É realista o risco de o governo perder a bússola na crise energética, em meio ao fiasco do descontrole da pandemia, simplesmente porque não transmite mensagem clara e objetiva sobre a dimensão e a complexidade do novo problema que 212 milhões de brasileiros têm neste segundo semestre.
Prova da desconfiança sobre as chances de um racionamento está na reação de indústrias paulistas às cartas de distribuidoras de energia sobre “procedimentos de rotina”, como recomendações técnicas a respeito de planos de “corte de carga”.
Empresas paulistas têm interpretado como confirmação indireta de suspensão preventiva de fornecimento de eletricidade, para evitar blecautes em algumas regiões do Estado de São Paulo. As distribuidoras de energia, o Operador Nacional do Sistema e o governo insistem que se trata de procedimento técnico, parte do ritual burocrático do setor e previsto em contratos de fornecimento.
Sobram incertezas. Todas derivadas de suspeitas de que o governo, por conveniências eleitorais, estaria dissimulando o tamanho real do perigo na maior crise hídrica em nove décadas.
Pelos dados divulgados, nada indica racionamento no horizonte. Pelo menos, até novembro. Mas é evidente o sinal de escassez de credibilidade governamental.
Sem clareza, franqueza e objetividade com a sociedade, dificilmente o governo vai receber solidariedade nessa crise energética — ao contrário do que aconteceu em 2001, no “apagão” do governo Fernando Henrique Cardoso.