‘Diabesidade’ é a real pandemia do século
Afora a idade maior do que 70 anos, os casos graves e mortes pela Covid-19 foram justamente em portadores de obesidade e diabetes
Novos dados da Federação Internacional de Diabetes apontam que o número de portadores da doença aumentou 16% nos últimos dois anos, principalmente o diabetes tipo 2. Atualmente existem 537 milhões de pessoas vivendo com diabetes no mundo. A mortalidade anual decorrente desta enfermidade crônica e progressiva é alarmante. Uma pessoa morre a cada cincos segundos e só em 2021, o diabetes é responsável por 6,7 milhões óbitos. Nunca é demais reforçar que afora idade maior do que 70 anos, os casos graves e mortes pela Covid-19 foram justamente em portadores de obesidade e diabetes. “Diabesidade” é a real pandemia do século.
Dentre os casos de diabetes tipo 2, existem divisões que melhor caracterizam a doença.
- Portadores de diabetes tipo 2 onde a característica fundamental é a inflamação sistêmica e aterosclerose e a principal manifestação clínica é a doença cardiovascular (20-40% dos casos);
- Aqueles que têm menor produção de insulina e a hiperglicemia é o marcador principal (10-20% dos pacientes);
- E os que tem relação direta com a má distribuição de gordura pelo corpo, (adiposopatia) concentrando mais no abdômen, geralmente associada com a obesidade e resistência à ação da insulina produzida pelo pâncreas (40-70% dos indivíduos).
O grande objetivo do tratamento de qualquer subtipo de diabetes tipo 2 é a prevenção das complicações renais, da retina e dos eventos cardiovasculares. Porém, após a identificação de cada subgrupo de diabetes, as estratégias de tratamento devem ser individualizadas.
Nos pacientes com diabetes tipo 2 e adiposopatia/obesidade, diversas publicações científicas demonstraram que a perda maior que 15% do peso total leva em geral ao controle do diabetes e previne ou trata as complicações renais e cardiovasculares. Essa perda ponderal pode ser conseguida associando-se modificações do estilo de vida a tratamentos farmacológicos modernos. Já existem drogas que podem promover a perda de peso acima de 15% do peso total e algumas outras em fase de pesquisas estarão brevemente disponíveis.
Essas intervenções levam a perdas de peso entre 25% e 35% com até 20 anos de seguimento. Além disso, tem efeitos antidiabeticos diretos, independentes da perda ponderal, que levam a uma maior secreção de insulina pelo pâncreas e diminuição da resistência dos tecidos à ação da insulina. Portanto, quando o melhor tratamento medicamentoso falha, a cirurgia tem sua indicação. A perda maior que 15% do peso total, leva também a outras vantagens, como a melhora da hipertensão arterial, apneia do sono, níveis de colesterol e triglicérides.
Baseado nesses estudos, em colaboração com endocrinologistas internacionais, publicamos no início de outubro de 2021, um artigo na revista Lancet, onde propomos uma modificação do algoritmo de tratamento dos portadores de diabetes tipo 2 e adiposopatia/obesidade.
Dentre as considerações indicadas por nós para a definição de metas de tratamento para o diabetes tipo 2, está a atualização das diretrizes de tratamento da doença, tendo como alvo primário a perda de peso. A meta inicial, é focar nos benefícios do controle da adiposopatia/obesidade para a prevenção das complicações do diabetes, além das bem estabelecidas vantagens da perda de peso a longo prazo.
As Sociedades Europeia e Americana de Diabetes estão considerando modificar suas diretrizes de conduta. É o momento certo para considerar a perda de peso substancial, de mais de 15%, como principal alvo para o tratamento dos pacientes com diabetes tipo 2. Tal mudança nas metas de tratamento reconheceria a obesidade como uma doença com complicações reversíveis e exigiria uma mudança no algoritmo de atendimento clínico.