Para cada 100 estrelas de seriados infantojuvenis que ao chegar à idade adulta veem a carreira definhar e caem na obscuridade, desponta um Justin Timberlake, ou um Ryan Gosling — ou uma Zendaya, que começou como modelo infantil, foi dançarina nos shows de Selena Gomez (outra que sobreviveu à idade), participou do Dancing with the Stars, teve duas atrações no Disney Channel (No Ritmo e Agente K.C., da qual foi uma produtora atuante) e então imediatamente roubou a cena em seu primeiro papel no cinema, como a compenetrada e autossuficiente MJ, que há dois filmes intriga e fascina o Homem-Aranha de Tom Holland. E não só a ele: dona de um carisma intenso mas não ostentatório, de um sorriso lindo que conta muito mais por não ser usado à toa, e de um porte estatuesco que, aliado ao gosto para o teatral, fez dela um ícone fashion nos tapetes vermelhos, Zendaya, de 24 anos, é aquele tipo de pessoa que jamais passaria despercebida. Poderia traçar uma bela trajetória só pela força da sua personalidade. Mas, se ela hoje mais parece um cometa em aceleração, é porque séries como The OA e Euphoria e filmes como Malcolm & Marie (Estados Unidos, 2021), que estreia nesta sexta-feira 5 na Netflix, têm posto algo mais raro em evidência: talento verdadeiro, e um crescimento técnico inegável.
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Protagonizado por Zendaya e John David Washington, o filme foi concebido por Sam Levinson, criador, roteirista, produtor e muitas vezes diretor de Euphoria — que teve as filmagens interrompidas pela pandemia —, como uma peça de câmara adequada às novas normas sanitárias: dois atores em uma história filmada em um único cenário, com equipe mínima. Na volta da festa de estreia de seu primeiro trabalho importante como diretor, que se anuncia um sucesso de crítica, Malcolm fala pelos cotovelos, festeja e comemora, alheio à reticência com que Marie reage; ele não a mencionou no seu discurso de agradecimento, o que enseja uma briga cruel, à moda de Quem Tem Medo de Virginia Woolf? — e que muitas vezes soa escrita demais, ou tão afetada quanto a fotografia em preto e branco. Em vista do trabalho dilacerante de Levinson em Euphoria, essa inautenticidade é inesperada, e às vezes derruba o competente Washington. Não, porém, Zendaya, que só vacila em uma fala que se estende muito além do ideal. Pelo jeito, ela somou mais uma às suas várias habilidades: começou a dirigir a si mesma.
Publicado em VEJA de 3 de fevereiro de 2021, edição nº 2723
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