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Se cuida, homem! Envelhecimento masculino ainda é cercado de desafios

Especialista se debruça sobre os últimos dados do Censo para refletir sobre a necessidade de mais cuidados preventivos entre os brasileiros

Por Marcelo Bendhack*
Atualizado em 9 Maio 2024, 19h57 - Publicado em 21 nov 2023, 12h41

Dados do último Censo revelam que o Brasil está envelhecendo. A tendência é ter cada vez menos jovens e cada vez mais idosos. Esse envelhecimento da população brasileira ocorreu principalmente entre 2010 e 2022, maior índice registrado entre duas edições da pesquisa nacional desde 1940.

Nos anos 1940, havia 5,6 idosos (cidadãos com 65 anos ou mais) para cada 100 jovens (até 14 anos). Na década de 1990, o país tinha 13,9 idosos para cada 100 jovens. Agora, no período entre 2010 e 2022, passou de 30,7 para 55,2 idosos para cada 100 jovens. O Censo 2022 também indica que 10,9% da população tinha mais de 65 anos; no levantamento realizado há 12 anos, eram 7,4%.

Outro dado importante é que a mortalidade masculina é maior em todos os grupos etários. Assim, além de envelhecer mais rápido, o Brasil está cada vez mais feminino.

Com base nesse cenário, o país terá impactos sociais, econômicos e sobre os sistemas de saúde. Será preciso criar mais espaços e melhor infraestrutura nas cidades. Exigirá uma nova arquitetura, melhores condições para a mobilidade, mais locais para lazer e bem-estar para a chamada “melhor idade”.

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Cronologicamente, o envelhecimento aumenta a probabilidade de doenças crônicas e comorbidades, fato já bem compreendido por cientistas e médicos. Não à toa, o avanço da idade aumenta significativamente a incidência de um indivíduo ter câncer.

Diante disso tudo, talvez tenha chegado a hora de parar e refletir sobre o futuro que nos aguarda. Os desafios do envelhecimento são e serão imensos. As ideias de Guimarães Rosa em Grande Sertão: Veredas continuam atuais: “A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.”

Coragem para encarar que nada é só preto ou só branco. Uma vida mais longeva vai exigir coragem e mudança de paradigmas. Entender que nossos recursos naturais são finitos, assim como nossa saúde é finita. Que o que enxergamos hoje como “medicina padrão ouro” vai evoluir tanto a ponto de compreender que a cada milésimo de segundo nossa constituição celular muda, que o tempo e o espaço não são apenas cronológicos, mas também respeitam o tempo-espaço-vida.

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A partir desse ponto, outros mecanismos começam a ser observados e investigados. A influência e as mutações genéticas, as implicações disso no desenvolvimento de um câncer, as pesquisas sobre a idade biológica (epigenética) e sua relação com fatores externos e ambientais.

+ LEIA TAMBÉM: Quem quer ser um centenário?

A epigenética, fenômeno que tem muito a ver com o câncer, se refere a modificações no DNA que não alteram a sequência de bases, mas influenciam a expressão gênica, isto é, se um gene é ligado ou desligado. Essas modificações podem ocorrer em resposta a fatores ambientais, por exposição a produtos químicos, provocados por dietas, pelo estresse, má alimentação, entre outros.

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A partir dos dados sobre o envelhecimento da população brasileira, tudo pode mudar, desde a conduta médica até os tratamentos. Porém, permanecerão o incentivo à prevenção e o rastreio de inúmeras doenças e síndromes.

Estamos expostos a fatores positivos e negativos constantemente. Isso é intrínseco à vida. Do lado negativo, pouca atenção se dá ao estresse, às mudanças climáticas, ao sedentarismo, à urgente agenda de atividade física – pelo menos míseros 30 minutos ao dia! Seguindo esse script tão atual, fica difícil desejar viver mais e ao mesmo tempo com qualidade de vida.

Por mais que a medicina avance muito e que mais pessoas desejem essa longevidade quase highlander, a ciência pode (e deve) caminhar para um pensamento holístico, para uma compreensão integral do ser humano. O que inclui conscientização para os mecanismos de prevenção e de rastreamento, por exemplo.

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+ LEIA TAMBÉM: Câncer de próstata – rastrear ou não?

Idade biológica e câncer

A idade cronológica é o fator de risco número 1 para quase todas as doenças malignas humanas, um fator amplo e extensivamente documentado na literatura científica. Por outro lado, a epigenética desempenha um papel crucial nos cânceres esporádicos, como nas alterações por fatores ambientais, exposição a toxinas, dietas, estresse, hábitos alimentares, sedentarismo, entre outros, que podem causar alterações que, ao influenciar a expressão gênica, contribuem para o desenvolvimento de tumores.

Enquanto a genética foca nas mutações herdadas e adquiridas no DNA, a epigenética examina outras modificações que regulam a expressão gênica. Entender tanto a genética e a idade cronológica quanto a epigenética é crucial. A interação de fatores genéticos e epigenéticos, juntamente com influências ambientais, dá uma imagem mais completa da origem e da progressão das doenças, em especial do câncer, o que pode abrir caminhos para terapias mais direcionadas, individualizadas e eficazes.

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Se o avanço da idade cronológica e as influências ambientais e comportamentais são fatores que podem indicar aumento de incidência e probabilidade de doenças, o que devemos fazer?

É possível compreender que o rastreamento para diagnosticar sinais de câncer de próstata antes que o paciente apresente qualquer sintoma da doença deva ser avaliado quanto aos benefícios, e se superam os riscos desses exames. No entanto, simplesmente anunciar que “não é indicado para pessoas assintomáticas, a menos que o homem tenha histórico de câncer na família ou fatores de risco” pode gerar ruído na comunicação, uma vez que a interpretação da mensagem pela população em geral pode levar à negligência sobre a importância dos exames de rotina.

Há estudos robustos e bem desenhados que demonstram que o rastreamento pela dosagem do PSA reduz os casos de morte por câncer de próstata. O Estudo Europeu Randomizado de Rastreamento do Câncer de Próstata avaliou o rastreamento randomizado em homens de oito países europeus, com participação de 182.160 indivíduos, acompanhados até 2014 (máximo de 16 anos), com uma faixa etária central predefinida de 162.389 homens (55-69 anos), selecionados a partir do registro da população.

Os resultados apresentados corroboram com outros estudos realizados anteriormente: o exame reduz significativamente a mortalidade por câncer de próstata, mostrando um benefício absoluto maior com um acompanhamento mais longo e uma redução no excesso de incidência. O rastreamento repetido pode ser importante para reduzir a mortalidade por câncer de próstata em nível populacional.

Conforme a avaliação apontada, alguns questionamentos são importantes. Vejamos: se cronologicamente o envelhecimento pode contribuir para o aumento e a incidência de doenças crônicas e comorbidades, se fatores econômicos, sociais, ambientais e comportamentais podem indicar uma condição epigenética desfavorável, se prevenir é melhor que remediar, qual a mensagem que se deve passar para milhares e milhares de pessoas, sobretudo para os homens já não tão afeitos aos cuidados com a saúde?

* Marcelo Bendhack é médico urologista, uro-oncologista e presidente da Associação Latino-americana de Uro-oncologia (Urola)

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