É possível ter qualidade de vida com a DPOC?
Doença, que tem no tabagismo um de seus principais fatores de risco, pode ser controlada com tratamento disponível inclusive no SUS
Chegar à terceira idade sem energia para pegar os netos no colo e sair para passear com o cachorro não faz parte de qualquer plano de aposentadoria. Tampouco perder o ar após poucos minutos de caminhada ou não conseguir tomar um simples banho sozinho. Infelizmente, essa realidade acompanha parte dos cerca de 210 milhões de pessoas em todo o mundo que possuem doença pulmonar obstrutiva crônica, a DPOC.
São em torno de 6 milhões de indivíduos com a condição só no Brasil. A enfermidade, que engloba o enfisema pulmonar e a bronquite crônica, é considerada a quarta principal causa de morte evitável no país, além de afetar diretamente a qualidade de vida, inclusive a saúde mental, de muitos pacientes.
Além de seus principais sintomas, como tosse e falta de ar, serem subestimados no dia a dia, a DPOC carrega o estigma de doença incurável, embora haja tratamento. Com isso, o diagnóstico tende a ocorrer tardiamente após episódios de crise, quando o pulmão já está comprometido.
Os parâmetros psicossociais que envolvem a DPOC são significativos por diversos motivos, como o fato de o tabagismo ser um dos principais fatores de risco e o paciente ter certa consciência sobre sua responsabilidade e, ao mesmo tempo, enfrentar dificuldades para largar o cigarro.
Portanto, quando se depara com a exacerbação dos sintomas a ponto de ter sua capacidade física restringida, suas relações afetivas abaladas e até mesmo suas atividades profissionais impactadas – o que, muitas vezes, compromete a renda familiar –, o que fica para aquele indivíduo é o sentimento de culpa. Consequentemente, cerca de 30% desses pacientes apresentam um quadro depressivo.
De acordo com um estudo realizado em parceria com a Universidade de Pernambuco e a Secretaria Estadual da Saúde de Pernambuco, alguns portadores da forma mais grave da doença apresentam deficiência na oxigenação, o que compromete de forma significativa todos os domínios da qualidade de vida, sendo registrada a redução de 40% da qualidade de vida naqueles considerados dependentes da suplementação do oxigênio. Em paralelo, a incapacidade de desenvolver as atividades cotidianas e a dependência dos familiares para realizar os cuidados pessoais e a alimentação acabam contribuindo para ansiedade e depressão.
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Soma-se a esse cenário de adversidades o fato de que estes pacientes costumam ter outras comorbidades que afetam o sistema respiratório, como asma, insuficiência cardíaca, apneia obstrutiva do sono, refluxo gastroesofágico e exposição ambiental a alérgenos. Existe, ainda, o desafio quanto ao uso adequado do dispositivo inalatório (que faz com que o medicamento chegue ao pulmão), que frequentemente requer orientação médica criteriosa.
DPOC não tem cura, porém, é tratável e conta com diferentes classes de medicamentos broncodilatadores com administração em um único dispositivo disponíveis gratuitamente pelo SUS. Diversos estudos mostram que associar o tratamento medicamentoso com atividade física em qualquer estágio da doença garante reabilitação pulmonar, otimizando a performance física, social e a autonomia. Vale ressaltar que essas medidas são responsáveis, ainda, por menos internações e episódios de sintomas exacerbados.
Atualmente, as sociedades médicas de pneumologia promovem diversas atividades e cursos orientando os pacientes como conviver bem com a DPOC, tendo como diretriz olhar o pulmão como o órgão principal para o tratamento da comorbidade associado à garantia de mais bem-estar.
Aos pacientes que são fumantes, que apresentam sintomas de tosse, falta de ar e chiado no peito, recomendo veementemente que procurem um pneumologista e lembrem-se: conheçam o seu pulmão antes que os danos se apresentem. A consulta ao especialista faz diferença para evitar complicações evitáveis e manter a qualidade de vida.
* Clystenes Soares é pneumologista e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)