Um dia antes de completar 18 anos, bandido mata ex-namorada e compartilha a imagem. No Brasil do ECA, “despedida de menoridade” se faz com cadáver

Reúno as informações básicas sobre o episódio na primeira nota e comento nas demais.
[Pós-escrito: A Veja.com tem mais detalhes sobre o caso aqui. Segundo a matéria, o assassinato foi dois dias antes do aniversário, o que não muda em nada o que segue abaixo, é claro.]
1.
Um dia antes de completar 18 anos, segundo o Portal r7, um menor matou com um tiro na região do olho esquerdo a ex-namorada Yorraly Ferreira, de 14, e compartilhou a imagem do cadáver.
Preso nesta segunda-feira, o assassino disse que já pensava em matar a ex desde a semana passada e confessou o crime ocorrido no último domingo no Parque Recreativo do Gama, conhecido em Brasília como Prainha, sem demonstrar arrependimento ou remorso:
— Eu virei e segurei no braço dela e falei: “e as casinhas [emboscadas] que você armou pra mim?” Aí ela: “pelo amor de Deus, Henrique. Me desculpa.” Aí eu peguei e atirei.
Só não se sabe se o menor escolheu a véspera de sua maioridade consciente de que escaparia de uma punição maior.
Em entrevista ao Correio Braziliense, Adriano Dias, primo de Yorrally, afirmou que o jovem que seria o responsável pelo crime “matou pra botar medo” em integrantes de gangues rivais.
“Depois de matar a Yorrally, ele tirou uma foto com o celular dela e mandou para todos os amigos. Ele fez isso por poder. Quer deixar bem claro que quem mexer com ele morre.”
O menor assassino estava envolvido com drogas e tinha alguns inimigos, entre os quais o atual namorado de Yorraly, que postou no seu Facebook a imagem do cadáver, com a legenda: “Descanse em paz amoor, vai com Deus”.
Rose Ferreira, mãe da vítima, disse em entrevista à TV Record que Henrique vinha ameaçando a menina.
— Ele matou minha filha, sem dó, sem piedade. E eu quero justiça.
Segundo ela, Henrique não aceitava o fim do relacionamento.
— O que ele fez não tem perdão. A justiça de Deus há de se cumprir e, se não cumprir, eu espero pela do homem.
2.
Eu escrevi em abril de 2013, em tom de deboche, após o assassinato de Victor Hugo Deppman, de 19 anos, por um menor:
(…) Se as noivas celebram despedida de solteira com vários go-go-boys, por que os pobres de 17 anos não podem celebrar despedida de menoridade com um cadáver? Isto sim é um direito humano. Gilberto Carvalho e Michel Temer são muito coerentes em defender os jovens assassinos contra essa meia dúzia de reacionários que critica o limite de 3 anos de recolhimento, previsto pelo artigo 121 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Eles querem o quê, afinal? Que os menores passem muitos anos na cadeia?
(…) O Estado brasileiro não está aqui para aterrorizar bandidos. O Estado brasileiro está aqui para ser uma mãe para eles, como aquela da música “Meu guri”, do companheiro petista Chico Buarque. Que mal há no caso paulista se o assassino “dimenor” — com sua fome de matar temporariamente saciada — já foi recolhido, sem legenda, nem iniciais? “Eu não entendo essa gente, seu moço/ fazendo alvoroço demais”… Só porque daqui a três anos ele estará nas ruas, de ficha limpa, como um exemplo de que o crime compensa? Dependendo do ódio pela vítima no caso de homicídio ou do tesão, no de estupro, talvez valha mesmo a pena arriscar um período de recolhimento, e daí? (…)
Talvez o menor de Gama tenha feito – ou fará um dia – o cálculo. Talvez tenha até registrado a cena em imagem justamente para comprovar que tinha 17 anos no momento do ato. Talvez a morte de Yorraly, para ele, valesse – ou terá valido um dia – o preço de três anos de detenção. É até constrangedor enunciar esse raciocínio, porque não quero dar ideia a ninguém. Mas o que posso fazer se a lei no Brasil é exatamente um convite a crimes como este e se qualquer marginal pode cometê-los com o ECA debaixo do braço?
