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Por que as emergências climáticas viraram assunto médico?

Além de uma mudança no padrão e perfil das doenças infecciosas, consequências serão maiores em populações vulneráveis, incluindo na saúde materna e infantil

Por Leonardo Vedolin*
10 jun 2024, 08h00

No mesmo período em que os olhos de todo o Brasil (e do mundo) se voltaram para a catástrofe com as chuvas no Rio Grande do Sul e a terrível repercussão de suas causas ambientais, sociais e econômicas, a revista inglesa The Lancet, a mais importante em ciências médicas, lançou o relatório de mudanças climáticas e seus impactos na saúde. O título da publicação reflete a urgência frente aos eventos climáticos extremos, supostamente naturais, já sofridos pela população em todo o mundo: acontecimentos sem precedentes exige ações sem precedentes.

O documento aponta que a mudança climática pela emissão de CO2 é real e está comprometendo – e tirando! – a vida e o bem-estar das pessoas. Feita com a contribuição de 69 pesquisadores e especialistas de instituições renomadas, a publicação explica que temperaturas recordes foram registradas em 2023 e os impactos à saúde causam danos, principalmente, à população vulnerável.

Para se ter uma ideia do cenário trazido pela Lancet, a Europa já tem clima propício para proliferação de vetores de doenças como dengue, chikungunya, zika — patologias ligadas a temperaturas tropicais. A Espanha, a França e a Itália são alguns dos países que apresentaram mais casos dessas doenças em 2022 do que os anos de 2020 e 2021 juntos.

O relatório aponta, por exemplo, que o sul da Europa tende a ser mais afetado por doenças relacionadas ao calor, incêndios florestais, insegurança alimentar, seca, patologias transmitidas por mosquitos e leishmaniose. Em contraste, o norte da Europa é mais afetado pela bactéria Vibrio, que causa doenças como a cólera, assim como por carrapatos, que podem transmitir a doença de Lyme.

Os dados mostraram ainda que os impactos nocivos do aquecimento global têm recortes de gênero, classe e grupos minoritários. A mortalidade relacionada ao calor, por exemplo, foi duas vezes maior em mulheres em comparação aos homens. Famílias de baixa renda, que moram em regiões mais afetadas por eventos climáticos, tiveram uma probabilidade substancialmente maior de sofrer com a insegurança alimentar e exposição à fumaça devido aos incêndios florestais.

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O resultado do trabalho é um panorama imperativo das consequências de políticas ambientais negligenciadas por governos, empresas, mídias e população, além de convocar a sociedade para uma ação rápida, agora. E a rapidez da proliferação é proporcional ao aumento do calor: frente às temperaturas recordes no planeta em 2023, os cientistas acreditam que o temido crescimento de 1,5°C no clima global esteja muito mais perto de acontecer. “Chegou a hora de tomar medidas sem precedentes para limitar estes impactos negativos na saúde da Europa e em todo o
mundo”, diz Rachel Lowe, membro da diretoria da Lancet Countdown na Europa.

A crise climática e a América Latina

Apesar de estar focado na Europa, o estudo da Lancet vai ao encontro do relatório da World Meteorological Organization (WMO) sobre o clima nos países do Caribe e América Latina. Depois de um 2023 de calor recorde, fome e doenças estão se espalhando pelo continente americano, resultados de inundações em algumas regiões e secas severas em outras.

O relatório aponta que, nos últimos 12 meses, a região sul do Brasil foi atingida por cinco ciclones extratropicais — consequência do El Niño. Foi o fenômeno, junto a uma massa de ar quente na região central do país que bloqueia a frente fria, o responsável pelas chuvas incessantes que causaram as terríveis inundações no Rio Grande do Sul no início de maio.

E as ações globais para proteger os cidadãos são morosas. Seguindo trajetória atual de iniciativas, a neutralidade carbônica só será alcançada em 2100. E alguns indicadores importantes estão piorando: a utilização de carvão, por exemplo, aumentou para 13% do fornecimento total de energia da Europa em 2021, em comparação com 12% em 2020.

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Diante desse contexto, a saúde mundial deve sofrer um impacto grave. Além de uma mudança no padrão e perfil das doenças infecciosas, o que tende a aumentar o surgimento de pandemias como a de covid-19, as consequências serão maiores em populações vulneráveis, incluindo na saúde materna e infantil.

O Banco Mundial também estima que 21 milhões de pessoas morrerão até 2050 devido ao clima extremo, diarreia, nanismo ou dengue. A previsão é que sistemas de saúde fiquem ainda mais sobrecarregados e com dificuldades em responder a catástrofes sem perda de qualidade ou sustentabilidade.

Assim como o comprometimento político e empresarial tem evoluído mais lentamente do que o esperado na Europa, em países em desenvolvimento, como o Brasil, a temática começou a entrar na pauta só recentemente. Com a catástrofe no Rio Grande do Sul, é urgente que formadores de políticas públicas entrem no debate, e façam essa discussão de forma ampla, com a inserção da saúde populacional dentro do enfrentamento das crises climáticas. É notório que a questão é complexa, com impacto no PIB e projetos grandes de infraestrutura. Mas a saúde pública não pode ser excluída dos temas prioritários.

* Leonardo Vedolin é diretor-geral médico e de cuidados integrados da Dasa

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