Marieta Severo a VEJA: ‘O Brasil aprendeu o que é uma direita fascista’
Atriz de 75 anos disse que governo Bolsonaro serviu apenas para o brasileiro pensar mais sobre política
Exilada na Itália por um ano durante a Ditadura Militar (1964-1985), quando era casada com Chico Buarque, Marieta Severo, de 75 anos, agora estrela Duetto, um filme que usa o país europeu como o cenário de uma história sobre conflitos familiares com o autoritarismo do governo italiano como pano de fundo. A VEJA, a atriz, eleitora de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reforçou sua repulsa pela ditadura como forma de governo e enfatizou sua torcida para que Jair Bolsonaro (PL) seja derrotado nas eleições presidenciais deste ano.
Duetto é um filme que menciona de forma sutil a ditadura brasileira. Como foi para a senhora revisitar essas lembranças? Eu revi a menina de 22 anos que eu era, grávida, tendo que ter a primeira filha fora do Brasil por causa do exílio. Eu fui para ficar 20 dias na Itália, estava no início do sétimo mês da gravidez. O médico falou:”você pode ficar 20 dias e voltar”, mas aí eu não voltei mais para o Brasil, porque a ditadura aqui virou uma coisa sangrenta, horrorosa, perseguindo todo mundo de acordo com os pensamentos retrógrados, horrorosos deles, então foi impossível fugir dessas lembranças. Foi através do som, da língua, que voltei para esse universo. Impossível não retomar essa menina de 22 anos, né? A minha certeza é de que ditadura nunca mais. Ditadura é a pior forma de governo que pode existir.
O que pensa sobre esses movimentos de “vira voto”, campanha que prega o voto útil em Lula para que ele seja eleito já no primeiro turno? Algum motivo especial para a senhora não ter aparecido nos vídeos ainda? Todo mundo sabe meu voto, é muito claro desde sempre. Eu estou há uma semana de cama, com gripe. Eu não consegui nem fazer o meu espetáculo. Nada pior para uma atriz do que suspender um espetáculo de teatro, eu digo que a gente não manda atestado médico, a gente manda atestado de óbito. A gente não para, e eu fiquei completamente incapaz. Quando eu acabar aqui vou descansar, porque eu preciso estar recuperada. Só por isso que eu não gravei o vídeo ainda, inclusive, estou devendo esse vídeo, mas eu não tinha condição física.
Como a senhora está sentindo o clima dessa eleição? A sensação parece a mesma das eleições de 2018? Eu acho que tem mais esperança agora. Porque eu acho que o que eles conseguiram fazer de bom, se é que eles conseguiram alguma coisa boa nesse país, foi ajudar a criar consciência política. Conheço muita muita gente que não sabia o que era ser manipulado politicamente, o que significa uma ideologia, o que tal partido pretende. A consciência da política aumentou muito nesses quatro anos. O desastre que foi esse governo fez as pessoas tomarem consciência, saberem ver o que é uma atuação política catastrófica.
Então acredita que o Brasil aprendeu alguma coisa com o governo Bolsonaro? Eu acho que a gente passou por um grande inferno, mas, para aprender, para ter consciência, para saber o que é, saber qual a importância de cada um de nós, do nosso pensamento, do que a gente quer, do país que a gente quer. Então, apesar de todo o inferno que foram esses quatros anos, terríveis até, com a pandemia e com a condução catastrófica do governo nós perdemos muita gente muito querida, muito amado. Então, apesar desse inferno, eu vejo a primavera. Uma frase que eu repito muito é que “não conseguirão deter a primavera”. A primavera virá aí. A gente vai reconstruir esse país, apesar deles. O Brasil aprendeu o que é uma direita fascista. Talvez muita gente não soubesse.