A dor crônica é um problema de saúde pública que afeta milhões de pessoas no Brasil e no mundo. Estima-se que cerca de 30% da população global conviva com algum tipo de dor persistente, o que compromete a qualidade de vida, assim como o bem-estar emocional e social.
Muitos desses indivíduos passam por tratamentos ineficazes e acabam dependentes de medicamentos com sérios efeitos colaterais, como os opioides.
Recentemente, a medicina tem adotado diferentes tecnologias para tratar a dor crônica de forma mais eficaz, com a neuromodulação se destacando entre essas abordagens. A técnica, conhecida como estimulação medular, ou SCS (do inglês Spinal Cord Stimulation), interfere nos sinais nervosos que o corpo envia ao cérebro, proporcionando alívio significativo e duradouro da dor, especialmente em pacientes que não obtiveram sucesso com outras condutas.
O tratamento consiste no implante de um ou mais eletrodos na medula espinhal que enviam impulsos elétricos, interrompendo os sinais de dor antes que alcancem o cérebro. O dispositivo responsável por esses impulsos é uma pequena bateria, semelhante a um marca-passo, implantado de forma minimamente invasiva, em geral na região do flanco.
A terapia pode ser ajustada de maneira personalizada com base na necessidade do paciente. Essa é uma técnica amplamente utilizada principalmente no tratamento de dores neuropáticas, como as dores crônicas da coluna, entre outras, com resultados satisfatórios.
Uma das grandes vantagens da abordagem é a possibilidade de ajuste contínuo do dispositivo, permitindo que o tratamento seja otimizado ao longo do tempo. Implantes mais modernos oferecem múltiplas terapias e podem atuar em diferentes áreas de dor simultaneamente, com soluções capazes de aliviar a dor em minutos. Além disso, existem modelos recarregáveis que podem durar até 15 anos, o que garante um alívio duradouro.
A quem é indicada
Mesmo com sua eficácia e segurança comprovadas, a neuromodulação não é indicada como primeira linha de tratamento para dor crônica, sendo fundamental uma seleção cuidadosa dos pacientes. A estimulação medular é prescrita sobretudo a pacientes que passaram por cirurgias de coluna e continuam a sentir dor, uma condição conhecida como síndrome pós-laminectomia (Failed Back Surgery Syndrome, FBSS), que afeta de 20 a 30% dos indivíduos operados.
Estudos clínicos mostram uma melhora significativa na dor, com uma redução média de 6 pontos na escala de dor mesmo após 2 anos do implante, resultando em uma melhora na qualidade de vida e tornando essa técnica uma alternativa valiosa.
Mas a neuromodulação também tem mostrado resultados positivos em pacientes que não passaram por cirurgias prévias, com diversos estudos comprovando os benefícios do tratamento precoce das dores crônicas difíceis de tratar, como enxaquecas crônicas, síndrome de dor complexa regional, dores isquêmicas e relacionadas a problemas de circulação sanguínea.
A técnica é especialmente promissora em outras condições que envolvem dores neuropáticas, caso da neuropatia diabética, superando os resultados de tratamentos convencionais e podendo chegar a 80% de alívio do desconforto.
Hoje, a estimulação medular já está no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que regula os planos de saúde, e no SUS. Com os avanços tecnológicos, a expectativa é que a solução se torne mais acessível, trazendo esperança a quem sofre de dores crônicas debilitantes.
* Fabricio Assis é anestesiologista e médico intervencionista da dor, membro do corpo clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, dos Hospitais Vila Nova Star e São Luiz Itaim, em São Paulo, e da Clínica Singular, em Campinas, também foi o presidente fundador da Sociedade Brasileira de Médicos de Dor (SOBRAMID) e da Latin American Pain Society