
Sete quilômetros separam as avenidas Paulista e Faria Lima. Nesse pedaço de São Paulo, a miríade de escritórios confirma a mutação da antiga cidade industrial em metrópole de serviços.
Em parte da Faria Lima, as alegorias arquitetônicas plantadas guardam a estética utilitária de ativos financeiros — ano passado, o banco Itaú pagou 1,5 bilhão de reais por uma delas, com seis andares erguidos em área de 2 571 metros quadrados.
Essa rua hospeda um grupo corporativo simbólico da aguda concentração da propriedade no capitalismo brasileiro: uma dezena de empresas financeiras administra dois terços do patrimônio nacional em fundos de investimentos. Nelas, joga-se com o futuro. A eleição do ano que vem já é tema essencial nos cenários balizados por pesquisas eleitorais.
Faltam dezesseis meses, mas no ambiente caricatural dos faria limers ficou difícil encontrar quem esteja apostando na permanência de Lula no poder. Ao contrário, a perspectiva de troca de guarda no Palácio do Planalto em 2026 está condicionando as operações.
É o que está contendo a pressão por maior desvalorização dos ativos brasileiros, comentou o empresário Luis Stuhlberger em reunião com investidores na semana passada, completando: “A Faria Lima acha que o PT não vai ganhar”.
Stuhlberger não está solitário nessa interpretação, mas é caso raro entre operadores do mercado financeiro porque costuma dizer com clareza o que pensa ou constata. Projeta uma alta do “custo Lula” durante a campanha, refletindo expectativa de maior desequilíbrio nas contas públicas na hipótese de uma vitória petista nas urnas no ano que vem.
Lula não terá vida fácil, é certo. As pesquisas conhecidas mostram relevante perda de apoio nos últimos doze meses, com taxa de desaprovação em torno de 17 pontos acima da de aprovação. A tendência se repete no segmento majoritário: queda de 23 pontos no apoio entre os eleitores mais pobres, com renda até dois salários mínimos. As sondagens mais recentes indicam estabilidade nesse processo, em comparação com os resultados captados nas sondagens do primeiro trimestre.
Lula se mantém competitivo ao completar 36 anos como candidato presidencial permanente do PT. É uma proeza. Mas as pesquisas estão revelando significativo aumento na rejeição a ele e isso, em tese, deixa aberto o cenário de 2026 para a oposição.
“A Faria Lima acha que o PT vai perder a eleição no ano que vem”
Essa é a base da esperança na troca de governo, dominante na maior parte dos escritórios da Faria Lima. O empresário Stuhlberger resumiu da seguinte forma: “Estão dizendo: ‘Não importa o que o PT fizer de ruim neste ano, porque um novo governo conseguirá arrumar. Se o (Javier) Milei conseguiu (na Argentina), o Tarcísio (de Freitas) consegue’. É o que estão dizendo. E é isso que está segurando o mercado, apesar do descontrole fiscal”.
É perceptível e crescente a pressão da elite paulista para que o governador de São Paulo troque uma possível reeleição estadual pela aventura da candidatura nacional.
Tarcísio reluta com a natural insegurança do outsider em primeiro mandato e a lógica de engenheiro que calcula em quase dois terços a chance de ser reeleito. Além disso, convive com o espectro de Jair Bolsonaro, inelegível, porém candidato a guia da oposição a Lula — situação igualmente desejada pelo adversário petista.
Políticos e empresários de diferentes partidos acham que a decisão sobre a candidatura presidencial de oposição há tempos saiu das mãos de Bolsonaro para as de Tarcísio. Mas a dissonância de Bolsonaro, acham, poderá impor à oposição o custo de mais quatro anos à margem do poder.
O governador paulista ainda não parece animado a dar o necessário passo inicial — reorganizar à margem direita radical as forças políticas anti-Lula ou anti-PT. Ainda estão demasiadamente dispersas, observou dias atrás o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB): “São muitos os nomes colocados, e a dúvida é: esses nomes estarão unidos em 2026? Isso vai dizer muito sobre como vai ser o desempenho da direita nas urnas”.
Imobilizada por Bolsonaro, a oposição assiste à movimentação de Lula em busca de dinheiro para fazer caber dentro dos orçamentos deste e do próximo ano um expressivo aumento de gastos, que ele considera essenciais à campanha eleitoral. É o velho enredo ilusionista sobre equilíbrio das contas públicas em temporadas eleitorais. Como disse Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central, em entrevista a Márcio Juliboni, de VEJA, se Lula se reeleger terá de lidar com a própria herança. Desta vez, será difícil botar a culpa nos outros.
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Publicado em VEJA de 6 de junho de 2025, edição nº 2947