Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana

Isabela Boscov

Por Coluna Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Está sendo lançado, saiu faz tempo? É clássico, é curiosidade? Tanto faz: se passa em alguma tela, está valendo comentar. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

Lógica de Bacurau é tão desalentadora quanto a do extremo oposto

No longa, filmado com força e talento, para que um lado reafirme sua identidade é preciso destruir o outro — com violência

Por Isabela Boscov Atualizado em 4 jun 2024, 15h54 - Publicado em 30 ago 2019, 07h40
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Seria interessante rever Bacurau (Brasil, 2019), em cartaz no país, em um futuro em que as suas referências diretas tivessem já se perdido: é provável que a força com que os diretores Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles filmam permanecesse inteira — mas que sua visão redutiva ficasse um tanto mais exposta. Vilarejo do sertão nordestino que uma guerra política tornou dependente de caminhões-pipa para beber água, Bacurau repentinamente se percebe sob outro tipo de ataque. Um grupo de estrangeiros o elegeu para um safári humano, em que cada cidadão abatido rende pontos. Preparam o terreno com cuidado (fecharam estradas, cortaram o sinal do celular e modificaram o mapa) e com ajuda local: o prefeito do município ao qual Bacurau pertence entrou no esquema, e a organização da caçada coube a um casal do Sudeste. A primeira irrupção de mortes, porém, alerta os moradores sobre o perigo. Sob a liderança inflamada de Lunga (Silvero Pereira), renegado que está sob perseguição e que o vilarejo vai buscar em seu esconderijo (não é difícil adivinhar qual figura real serve de inspiração a ele), armas vêm à luz e são distribuídas, e traça-se um plano que o filme propõe ser de resistência, mas que não seria impossível confundir com vingança pura e simples — e muito sangrenta.

    Bacurau é um vilarejo pobre, mas não atrasado. Conta com uma médica competente (Sonia Braga, que protagonizou Aquarius para Mendonça) e numerosos celulares e tablets. Tem um museu que é motivo de orgulho e seu prefeito de fato é o professor; as prostitutas são queridas e as pessoas de gênero fluido, como o próprio Lunga, são respeitadas. Quando o candidato venal vai lá fazer campanha e doar alimentos vencidos, todos fecham as portas e deixam-no falando sozinho. Mas os brasileiros de mais abaixo os consideram inferiores (“O Sul é muito diferente — é rico, temos imigração italiana e alemã”, diz o rapaz do casal, que carrega um crachá de membro do Judiciário). E, para os estrangeiros, os moradores mal são seres humanos.

    + No seu streaming: jura que você nunca viu… O Tigre e o Dragão?

    As declarações grosseiras de Jair Bolsonaro a respeito do Nordeste, seu entusiasmo pueril por Donald Trump, seus ataques ao cinema nacional e até as deficiências do eventual acordo em torno da base de Alcântara emprestam ao esquematismo de Bacurau — que na terça 27 perdeu a chance de uma vaga no Oscar para A Vida Invisível de Eurídice Gusmão, de Karim Aïnouz — uma aparência de razão. Mas não há razão em atribuir a todos a ignorância de alguns para assim reiterar o divisionismo que pautou a política da última década — nem tampouco em incriminar os suspeitos de sempre (Sul e Sudeste, a Lava-Jato, o imperialismo americano, o baixo clero político etc.), deixando passar incólumes os clãs regionais que usam o Nordeste como seu feudo. A lógica de Bacurau, no fundo, é idêntica à do outro extremo, e tão desalentadora quanto ela: para que um lado se construa, é preciso destruir o outro lado — e com ira e violência.

    Publicado em VEJA de 4 de setembro de 2019, edição nº 2650

    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Semana Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    Apenas 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

    a partir de 35,60/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.