1.
No dia 17 de abril, durante a cobertura dos discursos que antecederam a aprovação pela Câmara do prosseguimento do processo de impeachment de Dilma Rousseff, apontei no Twitter a manipulação que o deputado Afonso Florence (PT-BA) estava fazendo do resultado de uma aparente pesquisa do instituto Vox Populi em sua tentativa de convencer os demais deputados a votar contra o afastamento da petista:
2.
No dia 5 de agosto, o site petista Brasil 247, editado pelo “suposto jornalista” (nas palavras do juiz Sergio Moro) Leonardo Attuch, acusado de ter recebido R$ 120 mil do lobista do petrolão Milton Pascowitch por determinação do ex-tesoureiro do PT atualmente preso João Vaccari Neto, destacou a seguinte manchete:
“Vox: 79% dos brasileiros defendem o Fora, Temer”.
Na verdade, a aparente pesquisa do instituto favorito dos petistas encomendada pela revista Carta Capital, cujo editor é pautado por Lula (como ficou evidenciado em escuta telefônica da Lava Jato e este blog destacou em primeira mão), revelou apenas que 61% dos supostos brasileiros entrevistados querem novas eleições e 18% defendem que Dilma retorne e conclua seu mandato.
Somando esses dois números, o famigerado Brasil 171 tenta passar a impressão que 79% dos brasileiros querem o ‘Fora, Temer’ da mesma forma rancorosa que o PT, embora nenhum deles tenha respondido com base nesse slogan político e o apoio à volta de Dilma tenha caído de 21% para 18% em todo o país. Uma manchete bem menos imprecisa, portanto, seria:
“Vox: 82% dos brasileiros defendem o Fora, Dilma”.
Mas aí não seria o Brasil 171, claro. Nem o Vox Populi, que traz em seu currículo o erro grotesco no resultado da eleição de 2010 por 22,4 milhões de votos.
3.
Curiosamente, nesta terça, 16 de agosto, o Vox Populi foi um dos alvos da 6ª fase da Operação Acrônimo, deflagrada pela Polícia Federal, que investiga o esquema de tráfico de influência para liberação de empréstimos do BNDES.
De acordo com a PF, os recursos do banco público para uma obra de construção do aeroporto Catarina, em São Roque, na Região Metropolitana de Sorocaba, foram liberados mediante pagamento de campanha pela empreiteira JHFS para Fernando Pimentel (PT), governador de Minas Gerais.
A instituição encarregada de receber o pagamento em lugar do petista foi justamente o Vox Populi, segundo as investigações turbinadas pelo acordo de delação premiada fechado com o empresário Benedito Oliveira Neto, o Bené, apontado como operador de Pimentel e responsável por essas transações financeiras.
A Lava Jato já havia descoberto que a empreiteira Andrade Gutierrez pagou R$ 15 milhões para o Vox Populi fazer pesquisas para a campanha de Dilma – os “trackings” regulares comprados pelo PT para uso interno. Na contabilidade oficial, no entanto, o instituto recebeu apenas R$ 1,4 milhão.
4.
O dono do Vox Populi é Marcos Coimbra, não por acaso também colunista da Carta Capital.
Em janeiro, no sintomático artigo “Impeachment sem força” (imagine se tivesse, hein…), Coimbra frisou preventivamente que “apenas 24% dos entrevistados disseram manter o mesmo elevado interesse do início da Lava Jato, taxa idêntica àquela dos que ‘não têm qualquer interesse pelo assunto e nunca tiveram’”.
Só faltou o militante dizer se já sabia do interesse da Lava Jato e da Acrônimo nos negócios dele (e se previa que seu apartamento seria alvo de mandado de busca e apreensão, como ocorreu nesta terça).
5.
O uso de supostas pesquisas de institutos próprios ou parceiros para legitimar um discurso político embusteiro é expediente comum entre (vox-)populistas de qualquer espécie.
Mas nada diz mais sobre a natureza do PT nessa história do que a sua capacidade de distorcer pesquisas até do instituto suspeito de lavar propina para o próprio partido.
Não há crime nem mentira que não possam ser turbinados em função de um projeto criminoso de poder.
Felipe Moura Brasil ⎯ https://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil
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