Racismo sistêmico é trabalho para a educação
A força da imagem distorcida que evidencia o corpo negro como suspeito mesmo que não pratique qualquer ato ainda é forte e precisa ser neutralizada
O relatório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU publicado no dia 28 de junho de 2021, denuncia o Brasil como um dos países onde há racismo sistemático na ação dos policiais. Assinado pela Alta Comissária Michelle Bachelet, ex-presidente do Chile, o documento analisou a situação dos negros no Brasil e apontou e confirmou – de novo – a existência do racismo sistêmico, isto é, o racismo estrutural, bem como, realçou que seu modus operandi decisivo é a ação e manutenção de narrativas que associam falsamente pessoas de ascendência africana com atividades criminosa, e que tais estereótipos continuam sendo utilizados para justificar leis e práticas que regem o sistema de justiça criminal.
Quem viu o jovem negro ser abordado e algemado porque andava de bicicleta na praça pública do entorno de Brasília, Distrito Federal, ou confundido como ladrão por que andava com sua própria bicicleta elétrica no Leblon, no Rio de Janeiro, pode perfeitamente entender a precisão do relatório. Acrescente-se a isso a informação do relatório de que a mortalidade de pessoas negras em intervenções policiais, no Brasil é 183% maior na comparação às pessoas brancas.
Todavia, tão importante quanto a utilização dos estereótipos que justificam as leis que regem o sistema criminal, são extraordinariamente relevantes aqueles que determinam e regem as relações nas leis não escritas ou informais das práticas sociais, e sobretudo aquelas que se relacionam com os acessos, trânsitos e interações nos ambientes públicos e privados, sobretudo no ambiente empresarial.
A pesquisa pioneira e inédita realizada pela Universidade Zumbi dos Palmares no caso do espancamento e morte do cidadão negro João Alberto Silveira Freitas, no interior e pelos seguranças em atividade no Hipermercado Carrefour, debruçou sobre as mesmas questões e abordou o noticiário de mais de 200 veículos de comunicação. O trabalho entrevistou representantes da cadeia da segurança privada e jovens negros, inclusive da própria instituição.
O resultado final aponta, justamente, para a força da imagem distorcida que evidencia o corpo negro como suspeito mesmo que não pratique qualquer ato de suspeição. E, depois, o sentimento de correção e regularidade da atitude que ofende e hostiliza, a partir do entendimento da existência de uma licença social natural para transgredir e punir aquela presença que, além de inoportuna e fora de lugar, é a própria expressão da dúvida, perigo e ameaça simbólica. Impossível de ser compreendida e acolhida, precisa ser desconstituída, neutralizada.