Não que a esquerda vá fazer alguma coisa. Ainda que a “despedida de menoridade” se popularize tanto quanto a despedida de solteiro, a gente sabe que os esquerdistas protetores de bandidos – e de ditaduras assassinas como a de Nicolás Maduro – jamais se comoverão com os cadáveres e os sofrimentos de pessoas comuns, a ponto de rever a própria delinquência moral.
A propósito: Marcelo Freixo também é contra a redução da maioridade penal. [Na Veja.com: Um dogma que precisa ser derrubado, incluindo a lista “A maioridade penal pelo mundo”]. Quanto a julgar bandido por seus atos e pela consciência deles, independentemente da idade, isto nem entra na discussão viciada dessa gente.
No Brasil é assim: na hora do sexo, as crianças devem ser tratadas como adultas. Na hora do crime, os criminosos, mesmo quando adultos, devem ser tratados como crianças.
Reúno a seguir outras notas minhas de 2013 sobre o tema:
3.
“Dívida com a sociedade”
Um assassino jamais “paga sua dívida com a sociedade”, como prega o chavão estimulante de seus defensores. A vítima morta não recebe a sua parte do pagamento e a dor daqueles que a amavam não se quita com ele.
A prisão do assassino é apenas punitiva e pode até ser temporária, embora tanto melhor quanto mais longa. Mas a dívida, queiram ou não, é eterna.
4.
“O mínimo que podemos fazer”
No Brasil, a vida humana custa nada mais que 3 anos de recolhimento na Fundação Casa, se tirada por um menor. Mesmo que este menor tenha “isqueirado” viva a sua vítima – como a dentista Cinthya Magaly Moutinho de Souza -, para torturá-la por dispor de apenas R$ 30 em sua conta na hora do assalto.
Só uma fome estimula isto: a fome de crueldade.
Em 3 anos, o bem-nutrido incendiador de Cinthya – que pode assumir o crime no lugar de seus comparsas mais velhos para aliviar a pena deles – estará solto, de ficha limpa, assim como o assassino de Victor Hugo Deppman, que não se satisfez em roubar o celular do rapaz e deu-lhe um tiro na cabeça.
Se eles terão a certeza – o que já seria um escárnio – de que pagaram sua dívida com a “sociedade”? Não creio! No Brasil de Dilma Rousseff, Gilberto Carvalho e Maria do Rosário, a “sociedade” é que tem uma dívida eterna com eles.
O mínimo que podemos fazer é andar com mais de R$ 30 no bolso.
5.
“A solução para a criminalidade”
Assim como os bons livros não existem para solucionar todos os problemas da ignorância no mundo, mas sim uma parte daqueles do indivíduo que dela quer sair, as prisões não existem para resolver todos os problemas da criminalidade, mas sim para punir cada indivíduo que a ela recorreu.
Quando alguém alega que prender e manter preso os bandidos (inclusive os menores que aderem à moda de “isqueirar” vivas pessoas inocentes como Alexandre Peçanha Gaddy, Cinthya Magaly Moutinho e Marcelo Gonçalves; ou mortas como Adriana Moura de Rocha Machado, que a própria filha tentou matar com um mata-leão e teve a ajuda do namorado para completar o serviço com um saco na cabeça) — vou até repetir para você dar uma respirada: quando alguém alega que prender e manter presos os bandidos e esses menores “não é a solução do problema”, é de se supor que este indivíduo também acredite que ler bons livros “não é a solução do problema”, daí que não encontre mesmo bons motivos para lê-los e se sinta autorizado a permanecer eternamente ignorante.
Sair do problema específico — a própria ignorância ou os crimes de alguém — para o geral — a ignorância ou a criminalidade presentes na sociedade inteira, como sempre estarão, aliás, enquanto o mundo for mundo — é um subterfúgio típico de militantes vigaristas, macaqueado ainda por ignorantes presunçosos que opinam sobre tudo com base naquilo que ouviram dizer.
A estes, na esperança de que seus neurônios não tenham sido de todo “isqueirados” por aqueles, explico de muito boa vontade apenas o óbvio: as prisões também existem para deixar cada menor ou maior criminoso tão afastado de nós — e espero eu que para sempre, no caso de asfixiadoras matricidas e “isqueiradores” de gente — quanto vocês estão dos bons livros.
Felipe Moura Brasil – https://www.veja.com/felipemourabrasil
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