Ferro de soldar na tornozeleira pode levar Bolsonaro à ala psiquiátrica
A partir da manhã desta terça-feira (25/11), o STF pode determinar o cumprimento da pena de 27 anos e três meses de prisão do ex-presidente
A tornozeleira eletrônica virou relíquia, e talvez acabe na vitrine de algum museu da República. É antológico o diálogo na gravação em vídeo da diretora do Centro Integrado de Monitoração Eletrônica, Rita Gaio:
— Equipamento 85916-5. O senhor usou alguma coisa pra queimar?
— Meti um ferro quente aqui — retrucou Jair Bolsonaro.
— Ferro quente?
— Curiosidade…
— Que ferro foi? Ferro de passar?
— Não. Ferro de soldar, solda.
— Ferro de soldar? Aquele que tem uma ponta?
— Sim.
Naquele sábado (22/11), Bolsonaro completava quatro meses com algema eletrônica na perna. A medida preventiva havia sido determinada pelo Supremo Tribunal Federal com base em evidências apresentadas pela polícia.
Uma delas foi um plano de fuga elaborado por um grupo de militares do Destacamento de Reconhecimento e Caçadores e do Comando de Operações Especiais do Exército. Estava resumido num arquivo de cinco slides encontrado no notebook do coronel Mauro Cid, o ex-ajudante-de-ordens da Presidência que delatou Bolsonaro e aliados envolvidos na tentativa frustrada de golpe de estado de 2022.
Na manhã seguinte, acompanhado por advogado, contou a um juiz uma história diferente sobre a violação da tornozeleira eletrônica: disse ter surtado em meio a uma “certa paranoia”, consequência de medicamentos receitados por médicos diferentes — mencionou o ansiolítico pregabalina e o antidepressivo Sertralina.
Ou seja, flagrado em delito com um ferro de soldar, Bolsonaro alegou delírio medicamentoso típico de paciente psiquiátrico.
Nada muito diferente do estado de transtorno mental que se esforça para demonstrar desde 2022, segundo relato dos seus defensores ao STF. Depois da derrota nas urnas, contam, ele se recolheu ao Palácio da Alvorada. Queixoso, parecia vagar deprimido.
Em depoimentos no tribunal, em setembro, suas testemunhas de defesa traçaram o retrato de um Bolsonaro desafortunado (não em finanças, pois é um dos novos milionários na política nacional). Foi descrito em “profunda tristeza”; “cabisbaixo”; “monossilábico”; “deprimido”; “desgastado”; “debilitado”; “doente”; e, com “dores”.
Essa versão do presidente da República em depressão e outros transtornos mentais convive nos autos do processo sobre a tentativa de golpe de estado com uma outra, a de um Bolsonaro excitado em discussões com aliados civis e militares sobre a anulação do resultado eleitoral; o estado de sítio; a prisão de juízes; o impedimento do novo governo; e, a instalação de um “gabinete de crise” para governar por tempo indeterminado.
Há dois personagens encarnados num mesmo corpo, combalido por meia dúzia de cirurgias. Bolsonaro condenado por liderar a tentativa de golpe é o verso (ou reverso) de Bolsonaro que escuta vozes saindo da tornozeleira eletrônica e decide liquidá-las com ferro de soldar numa solitária noite de sábado.
A qualquer momento a partir da manhã desta terça-feira (25/11), o Supremo pode determinar o cumprimento da pena de 27 anos e três meses de prisão, com início em regime fechado.
Se o ex-presidente golpista perdeu a prisão domiciliar, o paciente Bolsonaro com seu ferro de soldar pode ter credenciado ambos à ala psiquiátrica de algum complexo hospitalar penal de segurança mínima.
Reação do governo Trump à prisão de Bolsonaro acende alerta no mercado
O que diz a primeira pesquisa presidencial após a prisão de Bolsonaro
Por que o Exército não quer Bolsonaro preso no quartel
O que Bolsonaro disse a Michelle na superintendência da PF
MPF denuncia caminhoneiros que bloquearam principal rodovia do país para pedir golpe







