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Informação e análise

Fracasso

A ilusão do golpe guiou a agenda, o governo e a campanha de Bolsonaro em 2022

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 23 Maio 2025, 16h23 - Publicado em 23 Maio 2025, 06h00

Algumas histórias são tão verdadeiras que às vezes parecem inventadas, dizia Manoel de Barros, poeta de palavras escovadas e autor do Livro sobre Nada. É o que se vê no julgamento de militares e civis envolvidos na trama do golpe de Estado para manter Jair Bolsonaro no poder.

A ideia fixa na ruptura institucional guiou toda a agenda governamental na segunda metade do mandato. A retórica golpista foi banalizada à medida que aumentava a incerteza sobre a reeleição. “Eu vou entrar em campo usando o meu Exército”, repetia o presidente-candidato nas reuniões de governo.

Numa delas o chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência chegou a anunciar um plano de espionagem político-partidária. Faltavam doze semanas para o primeiro turno eleitoral, o adversário Lula permanecia na liderança nas pesquisas e o chefe do GSI, Augusto Heleno, general da reserva, decidiu ir à luta.

— Conversei ontem com o novo diretor da Abin, nós vamos montar um esquema para acompanhar os dois lados — anunciou em reunião gravada na terça feira 5 de julho, no Palácio do Planalto. — O problema todo disso é se vazar qualquer coisa, se houver qualquer acusação de infiltração…

Bolsonaro interrompeu: — Peço que o senhor não fale, por favor. Não prossiga mais na sua observação aqui. Se a gente começar a falar… Esquece, pode vazar, então, a gente conversa em particular na nossa sala sobre esse assunto…

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O chefe do GSI não se conteve: — Então, o que tiver que ser feito, tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa, é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa, é antes das eleições… Isso aí tem que ficar bem claro, acho que as coisas têm que ser feitas antes das eleições. E vai chegar um ponto que nós não vamos mais poder falar. Vamos ter que agir, agir quanto a determinadas instituições e contra determinadas pessoas. Isso para mim é muito claro, só isso.

Ainda não se sabe se funcionou, como e quais resultados teriam sido obtidos pela Abin no “esquema” de espionagem ilegal da campanha eleitoral do adversário Lula, confirmado pelo chefe do GSI ao presidente-candidato durante reunião ministerial.

“A ilusão do golpe guiou a agenda, o governo e a campanha de Bolsonaro em 2022”

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Passada uma dúzia de semanas confirmou-se o fracasso do projeto de reeleição. Na terça-feira 1º de novembro, Bolsonaro chamou os chefes militares ao Palácio da Alvorada. Quis saber sobre fraudes nas urnas eletrônicas. Os comandantes do Exército e da Aeronáutica negaram e argumentaram sobre a necessidade de reconhecimento do resultado eleitoral “para acalmar o país”.

Bolsonaro desconversou, perguntou ao advogado-geral da União se havia possibilidade de iniciativa judicial contra o placar das eleições e recebeu outra negativa. “No começo, parecia que estava resignado”, notou Carlos Almeida Baptista Jr., comandante da Aeronáutica, em depoimento, acrescentando: “Ele mudou a partir do dia 14 de novembro”. Foi o dia em que Valdemar Costa Neto, dono do Partido Liberal, apareceu com um “estudo” falseando falhas nas urnas eletrônicas. “Era basicamente um sofisma”, nas palavras do brigadeiro.

No final daquela semana Baptista Jr. encontrou Augusto Heleno no Instituto Tecnológico da Aeronáutica, em São José dos Campos. O chefe do GSI precisava de uma carona em avião da FAB para atender Bolsonaro, que convocara uma reunião no dia seguinte em Brasília.

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O brigadeiro estranhou a urgência para uma reunião no sábado 17 de dezembro, duas semanas antes da posse do novo governo. Então, levou o chefe do GSI a uma sala na biblioteca do ITA. Disse que não havia sido convidado para a reunião, mas desejava que Heleno fosse claro numa mensagem a Bolsonaro: como o Exército, a FAB não participaria de “qualquer movimento de ruptura democrática”.

O general da reserva pareceu-lhe “atônito”. Embarcaram pouco depois. Não se mencionou o nome de Bolsonaro nem se falou em golpismo no voo de uma hora até Brasília, pilotado pelo chefe da Aeronáutica.

Na segunda-feira seguinte, 19 de dezembro, Bolsonaro foi à casa do então ministro das Comunicações, Fábio Faria. Encontrou o juiz José Antonio Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, e o então procurador-geral da República, Augusto Aras.

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A conversa teve o sabor amargo da realidade. Toffoli e Aras sugeriram que ficasse longe do país por algum tempo. Bolsonaro talvez tenha percebido que passou tempo demais acreditando na própria ilusão. Na semana seguinte, embarcou para os Estados Unidos. Quando voltou, ficou inelegível. O enredo ainda não acabou: agora, ele corre o risco de ser condenado à prisão.

Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

Publicado em VEJA de 23 de maio de 2025, edição nº 2945

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