A brasileira Marina de Menezes, de 34 anos, vive como fugitiva no México desde o dia 1º de fevereiro. A decisão foi tomada, segundo ela, para proteger os filhos – David, de 8 anos, e Olívia, de 4 – dos maus-tratos que sofriam do pai, que detém a guarda das crianças.
Desde o início da fuga, Marina e as crianças já passaram por nove esconderijos diferentes. Ela trocou o número do aparelho de celular e os meninos estão longe da escola desde então. A brasileira fugiu por se recusar a cumprir uma ordem judicial que determina que entregue os filhos ao pai, o mexicano Abraham Salazar Télles – ele não foi localizado para comentar as acusações feitas por Marina.
“Existe uma ordem de busca e apreensão para devolvê-las ao pai. A polícia está lá fora procurando pelas crianças”, contou Marina para o blog. “Não quero fugir da lei, quero que elas sejam respeitadas, ter acesso igualitário, sem discriminação, contar com proteção da justiça de maneira justa.”
Ela diz que a audiência que lhe tirou a guarda das crianças foi injusta e discriminatória ao dar mais valor à nacionalidade do pai do que ao bem-estar das crianças. Marina afirma que as crianças apanhavam na casa do pai e da avó e que isso desencadeou uma série de problemas de cunho emocional, como terror noturno, autoflagelação (arrancam os cabelos) e a menina não controla o esfíncter. “Eram agredidas com sapatos, cintos e objetos de madeira. A avó paterna também obrigava a que meus filhos a chamassem de ‘mamá’ e que se dirigissem a mim pelo meu nome”, conta.
Nas redes sociais, Marina e parentes defendem que as crianças sejam ouvidas no processo. Ela reivindica a aplicação da convenção de Haia e afirma que tratados internacionais recomendam que a opinião das crianças seja considerada em casos como o dela.
“A única coisa que queremos é que os Direitos da Criança e do Adolescente protegidos pela ONU, que dizem que crianças menores de 12 anos não devem ser separadas da mãe salvo se ela representar um risco, não sejam esquecidos. Que a Convenção de Haia não seja atropelada e que a opinião e relato das crianças sejam ouvidos e tomados em consideração. Não queremos nada mais do que a aplicação das leis e a da justiça. E eu quero que meu direito à maternidade seja respeitado e protegido.”
Os problemas de Marina começaram em 2016, quando decidiu de separar do marido após ser vitima de violência doméstica. Ela conta que sofria violência física e emocional 24 horas por dia. “Ele me sufocou com as mãos e arremessou minha cabeça contra a parede”, conta ela sobre uma das discussões que tiveram na frente dos filhos.
Marina diz que o ex-marido sequestrou os filhos no dia em que deveria acontecer a assinatura do divórcio. “Ele se aproveitou que eu estava trabalhando e sequestrou aos meus filhos. Vivíamos na cidade de Tijuana e ele levou as crianças para a casa dos pais, na Cidade do México, a quase 3 000 km de distância.”
Segundo ela, o pai e avó materna praticavam alienação parental, além de violência emocional. “Das poucas vezes que saíram para comer fora, meu filho pedia para ir a um restaurante que ele gostava, mas ela dizia que não, que precisavam ir a um mais barato já que tinha que sobrar dinheiro para comprar doces para o cachorro. Meu filho tem plena consciência de que o cachorro era mais importante que eles. Minha filha diz que o cachorro ia ao parque passear e eles não.”
Marina diz que trabalhava no mercado financeiro antes da separação, mas precisou mudar de cidade para ter acesso aos filhos. Recentemente, estava vivendo de traduções. Desde a separação, ela chegou a ficar dez meses sem contato com as crianças. Em uma das audiências da época, foi determinado que ela poderia ter 2 horas de contato com os filhos a cada 15 dias e dentro de um correspondente local ao juizado de menores. Para poder ver as crianças, ela fez um acordo se comprometendo a não sair do México e reconhecendo que o ex tinha a guarda provisória dos filhos. Marina conta que ao saber dos maus-tratos que os filhos sofriam, entrou com um processo de modificação da guarda. Por meio dele, conseguiu uma liminar que lhe permitiu ficar um ano e meio com as crianças.
“Nesse ano e meio, o pai jamais foi até nossa casa visitar e somente ligou no Natal e aniversário do meu filho, mas eles não quiseram atender a ligação. As únicas vezes que tiveram contato foi porque queriam pedir seus brinquedos de volta, coisa que foi negada”, diz.
A Comissão de Direitos Humanos do Instituto dos Advogados de São Paulo fez um relatório no qual diz haver indícios de que Marina sofreu discriminação por ser brasileira. O relatório foi enviado para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e para a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, com pedido de providências.
O Itamaraty informa que o caso de Marina “tem sido objeto da mais atenta atuação o Consulado-Geral do Brasil na Cidade do México, sempre nos limites da não intervenção nas decisões da justiça mexicana”. “Desde 2016, aquele consulado realizou reiterados apelos às instâncias envolvidas no processo e manteve contato frequente com a cidadã brasileira e seus familiares.”
A brasileira conta que as crianças gostariam de vir para o Brasil, mas que isso está fora de cogitação no momento. “Configuraria sequestro internacional, o que se complicaria a situação. Mas isso é o que eles mais querem.”