Lula vive um drama em São Paulo, onde fez uma aposta de alto risco na disputa pela prefeitura paulistana: atropelou seu partido, escolheu candidato e vice de outros (Psol e MDB), driblou a oposição dentro do PT e do governo e impôs o retorno da ex-prefeita Marta Suplicy ao mosaico petista. Nada de novo no método. Lula costuma dizer que não manda no PT, e o partido tem o hábito de falar em independência, mas a cúpula só faz o que ele deseja — ou manda.
A novidade é sua cartada única e valiosa nessa temporada eleitoral. Pela primeira vez, desde a fundação do PT, há 44 anos, Lula resolveu só fazer campanha para um candidato, Guilherme Boulos, e na cidade onde vivem 9,3 milhões de eleitores, quase o dobro em comparação ao segundo maior colégio eleitoral do país, o Rio de Janeiro.
Para Lula, pouco importa o desempenho do PT nessa temporada eleitoral — a tendência desenhada nas pesquisas não recomenda otimismo. Sua aposta em São Paulo é central e vai além da questão municipal. É a chave que escolheu para formatar a campanha presidencial de 2026.
A vitória paulistana seria dele, claro. Sairia das urnas com força renovada para, em novembro, começar a montar o caleidoscópio de alianças que projeta nas campanhas à Presidência e pelo controle do Senado, onde a renovação será de dois terços (54 vagas). Na Câmara, a gravidade e o Orçamento mais transparente proporcionariam, em tese, margem para negociar votos numa base relativamente mais estável do que a atual.
A derrota seria de Boulos e de Marta Suplicy, por óbvio. Mas, nessa hipótese, a vida de Lula ficaria complicada para a disputa em 2026, que, possivelmente, seria sua última aventura eleitoral — em 2030 terá 85 anos de idade.
Por isso, a preocupação no Palácio do Planalto com os resultados de Boulos na mais recente pesquisa Quaest/TV Globo.
Ele continua estável, no patamar de 21%, empatado com os candidatos Pablo Marçal (PRTB), com 23%, e o prefeito Ricardo Nunes (MDB), com 24%.
Os problemas transparecem nos detalhes da sondagem divulgada nesta quarta-feira, 11. Alguns exemplos:
* Boulos está em declínio entre mulheres. Duas semanas atrás era líder nessa maioria do eleitorado. Perdeu a posição para o prefeito Nunes, que passou à frente, com 5 pontos percentuais (foi de 18% para 25%);
* Perde no eleitorado mais pobre, com renda domiciliar de até três salários-mínimos. Tinha a preferência nesse segmento, mas em três semanas o prefeito cresceu 9 pontos (subiu de 16% para 25%). Boulos recuou (de 20% para 17%) e, agora, disputa a segunda posição com Marçal (passou de 15% para 18%);
* Caiu também entre os mais ricos, com renda familiar superior a sete salários (foi de 28% para 24%). Marçal passou à frente (foi de 21% para 25%);
* Em uma quinzena, Boulos perdeu 8 pontos percentuais (queda de 27% para 19%) na parcela mais jovem do eleitorado paulistano, de 16 a 34 anos de idade.
É evidente que ele e Lula estão com problemas no eleitorado de São Paulo.
Aparentemente, ainda há resistência no PT ao engajamento na campanha de Boulos. Dias atrás, em comício, Lula achou necessário dizer aos petistas: “A gente não tem que tratar o Boulos como se ele fosse um candidato do PSOL. O Boulos é o candidato do PT.” Acrescentou: “A gente não está apoiando o Boulos por favor. É porque a gente precisa governar São Paulo.”
Faltam três semanas para a seleção de candidatos ao segundo turno. Há tempo para recuperação, mas, por enquanto, sobra apreensão no governo com os riscos da aposta de Lula em São Paulo.