Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana

José Casado

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Informação e análise
Continua após publicidade

Fábrica de pobre

O avanço da pobreza no Brasil e na Argentina corrói e desmonta governos

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 09h51 - Publicado em 24 nov 2023, 06h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Quatro em cada dez argentinos vivem na pobreza, e mais de 10% sobrevivem na indigência.

    Pela primeira vez, há mais pobres do outro lado da fronteira do que no Brasil.

    Um em cada três brasileiros é pobre, e o número de indigentes beira 8% da população.

    Em ambos os países, donos das maiores economias da América do Sul, o empobrecimento avançou com celeridade nas últimas duas décadas.

    É notável que, por dois terços do tempo, isso tenha acontecido sob governos eleitos com projetos de redução das desigualdades e resgate social, conduzidos por partidos hegemônicos à esquerda: PT no Brasil e partido peronista na Argentina.

    Continua após a publicidade

    É relevante, também, observar que no restante do calendário essas fábricas de pobreza tenham se mantido a pleno vapor sob governos dogmaticamente adversários, empenhados no reformismo, mas com propostas distintas para reverter a agonia da degradação sistemática e contínua da renda de argentinos e brasileiros.

    Algo deu errado nos dois lados da fronteira. E o eleitorado resolveu responder à crise de liderança nesses países elegendo para a Presidência personagens estranhos aos grupos que ascenderam na política regional no ciclo pós-ditadura.

    Pode-se discutir sobre o papel de Jair Bolsonaro e de Javier Milei na aglutinação e autoestima da extrema direita. Será inútil, até porque se diferenciam na essência. Bolsonaro é um radical do militarismo arcaico, com um longo histórico de defesa da intervenção do Estado na economia. Milei é um economista formado no fundamentalismo da doutrina sobre o poder do mercado, e faz questão de apresen­tar-se como um talibã do ultraliberalismo.

    Continua após a publicidade

    Os governos da América do Sul faliram nas ditaduras do século passado e ainda não conseguiram superar o desequilíbrio nas contas públicas. No Brasil e na Argentina, elites surfam na retórica liberalizante, mas continuam lutando heroicamente pela dependência do Estado. Todos são liberais, porém viciados em subsídios e incentivos estatais, como realça o projeto de reforma tributária que se negocia em Brasília.

    “O avanço da pobreza no Brasil e na Argentina corrói e desmonta governos”

    A cada eleição, renovam-se promessas de abertura dos portais da prosperidade — “colocar os pobres no orçamento”, na expressão recorrente —, mas os problemas estruturais dos estados nacionais continuam a estimular a expansão acelerada das linhas de produção de pobreza, ampliando desigualdades e derrubando pela metade a renda da maioria das famílias nos dois lados da fronteira. Não se vê preocupação efetiva com as razões do empenho de 40% dos orçamentos na rolagem da dívida pública, nem com a eficácia no uso dos recursos públicos restantes, mais restritos a cada ano.

    Continua após a publicidade

    No Brasil, o protesto contra essa “ordem” política chegou às ruas em junho de 2013, mas, por razões que nem a razão explica, esquerda e direita preferiram abstrair a análise das motivações e dedicar-se à concentração de energia num embate de mútua deslegitimação política para ver quem sangra mais rápido.

    No Brasil de 2018 deu Bolsonaro, ano passado deu Lula. O líder petista ganhou por margem mínima (1,8 ponto percentual) e seu desempenho em Minas Gerais foi simbólico: sua vantagem de 563 000 votos no primeiro turno encolheu para 49 000 na segunda rodada, apenas três semanas depois.

    Na Argentina, semana passada, Milei elegeu-se com larga dianteira em vinte das 23 províncias. Obteve 90% dos votos em algumas e ficou com metade do eleitorado de Buenos Aires, reconhecido pilar do peronismo há 78 anos.

    Continua após a publicidade

    Nos dois países, parcela significativa do eleitorado empobrecido deixou evidente a exaustão com a insuficiência dos programas sociais paliativos e a inexistência de perspectivas realistas de prosperidade individual. Paradoxalmente, partidos e candidatos estimularam o voto pela rejeição ao adver­sá­rio — entre argentinos chegou-se ao empate (50%) em repúdio na quase totalidade das pesquisas antes do segundo turno.

    Nos lados da fronteira, a massa de eleitores empobrecidos, sobrevivente em pequenos negócios, aderiu aos acenos de redução do custo operacional do Estado de bem-estar social, cujo peso tem sido crescente nos orçamentos familiares. “Lá e cá, a esquerda decidiu abandonar a reflexão sobre a realidade socioeconômica e deu prioridade à abordagem de costumes, de políticas identitárias”, observa o sociólogo Creomar de Souza. “Isso choca o pessoal que chega ao dia 30 de cada mês sem dinheiro e com contas para pagar.”

    Não há fórmula mágica. O problema central é o empobrecimento. Sem renovação das ideias as ofertas eleitorais tornam-se irrelevantes, porque são originalmente ineficazes. E, na irrelevância, governos e partidos tornam-se dispensáveis.

    Continua após a publicidade

    Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

    Publicado em VEJA de 24 de novembro de 2023, edição nº 2869

    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Semana Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    Apenas 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

    a partir de 35,60/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.