Lula e Bolsonaro mudam para manter a mútua dependência política
Caso da tributação das "bugigangas" mostra que não eles têm um projeto, apenas um manual de sobrevivência eleitoral: Lula x Bolsonaro, e vice-versa.
Lula e Jair Bolsonaro criaram uma relação de dependência recíproca: um precisa do outro para sobrevivência na política.
Lula atravessou disputou seis eleições e ganhou três. Faz comícios, como admitiu na semana passada, de olho na disputa presidencial de 2026.
Bolsonaro apareceu no vácuo do antilulismo, ganhou uma, perdeu outra e se fez inelegível pelos próximos oito anos.
Realizou uma proeza: em apenas meia dúzia de anos deixou de ser o deputado federal do baixo clero que discursava para as paredes da Câmara para se tornar um político conhecido tanto Lula, há quatro décadas no palanque.
Bolsonaro cultiva o antilulismo, Lula lavra no antibolsonarismo. Com diferenças notáveis de concepção sobre a vida na democracia, têm em comum pouca intimidade com a parafernália de comunicação eletrônica, mas, cada vez mais, ambos se dedicam a fazer política por algoritmo.
Quando Lula propõe isenção fiscal na compra de “bugigangas” na internet, abaixo de 50 dólares ou 250 reais, Bolsonaro induz o seu Partido Liberal a apoiar o aumento da tributação das importações e, em consequência, do protecionismo à industria doméstica.
Desde a primeira campanha presidencial, em 1989, Lula levava aos palanques uma cartilha de proteção à indústria brasileira. Nos dois primeiros mandatos empenhou-se na defesa de políticas como a do “conteúdo nacional” na Petrobras e na seleção de empresas amigas que seriam transformadas em “campeãs nacionais” no BNDES. Agora, mudou o discurso.
Bolsonaro governou determinado a não tributar importações de baixo valor via comércio eletrônico, com o argumento de defesa do “liberalismo”. Dele pode-se dizer tudo, menos que seja um liberal. Agora, mudou a retórica.
Esse mercado eletrônico varejista de produtos de baixo valor já era dominado por empresas de um país que Bolsonaro hostilizava em público, a China, nos seus delírios sobre o fantasma do “comunismo”, sepultado há mais de três década. É com esse algoritmo que identifica o adversário Lula.
É notável que Lula e Bolsonaro tenham mudado posições e trocado de lugar por conveniências eleitorais, e não, como talvez fosse razoável supor, por alguma reflexão sobre a realidade do país. Mostram que não têm um projeto, apenas um manual de sobrevivência eleitoral: Lula x Bolsonaro, e vice-versa.