 meninas sábado de manhã, se arrumando. Todas venezuelanas. Eu pergunto: meninas bonitinhas se arrumando no sábado pra quê?”, disse o ex-presidente na entrevista. A fala teve ampla repercussão e Bolsonaro publicou um vídeo de desculpas, dizendo que ela foi “retirada de contexto”.
Defesa irá ao STJ contra decisão
O advogado Marcelo Luiz Avila de Bessa, que representa o ex-presidente no caso, disse que recebeu a decisão do TJDFT “com surpresa” e que levará o caso para o STF.
“A defesa de Jair Messias Bolsonaro recebeu com surpresa a decisão da 5ª Turma Cível do TJDFT que, por apertada maioria, reformou sentença da 1ª instância e julgou procedente ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios contra o ex-Presidente da República. Os fundamentos adotados pela Corte desconsideram integralmente decisões definitivas proferidas pelo Tribunal Superior Eleitoral e pelo Supremo Tribunal Federal sobre o assunto, citam provas inexistentes nos autos e, por tais razões, a referida decisão certamente não irá prevalecer no Superior Tribunal de Justiça”, disse o advogado em nota enviada à reportagem.